O Globo, n. 31530, 04/12/2019. País, p. 7

TSE autoriza uso de assinaturas eletrônicas para criar partidos

André de Souza



Por quatro votos a três, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) liberou o uso de assinaturas eletrônicas no processo de criação de um partido político. Para que isso possa ocorrer na prática, no entanto, será preciso primeiramente que a Corte regulamente o tema, e que sejam desenvolvidas as ferramentas tecnológicas necessárias. O TSE não entrou na discussão do uso de biometria para conseguir apoios, medida citada pelo partido Aliança pelo Brasil, que tentará obter registro e tem como principal integrante o presidente Jair Bolsonaro.

— Para espantar qualquer dúvida, nós estamos dizendo que pode. Em tese. Todavia, para que se possa efetivar essa possibilidade, nós precisaremos de regulamentação do TSE e do desenvolvimento de ferramentas tecnológicas — disse Luís Roberto Barroso, acrescentando:

— Vai que a gente não consegue desenvolver essa ferramenta.

A consulta sobre a possibilidade de uso do certificado digital, sem assinaturas físicas, foi feita no fim do ano passado pelo deputado Jerônimo Goergen (PP-RS). Mas o julgamento atraiu o interesse de Bolsonaro e apoiadores, que querem criar um partido a tempo de disputar a eleição municipal de 2020. Posteriormente, porém, eles recuaram da estratégia ao constatarem que o instrumento seria muito caro.

“Inacessível”

A assinatura digital é expedida pela Receita Federal e por outros órgãos autorizados. Cada um dos eleitores com a intenção de apoiar a criação do partido precisaria comprar um dispositivo que não sai por menos de R$ 150. Assim, os apoiadores do presidente passaram a citar outro meio de angariar apoios: a biometria. Essa possibilidade, porém, não foi analisada ontem pelo TSE.

O julgamento começou na semana passada, quando o relator, Og Fernandes, votou para que o tema não fosse discutido. Um pedido de vista do ministro Luis Felipe Salomão interrompeu a análise, retomada ontem. Ele e os demais ministros entenderam que o TSE deveria julgar a questão. Og, então, se pronunciou novamente, dessa vez para negar o uso de assinaturas eletrônicas.

— A assinatura eletrônica é onerosa e inacessível para boa parte da população. É somente benefício para alguns, ao custo para todos, sem nenhum ganho para o sistema eleitoral — disse Og. Salomão discordou:

— O TSE sempre na vanguarda da tecnologia. E, em linha com essa vanguarda da tecnologia, é que eu me decidi por um caminho aqui pensando exatamente que, sempre que o TSE esteve na encruzilhada, ele optou preferiu trilhar o caminho da tecnologia.

Outros três ministros seguiram Salomão: Tarcísio Vieira, Sérgio Banhos e Luís Roberto Barroso.

— Negar as assinaturas digitais, quando a própria lei civil e a realidade social aceitam-na em profusão, me parece um apelo demasiado a uma metodologia que me parece ultrapassada, para não dizer obsoleta — disse Vieira.

Outros dois se alinharam a Og Fernandes: Edson Fachin e Rosa Weber.

— Há uma grande possibilidade deste tribunal dar um salto no vazio jurídico sem um paraquedas normativo que dê um mínimo de segurança jurídica para tratar deste tema — disse Fachin.

Barroso desvinculou o julgamento do novo partido que Bolsonaro tenta criar:

— Esta consulta é bem anterior ao fato político do dia. Não tem nada a ver com a criação de um partido político aparentemente sob a liderança do presidente da República. Essa é uma outra questão que em algum momento vai se colocar.

Por certificação digital, por biometria ou pelo método manual, ministros do TSE avaliam que dificilmente haverá tempo hábil para o Aliança pelo Brasil cumprir todas as exigências formais e participar das eleições municipais de 2020. Segundo a legislação eleitoral, a nova legenda tem até abril para conseguir 491 mil assinaturas.