O Globo, n. 31506, 10/11/2019. Mundo, p. 41

Grupo ainda é relevante
Entrevista: Pepe Zhang


O diretor associado do Centro China-América Latina no Atlantic Council, Pepe Zhang, avalia que o Brics ainda é um fórum relevante para colaboração internacional, e garante que as relações entre chineses e brasileiros serão regidas mais pelos números e menos pela política.

Quais as expectativas para essa reunião do Brics, a primeira do governo Bolsonaro?

Penso que vamos ver uma continuação das parcerias internacionais entre os cinco países do Brics. Esse encontro, acontecendo no Brasil, abre a possibilidade de colaboração e trocas entre Brasil e China. Os países do bloco, nos últimos anos, adotaram posturas próprias, mas ainda considero uma plataforma para promover a cooperação.

Sobre a viagem de Bolsonaro à China, quais os resultados práticos?

Acho que ela excedeu as expectativas de certa forma, não vamos esquecer que essa foi a primeira visita [à China] desde que Bolsonaro chegou ao poder, então as expectativas ficam mais em um campo protocolar. Se olharmos por essa perspectiva, podemos dizer que foi produtivo e que quase superou as expectativas. Destacamos a questão dos vistos [proposta de isenção de vistos para turistas chineses]. Também abre outras possibilidades, como promover as exportações bilaterais, oportunidades de investimento.

Na campanha, Bolsonaro nem sempre se referiu de forma positiva à China. Isso é passado?

Durante a campanha e no começo da Presidência, havia esse tipo de atitude em relação à China, mas que foi mudando, ele foi adotando um tom mais moderado. O que queremos dizer é: não se trata de China, de EUA ou de escolher um lado, trata-se de criar uma vasta oportunidade econômica no Brasil, e a China escolheu o país como um de seus principais focos de investimento direto. A visita do vice-presidente Mourão [em maio] criou as bases para essa boa relação.

Alguns estados brasileiros estão lançando suas próprias iniciativas em relação à China. Como vê essa ideia?

O Brasil é grande, a China é grande, temos uma ampla conversa em nível nacional. Quando olhamos para o nível subnacional, nem todo estado ou cidade do Brasil possui o mesmo nível de investimento. No Brasil, alguns dos estados exportadores estão interessados em manter uma relação direta. É uma ação lógica.

O Brasil fez uma mudança de rumo na política externa, colocando os EUA como parceiro prioritário. Isso pode afetar as relações com os chineses?

Pelo que vi até agora, a China possui interesses de longo prazo no Brasil, mas acho que não vi mecanismos políticos em ação. Os países da região tentam não misturar política com os negócios, tentam agir de forma a tornar possível negociar com todos os lados.