O Globo, n. 31530, 04/12/2019. Economia, p. 19

MPT critica projeto para pessoas com deficiência

Geralda Doca
Glauce Cavalcanti


O Ministério Público do Trabalho (MPT) emitiu parecer contrário ao projeto do governo que trata da inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Segundo a procuradora Ana Lúcia Stumpf, a proposta tem vários dispositivos que dificultarão ainda mais a contratação desses trabalhadores porque esvazia a atual política de cotas que as empresas precisam cumprir. A medida faz parte do programa Verde Amarelo, o pacote de estímulo ao emprego enviado ao Congresso pelo presidente Jair Bolsonaro em novembro.

— A proposta é ruim em vários pontos. Exclui da cota (de contratação de pessoas com deficiência) atividades periculosas e empresas prestadoras de serviços terceirizados. Isso deixa de fora órgãos públicos e empresas que terceirizam atividades de limpeza e conservação, por exemplo — disse a procuradora, que também critica o governo por não ter ouvido entidades de proteção de pessoas com deficiência.

Outro ponto controverso é o que permite às empresas pagarem ao governo dois salários mínimos por cota descumprida. Para o MPT, os empregadores poderão se sentir mais à vontade para optar pelo desembolso em vez de contratar, oque também exige condições de acessoe treinamento. Os procuradores criticam aindaa possibilidade de as empresas fazerem acordo entre si para compensar cotas.

Para o MPT, governo deveria apertara fiscalização para as empresas cumprir emalei. E critica a redução de auditores e recursos orçamentários.

Em nota, a Secretaria de Previdência e Trabalho informou que o governo reconhece a importância da política atual, mas entende que é preciso fazer aperfeiçoamentos para que vagas reservadas para pessoas com deficiência sejam efetivamente preenchidas.

Projeto preocupa IBDD

Teresa Amaral, presidente do Instituto Brasileiro dos Direitos das Pessoas com Deficiência (IBDD), concorda que é preciso tornar a lei mais eficiente. Mas se preocupa com as mudanças propostas:

— Falta cumprir a lei, monitorar as empresas. Há países em que o pagamento por conta descumprida funciona. Mas e aqui? Para onde irão e como serão usados os recursos? Não há menção a incluir pessoas com deficiência nas pequenas e médias empresas, os grandes empregadores do país.

O governo argumenta que a lei atual faz com que os trabalhadores com deficiências mais leves sejam contratados preferencialmente, excluindo as pessoas com maiores dificuldades. Afirma ainda que a proposta busca criar condições para a inserção dessas pessoas, exigindo do INSS ações de habilitação, reabilitação e treinamento, junto com empresas do Sistema S e SUS. A ideia é que os recursos arrecadados com a multa ajudem a financiar esses programas.

— (O projeto) trata do desmantelamento da reserva de vagas para trabalhadores com deficiências nas empresas com mais de cem empregados. Marca o retorno da discriminação em razão da deficiência, porque não quer aplicar a cota em atividades específicas. E estimula o empregador a adotar medidas alternativas — critica Maria Aparecida Gugel, subprocuradora-geral do Trabalho.