Título: ''Temos o maior investimento cultural''
Autor: Lorenna Rodrigues
Fonte: Jornal do Brasil, 11/04/2005, Brasília, p. D6

Entrevista: Pedro Borio

Parte do projeto original de Brasília, duas das seis obras do Conjunto Cultural da República já têm data para serem entregas. Segundo o secretário de Cultura, Pedro Borio, a Biblioteca Nacional de Brasília será entregue em dezembro deste ano e o Museu Nacional em março de 2005. "Poderíamos entregar o museu ainda este ano se os R$ 11 milhões previstos no Orçamento da União fossem liberados" garantiu. Apesar de as obras estarem adiantadas, o acervo das duas instituições ainda não existe. "A partir do momento em que nós oferecemos condições de armazenamento, curadoria e exposição de obras de grande porte, o acervo se estabelecerá naturalmente" afirmou o secretário. Nesta semana, representantes da Fundação Ludwig, da Alemanha, visitaram as obras do conjunto e demonstraram interesse em ceder obras e colocar o museu em sua rota de exposições "A parceria já está encaminhada e será muito importante para o museu por se tratar de uma organização de grande porte, que possui o maior acervo privado de todo o mundo". Para compor o acervo do museu, o secretário Pedro Borio conta também com a aprovação de um projeto de lei apresentado pelo deputado federal Tadeu Filippelli (PMDB-DF) que prevê a transferência de obras espalhadas por órgãos públicos para o museu. "Nós passaríamos a expor essas obras no museu apenas, os proprietários delas continuariam sendo os órgãos públicos" disse. Na biblioteca, o secretário quer implantar um projeto multimídia, que integrará áudio e vídeo e computadores ao espaço tradicional dos livros. "Queremos investir no livro digital e em arquivos históricos de cinema e televisão" afirmou.

¿ Na última semana, o senhor se reuniu com o ministro da Cultura, Gilberto Gil para tratar das obras do Conjunto Cultural da República. O Governo Federal prometeu liberar recursos para as obras?

¿ Nos últimos dois anos, existiam emendas no Orçamento da União que previam a liberação de verba para as obras do conjunto cultural mas o dinheiro não saiu por restrições econômicas. O que nós pedimos ao ministro Gil é que ele acompanhe de perto a liberação dos R$ 11 milhões previstos no Orçamento deste ano, o que possibilitaria a entrega das obras, principalmente a do museu, antecipadamente.

¿ Existe um projeto em tramitação na Câmara dos Deputados, de autoria do deputado Tadeu Filippelli, que prevê a transferência de obras hoje em órgãos públicos para o Museu Nacional. Como essa transferência funcionaria?

¿ É importante deixar claro que o projeto transferiria as obras apenas de local, a propriedade das obras de arte continuaria sendo de quem as detêm hoje, as obras seriam apenas expostas no museu, mas continuariam sendo dos órgãos governamentais. Existem milhares de obras espalhadas por órgãos do governo federal, em depósitos, cofres, muitas vezes até em garagens, que, além de não estarem expostas ao público não estão armazenadas adequadamente. O Banco Central e o INSS são órgãos que possuem muitas obras muitas vezes recebidas como pagamento de dívida. No BC, por exemplo, existem cerca de 500 peças, 50 delas de alto nível. Até em gabinetes do terceiro escalão existem obras de alto valor. Nós não queremos obras que já estão expostas, como as do Itamarati ou do Palácio do Planalto, mas somente as que estão hoje inacessíveis ao público.

¿ A menos de um ano da inauguração do museu e da biblioteca, nenhum dos dois apresenta ainda um acervo constituído. Como a secretaria pretende resolver essa questão em tão curto espaço de tempo?

¿ Muito se fala da questão do acervo tanto do museu como da biblioteca mas o que é importante frisar é que a construção do conjunto cultural vai colocar Brasília no circuito internacional de exposições. Até hoje, a cidade não tinha condições de abrigar grandes exposições. Em termos museológicos, nós temos o Centro Cultural Banco do Brasil e o Espaço Cultural da Caixa que têm papel fundamental para o cenário cultural da cidade, mas restrito a sua escala. A partir do momento em que nós oferecemos condições perfeitas de armazenagem, curadoria e exposição de obras de grande porte, o acervo começa a se estabelecer naturalmente.

¿ Os representantes da Fundação Ludwig que visitaram as obras do conjunto na última quinta-feira se mostraram muito interessados em firmar parceria com o museu. Existem outras parcerias como essa em vista?

¿ A parceria com a Fundação Ludwig ainda não foi firmada mas já está encaminhada. É uma fundação de grande porte, que possui 14 museus no mundo todo e tem um política de emprestar e fazer circular obras pelo mundo inteiro. Ainda no final deste mês esperamos a visita de representantes do Museu de Arte Moderna de Nova York para tratar de cooperação semelhante. Já existem ofertas de cooperação concretas do Museu de Arte do Rio Grande do Sul, da Pinacoteca de São Paulo, do Centro Maria Antonia de São Paulo e outros, instituições que estão dispostas a negociar a inclusão o museu no seu circuito de programação, cedendo obras, e fazendo intercâmbios de peças.

¿ Algumas famílias brasilienses e colecionadores da cidade também estariam dispostas a ceder obras para o museu.

¿ Vários colecionadores demonstraram interesse em expor as obras, mantendo a propriedade. Isso já acontece em museus do mundo inteiro e mesmo do Brasil. Uma das principais coleções particulares do país, por exemplo, do colecionador Gilberto Chateaubriand, está exposta no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Aqui de Brasília colecionadores como Vega Néri, Marcos Kenningan, Chagas Freitas e a família Gontijo já declararam interesse.

¿ A biblioteca será inaugurada antes mesmo do museu e até agora só recebeu a doação de gibis.

¿ Existe um dispositivo chamado deposito legal no qual toda editora tem que depositar um exemplar de cada livro publicado na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Nós queremos incluir a biblioteca de Brasília nesse dispositivo, o que representaria cerca de 50 mil volumes por ano. Estamos conversando com a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro que trará exposições da biblioteca, como obras e documentos históricos. Planejamos também adquirir 20 mil títulos nacionais e internacionais, provavelmente com verba federal que totalizaria R$ 600 mil. Além disso, parte do Acervo Histórico de Brasília, que hoje é acessível apenas a pesquisadores seria passado para a biblioteca e aberto ao grande público.

¿ A nova biblioteca tem também a proposta de oferecer um espaço multimídia, integrando material de áudio e vídeo ao espaço originalmente reservado aos livros. A aquisição desse material já foi negociada?

¿ Nós já estamos em contato com algumas empresas brasileiras que desenvolvem o chamado livro digital. Essa tecnologia é muito atraente pela facilidade de transporte, já que é possível carregar dezenas de volumes em minúsculos chips. Outro atrativo é o baixo custo, enquanto um livro impresso sai por cerca de R$ 40, um livro digital não custa mais de R$ 4. Conversamos com empresas de televisão que se propuseram a disponibilizar arquivos de vídeo e cinema.

¿ Até agora, todo o dinheiro investido nas obras do Complexo Cultural veio do governo do Distrito Federal. Não existe interesse da iniciativa pública em investir nessas obras?

¿ A construção do Museu Nacional e da Biblioteca Nacional constitui o maior investimento físico em obras para benefício da cultura da América Latina. Várias empresas privadas já mostraram interesse em parcerias principalmente em construções futuras como o Centro de Musica, o Centro de Cinema e a galeria de ligação subterrânea. Acredito que quando a primeira metade do Complexo Cultural concluída ficará mais atrativo para a iniciativa privada investir. Além disso, a lei de Parceria Público-Privadas é recente, o mercado ainda esta se familiarizando com ela.