O Globo, n.31.588, 31/01/2020. Economia. p.26
Declaração da OMS leva alívio aos mercados
Gabriel Martins
João Sorima Neto
Leo Branco
O temor em relação ao coronavírus levou turbulência aos mercados durante boa parte do dia ontem. O dólar comercial chegou a ser negociado a R$ 4,272, e o Ibovespa, principal índice da Bolsa brasileira, registrou perda de 2,21% na mínima do dia. O anúncio oficial da Organização Mundial da Saúde (OMS), porém, levou certo alívio aos mercados: apesar de a entidade declarar situação de emergência global, não houve restrições ao comércio e a viagens.
O dólar fechou em alta de 0,90%, a R$ 4,257, a segunda maior cotação já registrada — abaixo apenas dos R$ 4,258 de 27 de novembro. Já o Ibovespa se beneficiou de um período maior de negociação depois do anúncio da OMS, que ocorreu às 16h30m, para encerrar com ganho de 0,12% aos 115.528 pontos.
—A OMS não impôs restrições a viagens de qualquer tipo nem recomendou limitar o comércio. Além disso, informou que, apesar de declarar emergência global, mantém o voto de confiança de que a China está tomando todas as medidas para estancar a disseminação da doença. Com isso, o dólar recuou um pouco no final do pregão — disse o economista de um banco de São Paulo, que não quis ser identificado.
Em Nova York, os mercados também se beneficiaram. O índice Dow Jones fechou em alta de 0,44%, enquanto o S&P, mais amplo, avançou 0,31%. Mas na Europa e na Ásia, por causa do fuso horário, houve perdas fortes. Londres recuou 1,36%, e Frankfurt, 1,41%. Em Tóquio, o índice Nikkei perdeu 1,72%. Já a Bolsa de Taiwan, em seu primeiro dia de operação depois do Ano Novo Lunar, desabou 5,75%.
Embora seja ainda cedo para dimensionar o impacto que o coronavírus pode causar na economia chinesa e global, alguns bancos já começaram a cortar as estimativas para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) da segunda maior economia do mundo. JP Morgan e Wells Fargo reduziram suas projeções de expansão este ano de 5,9% para 5,8%.
AVANÇO DO VÍRUS NO RADAR
Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra, avalia que, por enquanto, os maiores impactos econômicos do coronavírus seriam na China.
Mas se a epidemia afetar os Estados Unidos com o mesmo ímpeto, há chances de danos ao comércio internacional e a outras economias.
— Se o comércio mundial cai, o Brasil exporta menos, e os preços das commodities recuam. O fluxo de capitais também cai durante uma crise — diz Oliveira, ressaltando que países de economia fechada, como o Brasil, são menos afetados nesses casos.
Em relatório, o banco suíço Julius Baer afirmou que “haverá algum impacto sobre a economia, masa magnitude ainda é desconhecida ”. A instituição estima queda entre 5% e 6% no mercado de ações americano. Mas ressalta que, no caso de uma rápida escalada de casos da doença, aqueda pode chegara dois dígitos.
Para Luciano Rostagno, estrategista-chefe do banco Mizuho, a situação podes e agravara partir de 3 de fevereiro, quando a população chinesa retomará suas atividades após o feriado do Ano Novo Lunar:
—Se o contágio e a letalidade forem muito acelerados, o governo precisará adotar mais medidas de controle. Um possível fechamento de portos e aeroportos preocupa o mercado.
Na volatilidade, não é aconselhável mexer na carteira
Gabriel Martins
Em meio à forte volatilidade provocada pelo coronavírus —até ontem a queda acumulada do Ibovespa no ano era de 0,1%, enquanto o dólar tinha valorização de 5,58% no período —, especialistas recomendam que quem já tem dinheiro investido deve manter suas aplicações. Aqueles que estão com recursos parados na conta corrente devem procurar opções mais seguras, como títulos públicos ou ouro.
—Para quem tem um perfil mais arrojado, este cenário é uma oportunidade para comprar ações, já que os papéis estão mais baratos. Porém, esse investimento demanda uma estratégia de longo prazo e é voltado para aquele investidor que consegue passar por momentos de turbulência sem se desesperar — explica Thiago Salomão, analista da Rico Investimentos.
Para quem se arriscou em renda variável e ficou preocupado ao veras perdas no extra todos investimentos, Salomão recomenda não mexer nas aplicações por enquanto:
—A volatilidade é o preço a pagar por investimentos que dão mais retorno, como a renda variável. Quem não está disposto apagares se preço, por enquanto, devem anteras aplicações já feitas.
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim, ressalta que, devido à elevada volatilidade, o investidor que quiser fazer alguma movimentação em sua carteira precisa estar bem atento:
— O mercado ainda passa por um nível de incerteza muito grande. Como estamos falando de pessoas físicas administrando os próprios investimentos, é preciso ter bastante cautela para não tomar medidas precipitadas.
Sacar os recursos da renda variável pode levar a uma perda com poucas chances de recuperação, alerta Álvaro Bandeira, economista-chefe do banco digital Modalmais:
— Se um investidor perdeu entre 5% e 10% de seus recursos em renda variável e retira o que sobrou para aplicar em renda fixa, dificilmente vai recuperar esse montante perdido com a volatilidade. É preciso manter a calma e aguardar a recuperação dos mercados para não sair no prejuízo.
NÃO APOSTE TUDO NO OURO
Padovani avalia que, no atual cenário, os títulos públicos são a aplicação de menor risco. Salomão, da Rico, concorda:
—O investimento no Tesouro Selic ou em fundos de renda fixa, com baixa taxa de administração e retorno de 100% do CDI, são indicações para este momento. O retorno não é alto, mas a rentabilidade está garantida, e os recursos podem ser movimentados quando o investidor desejar.
Outra opção é o ouro, visto como porto seguro em momentos de turbulência. Mas, diz Salomão, não é aconselhável se desfazer de todas aplicações para apostar só no metal:
—Na crise, o ouro sobe. Mas quando o mercado se estabiliza e os investidores voltam para outros ativos, o metal perde esse ímpeto de alta. O ouro é um ativo de proteção que deve fazer parte da carteira, talvez cerca de 15%. Mas não é correto colocar tudo nele.