O Globo, n. 31504, 08/11/2019. Economia, p. 19

Estabilidade de servidor deve variar conforme carreira, afirma Guedes
Marcello Corrêa


O governo deve propor ao Congresso que novos servidores tenham regras de estabilidade de acordo coma carreira em que ingressarem. A informação foi adiantada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, durante palestra no Tribunal de Contas da União (TCU). Segundo Guedes, caberá às próprias categorias opinarem sobre qual é o prazo ideal para que novos concursados adquiram esse direito.

— Nós vamos discutir com cada carreira. Vocês( servidores) vão nos orientar qual é o tempo de teste. Pode ser que na Polícia Federal seja de três anos, porque tem que botar o cara par acorrer atrás de bandido, e não vai esperar dez anos. Se for só para carimbar algum papel, pode ser de 15 anos — adiantou o ministro, lembrando que as mudanças não afetam os atuais servidores.

Hoje, a Constituição prevê que o servidor tem direito à estabilidade após cumprir três anos de estágio probatório, período em que é avaliado e pode ser demitido por mau desempenho. Para alterar a regra, o governo enviará uma proposta de emenda à Constituição (PEC) à Câmara dos Deputados. O texto deve ser apresentado na próxima terça-feira.

Para especialistas, a medida pode fazer sentido se privilegiar as chamadas carreiras de Estado, como auditores fiscais e policiais federais, mais sujeitas às pressões políticas. O ex-secretário da Administração Federal João Santana, responsável pela reforma administrativa do governo do ex-presidente Fernando Collor de Mello, lembra que a estabilidade foi criada para isso, mas acabou se expandindo para todo o funcionalismo:

— O importante é que as carreiras de Estado sejam aquelas clássicas, fiscal, promotor público. O corpo administrativo não precisa ter estabilidade.

Santana conta que a ideia chegou a ser proposta em 1990, mas não foi à frente:

— Chegamos a abrir uma discussão, mas ela sequer foi aceita. Talvez hoje seja um outro país, se passaram 30 anos. O grande inimigo de qualquer reforma administrativa efetiva é uma coisa chamada corporativismo. Perdemos por 7 a 0 na época.

O economista Nelson Marconi, professor da FGV, pondera que a mudança pode encontrar entraves jurídicos:

— Juridicamente é muito difícil fazer isso. Você pode até criar regimes jurídicos diferentes. Um é estável, outro não é, outro é temporário. Agora, você criar dentro do mesmo regime e dizer que a estabilidade vai ser atribuída depois de um certo tempo, acho realmente muito difícil. É querer tratar de forma diferente coisas iguais.

Segundo Marconi, não faz sentido conceder estabilidade depois de muito tempo:

— O instituto da estabilidade existe justamente para proteger o servidor. Por que dar estabilidade depois, se ele ficou dez anos desprotegido? É importante dar estabilidade para carreiras que podem sofrer maior pressão política, incluindo professor. Mas, em outras, em que isso é menos importante, acho possível não ter estabilidade.

A proposta deve ser marcada por embate na Câmara. Enquanto abancada do funcionalismo defende que as regras atuais de estabilidade não sejam alteradas, há parlamentares que apoiam a iniciativa.

— Deveria ter estabilidade em carreiras de Estado. Em outras carreiras não deveria ter sequer essa possibilidade — afirma o líder do DEM, Elmar Nascimento (BA).

“Pode ser que na Polícia Federal seja de três anos, porque tem que botar o cara para correr atrás de bandido, e não vai esperar dez anos. Se for só para carimbar algum papel, pode ser de 15 anos”

Paulo Guedes, ministro da Economia