O Globo, n. 31502, 06/11/2019. Economia, p. 21

Proposta prevê corte de até 25% nos salários de servidores
Marcello Corrêa
Manoel Ventura


As propostas de controle de gastos públicos apresentadas ontem pelo governo permitem que União, estados e municípios cortem até 25% dos salários de servidores públicos, com redução proporcional da carga horária, por período de até dois anos, conforme o previsto na PEC Emergencial. A medida faz parte de uma série de mecanismos desenhados para ajudar a reduzir despesas obrigatórias em períodos de crise, como o vivido pelo país atualmente.

O ajuste está previsto em duas propostas de emenda à Constituição (PEC) entregues ao Senado. Na PEC emergencial, seria acionado pelo governo federal por causa do descumprimento da chamada regra de ouro, que impede a União de se endividar para pagar despesas correntes, como folha de pagamento. Como essa regra já foi descumprida, os cortes no funcionalismo entrariam em vigor imediatamente, caso a proposta seja aprovada.

A possibilidade de ajuste também foi incluída na PEC do Pacto Federativo, para que funcione como um remédio a ser usado em futuras crises. O texto prevê que, no futuro, seja acionado o Estado de Emergência Fiscal. Para o governo federal, os gatilhos de corte de gastos serão acionados quando a União perceber que descumprirá a regra de ouro no ano seguinte. Neste caso, as medidas valeriam por um ano, podendo ser renovadas até as contas voltarem ao equilíbrio.

Para estados e municípios, os mecanismos, nas duas regras, são acionados sempre que a despesa corrente do ente superar os 95% da receita corrente por um ano, um novo parâmetro apresentado ontem pelo governo.

‘Shutdown’ à brasileira

O ministro da Economia, Paulo Guedes, chamou a medida de shutdown à brasileira. Nos Estados Unidos, isso ocorre quando há paralisação total de pagamentos de salários e de alguns serviços públicos por falta de verbas.

— É o shutdown à brasileira. É suave. Quer dizer, paga todo mundo, só não fica dando aumento — afirmou.

A redução de salários de servidores é a principal medida da PEC emergencial e garantiria uma economia de R$ 10 bilhões já no ano que vem. A outra principal medida seria a suspensão da progressão funcional de servidores públicos, com economia de cerca de R$ 2 bilhões no ano que vem e até R$6bilhõesem2021.Emdois anos, a equipe econômica espera que o impacto fiscal seja de R$ 28 bilhões.

— Não pode dar aumento de salário nem ter progressão de carreira quem está quebrado. A máquina não pode gastar mais consigo do que com a população. Queremos um Estado que nos sirva — comentou Guedes.

O ministro também afirmou que essa condição não deve durar mais que dois anos, já que, segundo ele, o PIB vai crescer:

— Nenhuma crise fiscal dura mais que um ano ou dois.

A PEC emergencial suspende ainda a criação de despesas obrigatórias e de benefícios tributários. A proposta também prevê outras medidas para conter gastos públicos: algumas emergenciais, com duração de até dois anos, e outras permanentes, como a possibilidade de revisar, de quatro em quatro anos, o montante de benefícios fiscais concedidos pela União, conforme antecipou O GLOBO.

Especialista em contas públicas, a economista Ana Carla Abrão, sócia da consultoria Oliver Wyman e ex-secretária de Fazenda de Goiás, destaca que as medidas anunciadas terão um impacto positivo no longo prazo, caso sejam aprovadas pelo Congresso:

— A PEC emergencial vai dar fôlego aos estados ao congelar promoções e salários de servidores e permitir a redução de jornada. Além disso, abre espaço para reestruturação de carreira e ajuste de pessoal.

Os principais pontos da PEC Emergencial

> Tem duração de dois anos.

> União, estados e municípios não poderão promover funcionários, dar reajustes e fazer concursos. Será suspensa a criação de despesas obrigatórias e poderão ser reduzidos em até 25% a jornada e o salário do servidor. A medida também foi incluída na PEC do Pacto Federativo, para ser acionada em caso de emergência fiscal.

> Suspende repasse dos recursos do FAT para o BNDES.

> No caso de estados e municípios, as medidas serão tomadas sempre que as despesas excederem 95% da receita corrente.

> Um quarto da economia (25%) vai para projetos de infraestrutura.

(Colaborou Léo Branco)