O Estado de S. Paulo, n. 46931, 15/04/2022. Política, p. A8

TSE pede apoio a observadores internacionais contra pressão de Bolsonaro

Weslley Galzo 


Sob pressão política interna, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu recorrer a observadores internacionais para aplacar ataques à lisura das eleições deste ano. A Corte disparou diversos ofícios com convites para autoridades e organizações internacionais acompanharem a disputa pelo Palácio do Planalto. A medida ocorre em meio a discursos do presidente Jair Bolsonaro que questionam de forma antecipada o resultado das urnas. As respostas aos chamamentos da Justiça Eleitoral devem começar a chegar entre o fim deste mês e o início de maio.

Dentre os convidados estão a União Europeia, a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Carter Center, organização fundada pelo ex-presidente dos Estados Unidos Jimmy Carter na área dos direitos humanos.

A reação foi imediata. Em nota, o Ministério das Relações Exteriores afirmou na última quarta-feira que o eventual convite à comunidade europeia destoa do modo de funcionamento convencional das missões de observação. A pasta não recebeu com satisfação o movimento da Justiça Eleitoral de trazer observadores, segundo uma fonte do TSE.

No comunicado, o Itamaraty disse "não ser da tradição do Brasil ser avaliado por organização internacional da qual não faz parte". Ainda cita como exemplo o fato de que a União Europeia "não envia missões eleitorais a seus próprios estados membros". No TSE, porém, prevalece o interesse de poder contar com grandes organizações internacionais.

Diferentemente dos observadores comuns, as Missões de Observação Eleitoral (MOE) têm como objetivo "contribuir para o aperfeiçoamento do processo eleitoral, ampliar a transparência e a integridade, bem como fortalecer a confiança pública nas eleições". Esses grupos também celebram acordos com o compromisso de produzir relatórios, em até um ano, com as conclusões e eventuais recomendações ao TSE.

2018. A OEA atuou como missão observadora durante as eleições presidenciais de 2018 no Brasil. Na ocasião, a instituição parabenizou os esforços do tribunal contra as fake news. Foi

um gesto de cortesia. Naquele ano, a Justiça Eleitoral brasileira foi criticada por não tomar iniciativas concretas contra a proliferação de notícias falsas. O Conselho Consultivo sobre Internet e Eleições, instalado pelo TSE naquele ano, nem sequer se reuniu presencialmente durante a disputa.

Outros convidados de destaque foram o Parlamento do Mercosul (PARLASUL), a União Interamericana de Organismo Eleitorais (Uniore), a Fundação Internacional para Sistemas Eleitorais (IFES) e a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) – este último confirmou em reunião com o presidente do TSE, Edson Fachin, que enviará uma missão de observação ao Brasil.

O TSE também tem se colocado à disposição de outros países para reforçar o intercâmbio observador, como já fez em anos anteriores. O tribunal deve ter um de seus ministros efetivos escalado para acompanhar as eleições presidenciais da França, cujo segundo turno será disputado no dia 24 de abril. "Iremos nos integrar de pronto ao esforço da comunidade eleitoral internacional pela defesa da democracia e em articulação com instituições e entidades encarregadas dos processos eleitorais no contexto global", disse Fachin ao tomar posse na presidência do TSE em fevereiro. "O Brasil observa o mundo e o mundo observa o Brasil", destacou em outro evento.

Histórico. Com o passar dos anos, o número de observadores internacionais nas eleições brasileiras caiu. Levantamento feito pelo TSE e obtido pelo Estadão mostra que, nas eleições municipais de 2020, apenas seis convidados estrangeiros, de quatro países da América Latina, estiveram no Brasil para acompanhar a qualidade do processo eleitoral.

Na eleição de 2018, vieram ao País 36 convidados e quatro organizações de 14 países diferentes – a maioria africanos e latino-americanos em situação democrática menos consolidada que a do Brasil; as exceções foram Portugal e Coreia do Sul. Os números, porém, nem se comparam com as votações de 2014 e 2010, quando mais de 50 autoridades de 20 nacionalidades diferentes fiscalizaram o sistema eleitoral brasileiro.

No contexto recente da campanha de Bolsonaro contra o sistema eleitoral, a presença de missões de observação, tida como normal em países com a democracia em xeque, está voltando a crescer no Brasil. Coordenadora-geral da Transparência Eleitoral Brasil, Ana Cláudia Santano pondera que não é função dos observadores eleitorais "validar resultados". "Caso aconteça a contestação do resultado das eleições, existe um universo de medidas, mas quem tem que validar o placar é a autoridade eleitoral", afirma ela, que tem experiência como observadora no exterior.

O TSE, contudo, busca respaldo nos observadores mais influentes de países ricos. A professora de direito público da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Rio) Silvana Batini reforça a importância de o Brasil contar com organizações que sejam referências em observação eleitoral, diferentemente do que aconteceu em anos anteriores a 2018. "O movimento de observadores internacionais que vinha para o Brasil era menos para conferir a credibilidade e mais para observar a nossa experiência e levar os nossos avanços", afirmou. "Agora é importante que venham confirmar a segurança do sistema mais do que simplesmente nos copiar." •

"Iremos nos integrar de pronto ao esforço da comunidade eleitoral internacional pela defesa da democracia."

Edson Fachin,

presidente do TSE, ao tomar posse na Corte, em fevereiro