O Globo, n. 31488, 23/10/2019. País, p. 10

Eduardo vence no PSL, mas desiste da embaixada

Bruno Góes
Naira Trindade
Marco Grillo


Num dia em que acumulou vitórias na guerra interna do PSL, o deputado Eduardo Bolsonaro (SP) anunciou em discurso na Câmara ontem à noite que desistiu da indicação para a Embaixada nos Estados Unidos. O desfecho já havia sido prenunciado na véspera pelo presidente Jair Bolsonaro, que declarou preferir que o filho se dedicasse a cuidar dos conflitos no partido — ontem Eduardo manteve-se como líder da bancada na Câmara.

Uma aprovação da indicação no Senado já havia se tornado improvável. Na Câmara, Eduardo disse que “fica no Brasil”:

— (Tenho) portas abertas para quem sabe no futuro... Podem ter certeza que não foi decisão fácil. Mas eu conto com o apoio dos amigos — discursou, antes do encerramento da votação que aprovou o acordo do Brasil com os EUA sobre o uso da base de Alcântara. — Este que vos fala diz que fica no Brasil para defender os princípios conservadores para fazer o que foi o tsunami da eleição de 2018 uma onda permanente.

Se teve de reconhecer a impossibilidade de assumir a embaixada, na disputa dentro do PSL Eduardo teve um dia favorável contra o grupo ligado ao presidente da sigla, o deputado Luciano Bivar (PE). Eduardo firmou-se como líder da legenda na Câmara a última disputa de listas para indicação ao posto, após vencer o adversário, Delegado Waldir (GO), que tentava recuperar a posição desde segunda-feira.

Em outra frente, a ala bolsonarista conseguiu uma liminar no Tribunal de Justiça do Distrito Federal barrando qualquer tipo de punição aos 19 parlamentares, incluindo Eduardo Bolsonaro, que tiveram processos de infração disciplinar abertos pelo PSL. Bivar, que atua para punir os deputados, minimizou ontem a possibilidade de o partido destituir o senador Flávio Bolsonaro (RJ) do comando do diretório do Rio de Janeiro, e o irmão Eduardo, que dirige o PSL em São Paulo.

O presidente do PSL disse que a troca poderia “estar nos sentimentos pessoais” do Delegado Waldir, “mas não no sentimento do partido”. A medida foi estudada internamente na semana passada como forma de atingir os filhos de Bolsonaro. O diretório de Minas Gerais também passaria por intervenção, para desgastar o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, embora já esteja licenciado da presidência da legenda no estado.

Mudança de tom

A confirmação de Eduardo Bolsonaro como líder precedeu mais uma guerra de listas que haviam sido protocoladas na segunda-feira e estavam pendentes de conferência pela Mesa da Câmara, concluída ontem. Delegado Waldir obteve 26 apoios válidos. Dois foram retirados e um estava repetido. As assinaturas retiradas foram de Daniel Freitas (SC) e Leo Motta (MG).

Na lista pró-Eduardo, cuja verificação foi concluída ontem, foram obtidas 28 assinaturas. Para que um parlamentar seja considerado líder do PSL, é necessário o apoio de mais da metade da bancada de 53 deputados. Ou seja, 27 nomes válidos. Até a noite de ontem, não havia outras listas protocoladas para um nova mudança na liderança do PSL. O nome de Marcelo Brum (PSL-RS) apareceu nas duas relações, tanto a de apoio a Waldir quanto a que endossou Eduardo.

Ontem, Eduardo tentou diminuir o tom, indicando que as divergências internas do partido, expostas ao longo das últimas semanas, devem ser superadas. Ele afirmou que “o pior da turbulência já passou” na legenda e que não será bom manter as trocas de farpas.

— Chega uma hora que ninguém aguenta mais. Não é produtivo manter isso (troca de acusações) durante um longo prazo. As farpas foram trocadas, e agora chegamos no day after disso tudo —disse o líder do PSL.

A briga no PSL já chegou ao Judiciário. O juiz Alex Costa de Oliveira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, tornou sem efeito os processos disciplinares abertos pelo PSL contra Eduardo e outros 18 do grupo porque as “notificações estavam desacompanhadas do inteiro teor da representação”.

Com isso, a reunião na sede do partido, em Brasília, para dar início aos processos disciplinares, não contou com a presença de nenhum dos alvos da representação. Caso a Justiça permita a continuidade da instauração dos processos, as punições podem ser de simples advertência, suspensão de atividades partidárias, ou até mesmo expulsão. Após uma notificação válida, eles têm cinco dias úteis para a apresentação de defesas, segundo o estatuto do partido.

Em outra via, Bivar acionou judicialmente a advogada eleitoral Karina Kufa pedindo que ela dê explicações sobre recentes declarações em que cita haver “voto de cabresto” no partido e sobre a menção a um “mau uso do dinheiro público” em relação ao fundo partidário. Na ação, Bivar elaborou 16 perguntas sobre entrevista da advogada ao GLOBO, na última semana. O grupo do dirigente entende que o conteúdo afronta a honra de Bivar e pode ensejar em ação penal por “calúnia” e “difamação”. A ação foi ajuizada no Tribunal de Justiça de São Paulo.

Na entrevista, Karina Kufa diz que “jamais” haverá dentro do PSL uma eleição equilibrada para o comando da legenda por conta dos “votos de cabresto”. A pergunta se referia ao incômodo sobre o presidente nacional da sigla manter três filhos nos quadros da Executiva Nacional. (Colaborou Amanda Almeida)