O Globo, n.31.582, 25/01/2020. País. p.10

Governo deve perder influência em pautas na CCJ 
Bruno Góes 

 

Após dar mostras de fragilidade na interlocução com o Congresso em 2019, o governo do presidente Jair Bolsonaro deve experimentar neste ano uma redução ainda maior em sua influência na tramitação de projetos da Câmara dos Deputados. No início dos trabalhos do Legislativo, em fevereiro, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), principal colegiado da Casa, sairá das mãos do PSL, hoje presidida por Felipe Francischini (PR), e passará a um parlamentar indicado por outro partido. A disputa pela vaga, segundo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), está entre três legendas: Republicanos, MDB e PDT. Embora a crise interna do PSL tenha afastado Francischini do Planalto — por conta do apoio do parlamentar à permanência de Delegado Waldir (PSL-GO) na liderança do partido na Casa —, o atual presidente da CCJ buscou tocar projetos de interesse do governo e de sua base eleitoral até o fim de 2019. Francischini trabalhou, por exemplo, para dar prosseguimento à tramitação do pacote anticrime do ministro Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública) e da PEC que permite a prisão após condenação em segunda instância. Rachado, o PSL ainda pretende entrar na disputa para emplacar um sucessor, mas a tendência é que prevaleça o grupo alinhado a Maia. No Republicanos, estão cotados para assumir a presidência da CCJ João Roma (BA), ligado ao presidente do DEM, ACM Neto, e Lafayette de Andrada (MG). O PDT, partido de oposição a Bolsonaro, quer indicar Afonso Motta (RS). O MDB, último postulante, ainda não tem nome definido. — O acordo é rodízio com Republicanos, PDT e MDB. Esses três partidos. No início da Legislatura vamos organizar a ordem. Foi este o acordo —disse Maia ao GLOBO.

DIFICULDADE DE DIÁLOGO

A provável mudança de comando da CCJ ocorre em um momento de maior fragilidade do governo no Congresso. Dividido, o PSL perdeu força para negociar a ocupação de espaços a partir deste ano. À época da eleição que reconduziu Maia à presidência da Câmara, o PSL indicou que tinha acordo para apontar o sucessor de Francischini na CCJ em 2020. O nome seria o da deputada Bia Kicis (DF), que faz parte da ala do PSL mais alinhada ao presidente Jair Bolsonaro. A parlamentar, que embarcou no projeto de fundação do partido Aliança pelo Brasil, diz que ainda pretende pleitear a vaga e que seria presidente da comissão caso haja um consenso. Uma unidade interna no PSL, porém, é improvável. O ex-líder do PSL Delegado Waldir (GO) não dialoga com o atual líder, Eduardo Bolsonaro (SP), depois de os dois terem travado uma disputa para comandar a bancada. Eduardo ainda pode perder a liderança caso uma decisão judicial que revogou as suspensões partidárias de deputados bolsonaristas seja revertida. Neste caso, assumiria Joice Hasselmann (SP), adversária interna do atual líder do partido e aliada do presidente nacional do PSL, Luciano Bivar. Antes do recesso parlamentar, em dezembro, mesmo afastado do grupo bolsonarista que decidiu criar o Aliança, o atual presidente da CCJ Felipe Francischini repetia a aliados que tinha o maior índice de aprovação de projetos de interesse do governo entre os mais recentes presidentes da comissão. Ele reconhece, porém, que a proximidade com Maia e a pauta econômica em comum foram fundamentais para seu desempenho na comissão. Desde o início da Legislatura,

Francischini se queixou a aliados da falta de interlocução com o Planalto. Para aprovar a reforma da Previdência na CCJ, por exemplo, ele teve dificuldades de dialogar com o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e com o próprio presidente da República. Francischini também foi ignorado ao pleitear ajuda para reforçar a articulação política no Congresso.