O Globo, n.31.581, 24/01/2020. País. p.08

Ministro defende que STF julgue logo juiz de garantias
Carolina Brígido 

 

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), alertou ontem para a necessidade de o plenário da Corte definir logo a legalidade ou não da criação do juiz de garantias, instrumento previsto na Lei Anticrime suspenso após decisão do ministro Luiz Fux. Para Lewandowski, a atual situação é de indefinição e de insegurança jurídica.

“A indefinição sobre a constitucionalidade do juiz de garantias gera insegurança jurídica, podendo acarretar a anulação de ações penais em curso”, afirmou o ministro em nota.

A declaração foi uma crítica à decisão de Fux, que suspendeu liminar dada semana passada pelo presidente da Corte, Dias Toffoli. O presidente havia determinado prazo de seis meses para a norma entrar em vigor, mas Fux derrubou essa decisão e suspendeu a regra do juiz de garantias por tempo indeterminado. Fux foi sorteado relator do caso. Portanto, cabe a ele liberar o processo para julgamento em plenário, com a presença dos onze ministros do Supremo. Não há prazo previsto para isso acontecer.

Ontem, o ministro Marco Aurélio Mello também criticou a decisão de Fux, que chamou de “autofagia”, por colocar ministros do Supremo contra seus colegas. Para Marco Aurélio, o colega agiu como “censor” de Toffoli.

— A autofagia é péssima, conduz à inseguranca jurídica, ao descrédito da instituição —disse Marco Aurélio ao GLOBO, completando:

— Não há censor no Supremo, e acabou o ministro Fux assumindo a postura de censor em relação a um ato logo do presidente do Supremo. Respeite-se um pouco mais essa cadeira, para benefício da sociedade como um todo. Essa problemática é nefasta, ruim e perniciosa.

Marco Aurélio costuma chamar de “autofagia” a prática de um ministro do STF derrubar a decisão de um colega. Ele citou como exemplo um caso rumoroso de 2009, em que o ministro deu liminar para o garoto Sean Goldman ser ouvido pela Justiça antes que fosse definido se a guarda dele permaneceria com a família brasileira, ou com o pai, nos Estados Unidos. Em seguida, Gilmar Mendes cassou a liminar e autorizou que o rapaz embarcasse para os EUA.

Marco Aurélio também lembrou que, em 2019, pouco antes do recesso de fim de ano, deu uma liminar autorizando a libertação de presos condenados por tribunais de segunda instância. Durante o recesso, Toffoli cassou a decisão. O presidente derrubou, ainda, outras duas decisões que tinham sido dadas por Marco Aurélio: uma sobre a licitação da Petrobras e a outra, sobre a eleição da Mesa Diretora do Senado. Agora, ressaltou, o próprio Toffoi foi alvo da “autofagia”.

PACOTE ENTRA EM VIGOR

Aprovada pelo Congresso Nacional em dezembro e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, a lei conhecida como “Pacote Anticrime” entrou ontem em vigor. O texto prevê criar o juiz de garantias, figura que passaria a acompanhar e autorizar etapas dentro do processo, sem dar a sentença do caso, tarefa que caberia a outro magistrado. Hoje, o juiz que conduz a fase de inquérito é o mesmo responsável pela sentença ao fim do processo.