Título: A América Latina no radar de Washington
Autor: Juan Tokatlian
Fonte: Jornal do Brasil, 18/04/2005, Internacional / Além do Fato, p. A12

Narcotráfico, desestabilização e populismo são os principais conflitos da região que inquieta os Estados Unidos e estimulam sua política de intervenção na área. De fato, a América Latina reapareceu no radar de Washington. A região andina, por exemplo, tomada por uma agenda negativa ¿ narcotráfico, desestabilização, etc. ¿, preocupa os EUA. Como na Guerra Fria, Washington teme que as crises na região produzam um efeito dominó negativo que exacerbe as tensões existentes no Sul (Cone Sul) e no Norte (América Central) do continente. Também como na Guerra Fria, há um dado ideológico: se antes o comunismo foi o inimigo inexorável, hoje ele é o populismo radical. O então comandante do Comando Sul, general James Hill, afirmou diante do Congresso de seu país, no ano passado, que às ameaças tradicionais na América Latina ¿se agrega uma ameaça emergente, que pode ser descrita como o populismo radical¿. Seu exemplo era a Venezuela de Hugo Chávez.

Há pouco, a tese de Hill, abalada pelo novo responsável deste Comando, o general Brantz Craddock, parecia distante dos civis. A relevância do encontro entre Condoleezza Rice e Rafael Bielsa esteve na definição do populismo radical como uma ameaça para os EUA, idéia que atravessará a política externa e de defesa da Casa Branca nos próximos anos.

Caso semelhante é o da Colômbia, onde os Estados Unidos organizaram uma intervenção indireta, com ajuda militar maciça e diplomacia muscular, mas sem participação direta nos combates. O país tem a segunda maior embaixada americana no mundo depois do Iraque, com 800 militares, é o principal receptor de ajuda americana na América Latina e o quinto destinatário de recursos militares no mundo, depois de Israel, Egito, Afeganistão e Iraque. Entre 1998 e 2004, Bogotá recebeu US$ 3,647 bilhões e em 2005 projeta-se US$ 781 milhões.

Na Bolívia, os EUA insistem na ¿guerra contra as drogas¿, que não desarticulou o negócio nem melhorou a força do Estado. Os poderosos ainda são os produtores de coca e as máfias que lucram com o tráfico.

O interesse renovado dos Estados Unidos no mundo andino se dá com os mesmos mecanismos de tempos atrás. Se ontem não produziu ordem melhor, hoje pode gerar mais desordem. A América do Sul não está em condições de viver uma outra Guerra Fria com novos ¿eixos do mal¿, ¿mudanças de regime¿ ou ¿ataques preventivos¿.

Até o fim de 2000, a Argentina havia tido uma política de reação, inconsistente e sem foco nos Andes.

A Argentina é, depois dos EUA, o segundo investidor do hemisfério na Venezuela, com mais de US$ 4 bilhões; o cerne da situação na Colômbia passa por uma solução negociada para o conflito armado; os impasses entre Bogotá e Caracas podem aumentar novamente; a interdependência com a Bolívia (recursos energéticos, rede de narcotráfico, mobilização de grupos étnicos, fluxos migratórios) é significativa, e nossa obscura intromissão (através da venda clandestina de armas) na guerra entre Equador e Peru de 1995 deteriorou as relações com Lima e não implicou em uma maior ascensão sobre Quito. É importante que Buenos Aires desenhe uma estratégia realista. Além disso, é indispensável que Argentina e Brasil coordenem melhor as políticas em relação aos Estados Unidos frente ao turbilhão andino.

É tempo de moderação política, compromisso material e diplomacia antecipada. Só assim os interesses da área ¿ incluindo o dos EUA a longo prazo ¿ serão fortalecidos.

Este artigo foi publicado originalmente no jornal La Nación