Título: Médicos debatem tema
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 17/04/2005, País, p. A2
Cerca de 1.500 médicos de diversas áreas reuniram-se na última sexta-feira em Santos para discutir diversos temas, dentre eles, a ortotanásia. O direito do paciente de abrir mão de um tratamento extra, doloroso, para prolongamento da vida, é um dos principais pontos do projeto que tramita na Câmara. Os médicos tomam cuidado para diferenciar a prática do que se chama eutanásia - a prática, sem amparo legal, pela qual se busca abreviar, sem dor ou sofrimento, a vida de um doente reconhecidamente incurável.
- Assim como somos ajudados a nascer, devemos ser ajudados a morrer de forma natural. A vida humana não é apenas uma questão de sobrevivência física, mas de dignidade, valor ético e qualidade - defende o autor do projeto, Roberto Gouvêa.
Para o diretor de saúde pública da Associação Médica Brasileira (AMB), Samir Bittar, é um direito humanitário permitir que o paciente, em fase terminal, decida se deseja morrer em casa, na companhia de seus amigos ou familiares.
- É fundamental, contudo, deixar claro que a motivação dessa ação deve ser o espírito humanitário. Não o desejo de desocupar, pura e simplesmente, leitos de UTIs de hospitais públicos - acrescentou Samir.
O presidente da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), José Maria Orlando, lembra que a aprovação do projeto pode ajudar os médicos brasileiros. Apesar da legislação permitindo a ortotanásia já vigorar em São Paulo, o Código Penal Brasileiro ainda condena esta prática.
- Muitos profissionais de saúde deparam-se com a situação em que a ortotanásia apresenta-se como único caminho e não a fazem, com medo de medidas judiciais posteriores - confirmou José Maria.
A Ortotanásia se aplica nos casos de pacientes que caminham de maneira irremediável e iminente para a morte e os médicos - é obrigatório o diagnóstico de mais de um especialidade - suspendem os suportes vitais, tais como aparelhos de respiração artificial, drogas ministradas para controle de pressão ou batimentos cardíacos.
O mundo deparou-se há duas semanas com um caso clássico e doloroso. Consciente da proximidade da morte, o Papa João Paulo II recusou-se a ser transferido para o Hospital Gemelli, em Roma, e preferiu permanecer em seus aposentos no Vaticano. Vítima de câncer, o ex-governador de São Paulo, Mário Covas, em 2001, agiu da mesma forma. Quando Gouvêa foi procurá-lo, em 1999, para agradecer o apoio à tramitação do projeto, Covas foi claro.
- Não assino esta lei apenas como governador de São Paulo. Assino como governador e paciente - resumiu Mário Covas.