O Globo, n. 31445 , 10/09/2019. País, p. 4

A nova cara da Procuradoria
Aguirre Talento
Amanda Almeida
Naira Trindade


Indicado para comandar a Procuradoria-Geral da República (PGR) pelo presidente Jair Bolsonaro, o subprocurador Augusto Aras já começou a montar sua equipe com nomes politicamente conservadores e alinhados a Bolsonaro. Aras também deu início às articulações no Senado para sua sabatina e fez um gesto a procuradores ligados à Operação Lava-Jato de que eles terão espaço na sua gestão.

Aras já convidou formalmente dois nomes para compor sua equipe. Um é o procurador Ailton Benedito, chefe da unidade do Ministério Público Federal em Goiás, que havia sido indicado pelo governo Bolsonaro para participar da Comissão de Mortos e Desaparecidos, mas foi vetado pelo Conselho Superior do MPF.

Questionado, Benedito confirmou ao GLOBO o convite, mas disse que ainda não decidiu se o aceitará e que deve se reunir pessoalmente nesta semana com Aras para conversar sobre o assunto. Segundo ele, não há ainda cargo definido.

— Estamos avaliando como poderei colaborar — afirmou Benedito.

Posições políticas

No último domingo, Ailton Benedito fez uma publicação em sua rede social em defesa da decisão judicial do Tribunal de Justiça do Rio que autorizou a apreensão de livros na Bienal do Rio de Janeiro que tivessem temática LGBT. A prefeitura do Rio tentou recolher exemplares do romance gráfico “Vingadores, a cruza dadas crianças ”(Salvat), que tem a imagem de um beijo entre dois personagens masculinos. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, revogou a decisão.

“Todo o imbróglio sobre a tal publicação supostamente censurada na ‘Bienal do Rio’ tem uma gênese: a busca militante político-midiática de transformar a condição homossexual de parte da sociedade em nova ordem moral a ser imposta a todos, usando inclusive a força do Estado ”, escreveu Benedito.

O subprocurador aposentado Eitel Santiago Pereira foi convidado por Aras para assumir o cargo de secretário-geral do MPF, responsável pela gestão administrativa e orçamentária do órgão. Também de perfil conservador, Eitel anunciou no domingo em uma rede social que havia aceitado o convite, como adiantou o colunista Lauro Jardim. No seu perfil, ele também escreveu um artigo defendendo que o golpe militar de 1964 foi uma “revolução”.

“Com base nos argumentos expostos, em documentos da época e em testemunhos de pessoas que participavam ativamente da vida pública naquela quadra da vida nacional, considero mais correto o posicionamento dos que sustentam que houve uma revolução em 1964”, escreveu Santiago na conclusão do artigo, publicado em 5 de maio.

Aras também tem conversado com outros nomes, mas ainda sem definição nem convite formal. O comando da área criminal, responsável por coordenar as investigações da Lava-Jato na PGR, ainda está em aberto. Em conversas com interlocutores, Aras disse que pretende manter as equipes que fazem parte das forças-tarefas nos estados e que deseja o retorno dos procuradores do grupo de trabalho da Lava-Jato que pediram demissão em protesto contra a atual procuradora-geral, Raquel Dodge.

Após ter indicado Aras, Bolsonaro afirmou que a saída de membros do grupo da Lava-Jato foi um fator que pesou para desgastar o nome de Dodge na corrida pelo comando da PGR. Seis procuradores pediram demissão em protesto a uma manifestação dela que pediu arquivamento preliminar de trechos da delação premiada do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro. Aras foi indicado no dia seguinte.

Romaria

Depois de ligar para alguns parlamentares nos últimos dias, Aras começou o beija mão presencial aos parlamentares ontem. Num dia de Senado vazio, porém, só conseguiu visitar um senador, o vice-líder de governo Izalci Lucas (PSDB-DF). Também esteve no gabinete de Mecias de Jesus (Republicanos-RR), mas o senador não estava em Brasília. Na sua ausência, quem o recebeu foi o filho do parlamentar, o líder do Republicanos na Câmara, Jhonatan de Jesus (RR).

Ao GLOBO, Izalci disse que duas medidas asseguram seu voto em Aras: a promessa de independência no Ministério Público e de discrição à frente da PGR.

—  Aras garantiu que vai ser independente e discreto. Hoje, há uma divisão no Ministério Público e um certo exagero na interferência dos Poderes — diz o parlamentar, acrescentando:

— Tanto o MP quanto o Judiciário não deveriam se expor tanto como é hoje.

À presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), Simone Tebet (MDB-MS), Aras disse na semana passada, por telefone, que pretende visitar os 81 senadores. Ele será sabatinado pelo colegiado presidido pela senadora. A decisão final sobre a indicação é do plenário, no qual Aras precisa do voto de pelo menos 41 parlamentares.

Ontem, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), disse que a votação no plenário ocorrerá na semana do dia 22 de setembro, após o término do mandato da atual procuradora-geral, Raquel Dodge, no dia 17. O clima sobre a indicação de Aras no Senado é positivo. Além de apoio de governistas e departe dos independentes, ele também tem a simpatia de uma parcelada oposição, que não quer se indispor com o provável futuro procurador-geral da República (Colaborou Daniel Gullino).