Título: ''Projeto incentiva o servidor a poupar''
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 17/04/2005, Brasília, p. D3

O sistema de previdência da administração direta das fundações e autarquias do DF para os servidores públicos do GDF deve ser encaminhada à Câmara Legislativa até o final do Governo Roriz, afirma o secretário da Previdência do DF, Cícero Miranda. A idéia é que sejam criados fundos de pensão para completar a aposentadoria dos servidores públicos do DF. Isso porque a Reforma da Previdência estabeleceu um teto de 10 salários mínimos mensais para o servidor aposentado. Para quem ganha mais na ativa, a solução a solução apresentada é participar de fundos de pensão. Segundo Miranda, para que o sistema do DF seja implantando só depende de decisão política do governador. Na entrevista, o secretário defende ainda o uso de recursos de fundos de pensão para obras, como a construção da hidrelétrica Corumbá IV, em que o governo apresentaria uma contrapartida para o investimento. A idéia já foi criticada por representantes de fundos de pensão de empresas públicas. A Secretaria Extraordinária de Previdência foi criada em 1999, com o objetivo de implantar o sistema de previdência do DF.

Como será o sistema de previdência para os servidores públicos do GDF?

- Vamos ter regimes próprios de contribuição e paralelamente o servidor terá a previdência complementar, que são os fundos de pensão dos servidores públicos. Na realidade, o ponto principal desse projeto é incentivar o servidor a poupar. Com a reforma da previdência, o teto máximo da aposentadoria é de 10 salários mínimos, por isso é necessário o sistema complementar. A reforma da previdência em relação ao serviço público não criou muita coisa nova. Estamos seguindo inclusive parâmetros mundiais de países desenvolvidos, que já vêm empregando esse sistema com muito sucesso - a equivalência com o fundo de pensão para que o servidor tenha a sua correção de vida no momento de sua aposentadoria.

- Quais são os pontos principais desse projeto de criação dos fundos de pensão?

- Os pontos iniciais que fizemos foi acompanhando a filosofia de toda a Reforma da Previdência. Temos que fazer o enquadramento e o que queremos efetivamente é criar no nosso servidor o sentimento de poupança com relação aos fundos de pensão. Essa poupança será aplicada no mercado financeiro, no mercado de capitais, e com isso vai girar a economia e o estado vai ter um aporte muito grande de recursos, que serão originados dessa poupança. Deve-se ressaltar que o servidor não será prejudicado em nada.

Como foi criado esse projeto?

Para chegarmos à conclusão desse projeto, foram feitas várias avaliações atuariais. A avaliação atuarial é feita da seguinte forma: pegamos o que chamamos de tábua de vida do servidor público, onde consta tudo que ele fez, quando contribuiu, há quantos anos está no serviço público, e daí tiramos uma média e é com esse dado que trabalhamos na montagem do projeto. Isso para sabermos, por exemplo, se daqui a cinco anos, o servidor vai se aposentar. Isso é um trabalho muito técnico, estatístico, de acompanhamento para que na época em que o cidadão for se aposentar, não aconteça de não ter o dinheiro. É um dos enfrentamentos que o governo brasileiro tem que fazer com relação ao serviço público, como já fez com o INSS, que embora com toda a dificuldade, cumpre seu papel. No momento em que isso for aplicado corretamente no servidor público, nós teremos, com certeza, também, uma situação equivalente.

- O GDF tem que seguir parâmetros da lei federal, mas o que terá de diferente no sistema do DF?

A diferença é que nós temos um regime de caixa. Ou seja, o governo recolhe 11% de todo mundo. Quem é do regime, o governo vai cobrar esses 11% em cima do teto da contribuição dele. Vai ser nivelado com o INSS. Essa é uma das diferenças. Outra é a seguinte: criando esse sistema, o governo fica desobrigado do pagamento da aposentadoria integral, mas vai ter que dar a compensação através da previdência complementar. A compensação é um por um. O mesmo valor que o cidadão depositar, o governo também terá que contribuir.

- Como será a contribuição do servidor para o fundo de pensão?

Hoje, o servidor, por exemplo, ganha R$ 3 mil. Ele desconta 11% sobre os R$ 3 mil, o que dá R$ 330. Essa é a situação hoje. No momento em que o fundo for criado, e que haja equivalência, ele vai contribuir sobre 10 salários mínimos. Então, ele vai passar a contribuir com 11% sobre R$ 2.600, que resulta em R$ 286. Queremos que ele pegue essa diferença e aplique na previdência complementar. Um dos pontos bons dessa previdência é que ela vai incentivar o servidor a trabalhar a sua poupança para ter o rendimento.

- Os novos fundos de pensão do DF seguiram o exemplo dos fundos de empresas públicas, como o Fudiágua da Caesb, e a Faceb da CEB?

Os fundos daqui serão da administração direta das fundações e autarquias do DF. Os das empresas públicas, o governo participa delas, mas os funcionários são contribuintes do INSS. São a Regius do BRB, a Fundiágua, da Caesb, a Faceb da CEB e o da Terracap que é a Funterra - são quatro fundos de pensão dessas empresas públicas. Nós, governo, estados e municípios, tão logo sejam definidas todas as regras teremos nossos próprios fundos. Hoje praticamente todos os Estados já estão com seus projetos prontos, alguns já aprovados, outros não, como o nosso, que ainda depende de alguns ajustes.

- Quanto os fundos de pensão movimentam na economia?

É um número interessante. Esses quatro fundos das empresas públicas têm um patrimônio de R$ 1 bilhão. Eles operam aqui no DF, mas fazem investimentos em outros lugares, em projetos, porque o fundo de pensão busca o lucro - fazer o investimento para ter o retorno. Em relação à economia do país, nós temos em torno de 360 fundos que - todas as grandes empresas hoje têm os seus fundos de pensão, que movimentam o correspondente a 12,5% do PIB brasileiro.

- Os representantes da Regius, Faceb e Fundiágua reclamaram da proposta do governo do DF de usar recursos dos fundos para financiar obras da hidrelétrica Corumbá 4. O Governo realmente pretende usar recursos dos fundos para financiar obras?

Isso são querelas políticas. Aqui no DF, no momento em que elas têm sido levantadas, têm prejudicado muito o Estado. Temos o problema da terceira ponte do Lago Sul, que houve um atraso de quase um ano. Temos o problema do Metrô que foi atrasado em mais de dois anos - que ainda não está completo. É muito recurso exigido. No caso de Corumbá 4, as reclamações são uma forma de querer inviabilizar ou atrasar o projeto. Não tem sentido, tendo em vista que esse projeto do Corumbá é do mais alto significado para Brasília, porque é o problema da água, que o mundo inteiro fala, por ser o grande problema nos próximos séculos.

- Então, o governo realmente estuda usar os fundos de pensão para financiar obras públicas?

- Não tem nada de ilegal, nada de anormal nisso. É um investimento. Quem dirige o fundo é que vai definir. Os fundos são diferentes, não podem sofrer injunções políticas. Eles não são entidades financeiras, trabalham com a poupança dos servidores. Você imagina, se acontece com esses servidores de quando chegar na época de se aposentar, não ter dinheiro, porque foi mal investido. O próprio Ministério da Previdência tem a Secretaria de Previdência Complementar, que acompanha com muito rigor o uso do dinheiro dos fundos. O que seria proibido efetivamente é se esse projeto fosse do governo do DF. Aí o governo não podia pegar esse dinheiro do fundo daqui, para investir no projeto do próprio DF. Mas o projeto é de Goiás e o DF é um dos parceiros. E quem comanda é a Eletrobras, é o governo federal. Então não há nenhum problema que se faça investimento em obras do governo federal. A legislação é bem clara: os recursos não poderão ser utilizados no próprio Estado, exatamente para evitar ingerência política. Mas o fundo pode participar, principalmente sendo órgão federal. Pode investir em Letras do Tesouro Nacional, em qualquer órgão nacional e em qualquer lugar do país, não tem problema. Então, não vejo nenhuma dificuldade.

- Quais são os entraves para que o sistema de previdência do DF seja colocado em prática?

- Hoje temos pronto o projeto de previdência dos servidores. A União, os Estados e os municípios terão que ter os seus regimes de previdência próprios. Trabalhamos nisso há muito tempo, está tudo pronto, mas naturalmente que a implantação dependerá apenas de uma definição política do governador Joaquim Roriz.

- O que está impedindo essa decisão política do governador?

- O governador está aguardando o momento certo de encaminhar esse projeto à Câmara Legislativa. Acredito que ainda neste governo, ele vai fazer isso. Os Estados têm que acompanhar. Não podemos dizer: ''não vamos fazer''. Tem um prefeito afirmando que dispensou a contribuição dos inativos. Ele está incorrendo num brutal erro. Primeiro, ele não pode dispensar, porque é lei federal. Se fosse do Estado ou do Município, ele podia questionar. Agora, a lei federal tem que ser cumprida. Um prefeito não pode fazer isso, porque é um ato ilegal, passível inclusive de intervenção no município. O Congresso Nacional é a nossa casa maior, é quem dita as leis. Se não, não precisava. Aí o prefeito vai para a TV fazer média?

O DF foi um dos últimos estados a começar a cobrar dos inativos. Por quê?

- O desgaste político foi muito grande para iniciar a cobrança. Fomos o último Estado a instituir a cobrança do inativo, porque nosso governador também era contra. Começamos em 1º de janeiro deste ano. Não tem como não cumprir a lei, porque a Previdência Social também tem as amarras dela. Ela tem, por exemplo, o CRT, que é o Certificado de Regularidade Previdenciária. Se o governador, por exemplo, vai fazer uma transação com a União, com o exterior ou com o Banco Mundial, ele tem que ter essa certidão, que a Previdência só emite se estiver tudo regularizado. Se não tiver a certidão, a União não faz o acordo. E é uma cobrança constante. As informações do dia-a-dia que nós temos que prestar à Previdência é impressionante. E hoje é tudo informatizado. Eles têm uma central de informações, onde eles colhem informações do país inteiro, de todas as entidades.

- Quanto representa de recursos a contribuição dos inativos do DF?

- Aqui no Distrito Federal são R$ 3 milhões por mês. A nossa folha é de R$ 120 milhões por mês, então, R$ 3 milhões significam pouca coisa. Foi um desgaste que o governo, principalmente para o federal, mas a gente tem que fazer.

- O senhor já afirmou que a reforma da Previdência terá que ser revisada em 10 anos. Por quê?

- Isso é um fenômeno que vem acontecendo no mundo inteiro. O mundo inteiro está cuidando desse problema da previdência. As experiências - e eu acompanho muito esses estudos, o desenvolvimento desses projetos no exterior - têm nos mostrado que no mínimo, a cada 10 anos, os sistemas precisam ser readaptados. Aí entram vários fatores, como a própria economia de mercado. Às vezes os planos estipulados de aposentadoria dos fundos das entidades representativas precisam fazer ajustes. Hoje o conceito de previdência é um, daqui a um tempo, pode precisar de modificações tendo em vista inclusive a mudança da expectativa de vida dos contribuintes. São ajustes naturais que terão que ser feitos. Como o brasileiro gosta muito de trabalhar com período de 10 anos, então é mais ou menos dentro desse prazo que as mudanças serão necessárias.