O Globo, n. 31609, 21/02/2020. Opinião, p. 2

Petroleiros se opõem à reforma da Petrobras



Pela visão sindicalista da Petrobras, a estatal é um “bem do povo”, intocável. Este é o dogma que sustenta a decretação de greve, pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), contra o fechamento de uma deficitária fábrica de fertilizantes no Paraná.

Até a década de 70, não era possível sequer associação com petroleiras privadas internacionais para explorara Bacia de Campos, àquela altura uma área geológica promissora. Não havia dinheiro para explorá-la.

Por ironia da história, o general Ernesto Geisel, ex-presidente da Petrobras, nacionalista, viu-se obrigado, na Presidência da República, a aprovara assinatura de “contratos de risco” com grupos privados. A estatal não conseguiria sozinha avançar naquela região, entendera Geisel. Era o certo, e a Bacia de Campos começou a reduzir a grande dependência que o país tinha do petróleo importado.

A questão da fábrica de fertilizantes do Paraná parece diferente, mas tem a mesma razão de fundo: a corporação sindical petroleira se considera dona da estatal e tem apenas compromisso com empregos e salários, mesmo que a empresa seja deficitária. Pode ser compreensível, mas empregos e salários desaparecerão cedo ou tarde, pela inviabilização da empresa.

No caso do Paraná, a debacle já aconteceu: a fábrica de fertilizantes, a Fafen, já paralisada, acumula R$ 2 bilhões de prejuízos, desde que foi comprada da Vale em 2013. Empregava 396 funcionários.

Assim como foi imperioso abrir a exploração de petróleo a empresas de fora, é essencial rever o posicionamento estratégico da Petrobras, o que está sendo feito. A greve indica que pode haver resistências semelhantes à venda anunciada de refinarias, um setor no qual a estatal se manterá, porém com um número menor de unidades.

A empresa, com US$ 87 bilhões de dívidas, ainda é uma das petroleiras com o maior passivo financeiro do mundo. Precisa reduzi-lo e, ao vender refinarias, ainda ajudará a quebrar oligopólios existentes no mercado de derivados, que impedem que a queda de preços no refino chegue aos postos de abastecimento. A privatização da BR Distribuidora está dentro deste contexto.

O acúmulo de derrotas do lulopetismo — impeachment de Dilma, prisão de Lula — acabrunhou a esquerda, mais ainda com a vitória de Jair Bolsonaro, de extrema direita. A reação ao necessário fechamento da fábrica de fertilizantes sinaliza que o movimento sindical próximo ao PT aproveita para tentar se reeguer.

A Justiça do Trabalho exerce sua função de mediadora. A greve foi suspensa ontem para novas negociações. Porém, deve-se entender que o que está em jogo não são 396 empregos, mas a necessidade de a estatal garantir sua sobrevivência a longo prazo, o que passa pela exploração do pré-sal antes que o consumo de combustíveis fósseis comece a cair. Não faz sentido manter negócios inviáveis. O tempo corre. Ou um custo crescente será cobrado da sociedade.