Título: Justiça mais perto da polícia
Autor: Gustavo de Almeida
Fonte: Jornal do Brasil, 17/04/2005, Rio, p. A25

Secretaria de Segurança anuncia novo projeto que vai unir juízes, promotores e policiais em novo departamento de inquéritos

A política de Segurança Pública do Rio de Janeiro vai pegar a Ponte Aérea: um projeto nos moldes paulistas vai fazer do ano de 2005 um divisor de águas da área de investigação policial no estado. O novo Departamento de Inquérito Policial (Dipo) vai unir juízes, promotores e investigadores policiais no mesmo órgão, dando mais agilidade a pedidos judiciais de urgência e aumentando o rigor nas investigações. A iniciativa do projeto, que está sendo estudado pelo secretário de Segurança Marcelo Itagiba e pelo presidente do Tribunal de Justiça do Rio, Sérgio Cavallieri Filho, permitirá à Justiça ter mais controle sobre as escutas telefônicas e, em contrapartida, tornará os pedidos mais ágeis. ¿ O Dipo será chefiado por um juiz, que vai acompanhar todos os passos das investigações, e não receber o inquérito pronto no final. Assim, o juiz avaliará em menos tempo a necessidade de se fazer a escuta, autorizando com mais rapidez. Teremos as três instâncias de inspeção criminal ¿ Justiça, Ministério Público e polícia ¿ reunidas no mesmo órgão ¿ antecipa Itagiba. Para o secretário, será um passo na direção da moralização total da polícia.

¿ Essa é uma das formas de se enfrentar definitivamente a questão do desvio de conduta de policiais. É um instrumento excepcional para a polícia trabalhar melhor e a Justiça ter mais controle sobre a atividade.

A idéia é instalar dois Dipos no interior, um na Baixada Fluminense e outro na capital. Cada departamento terá um promotor, um juiz e uma equipe de policiais civis e militares. No início, a principal função será investigar crimes praticados por policiais, a exemplo do que já vem ocorrendo desde fevereiro com a Operação Navalha na Carne.

A rapidez do Dipo paulista foi decisiva, por exemplo, na Operação Diamante, da Polícia Federal em São Paulo. Uma quadrilha de tráfico de entorpecentes envolvendo os estados do Rio, Goiás, Pará, Roraima, Amazonas, Maranhão, Distrito Federal, Minas Gerais e São Paulo.

No decorrer da apuração do crime de tráfico de entorpecente, surgiram indícios de prática de lavagem de dinheiro, o que fez com que a Polícia Federal instaurasse inquérito para apurar esses delitos. Porém, quem autorizou a quebra dos sigilos rapidamente, na ocasião, foi o juiz do Departamento de Inquéritos Policiais paulista. De acordo com a lei brasileira, os sigilos bancário, telefônico e fiscal não têm proteção absoluta, podendo ser quebrados por decisão judicial quando se verificar em investigação a presença de evidente interesse público a ser preservado.

Quaisquer outras medidas cautelares necessárias para o andamento das investigações são facilitadas e agilizadas pelo Dipo.

¿ O juiz responsável e seus auxiliares podem inclusive verificar pessoalmente se houve abuso de autoridade na hora de conduzir as investigações e pedir antecipação de provas ¿ diz Itagiba. Outra mudança substancial para o andamento de investigações policiais será a possibilidade de sempre ter acesso ao juiz do Dipo sempre nos fins de semana ¿ no caso, um juiz com especialização para a área, evitando assim que magistrados de outras áreas (que estejam porventura no plantão) acabem tomando decisões sem amparo técnico suficiente.

¿ Com o Dipo, depois de tudo aprovado, teremos um controle muito maior das ações policiais. E dentro do departamento teremos um órgão controlador dos pedidos dos investigadores, que vai avaliar e decidir com agilidade e rapidez. Isto significará um salto no andamento dos inquéritos ¿ diz Itagiba.

A ruptura que o novo departamento provocará no Poder Executivo estadual na área de Segurança Pública chegará ao Poder Judiciário. É certo que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro terá que fazer mudanças em sua estrutura e seguir também o exemplo da instituição similar paulista, que coloca juízes na linha de frente do trabalho policial.

Em São Paulo, o Dipo ¿ lá, Departamento Técnico De Inquéritos Policiais ¿ é também responsável pela distribuiçção de inquéritos pela comarca da capital. A juíza Ivana David Boriero preside o órgão da capital e funciona como poder mediador entre delegacias e o Ministério Público ¿ é ela quem determina a troca de informações entre as duas instâncias.

Um dos exemplos mais fortes de atuação do Dipo paulista aconteceu em março: dois diretores e um gerente de uma seguradora participavam de um esquema de fraude contra clientes. Estavam envolvidos três delegados e um escrivão da Polícia Civil. Segundo os promotores do Ministério Público de São Paulo apuraram, os acusados montaram um esquema de fraude para não pagar indenizações a segurados que tinham o veículo roubado ou furtado. Esses clientes acabaram indevidamente acusados de tentar fraudar o seguro.

Com apoio do Dipo paulista, entre 1999 e 2004, cerca de 600 inquéritos policiais foram abertos para investigar pessoas acusadas de vender seus carros no Paraguai antes de pedir indenização à seguradora por roubo ou furto. A agilidade dos juízes que coordenaram o Dipo neste período foi decisiva. Com maior rapidez, foi possível antecipar provas e constatar a colaboração de policiais, inclusive delegados, nas fraudes.