O Globo, n. 31496, 31/10/2019. País, p. 5

Pacote anticrime rejeita prisões embasadas apenas em delações

Marco Grillo



O grupo de trabalho que analisa o pacote anticrime incluiu na proposta que será levada ao plenário mudanças na lei que regula a colaboração premiada. De acordo com o texto aprovado pelos deputados, os depoimentos dos delatores não poderão ser usados isoladamente para embasar a decretação de medidas cautelares, como prisões provisórias e preventivas, e o recebimento de denúncias pela Justiça. Atualmente, a legislação prevê que os réus não podem ser condenados unicamente com base nas delações.

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal já consolidou o entendimento de que as denúncias apresentadas pelo Ministério Público Federal devem ser rejeitadas quando estiverem baseadas apenas nas delações, sem outras provas. Caso a proposta vá adiante na Câmara e no Senado, o texto será transformado em lei, com caráter mais expressivo do que uma tese fixada pela Corte.

O grupo, que encerrou as atividades ontem, foi criado para analisar propostas de alteração na legislação penal apresentadas pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, e pelo ministro do STF Alexandre de Moraes. A alteração sobre as colaborações premiadas não estava prevista nos textos originais e no relatório posterior, do deputado Capitão Augusto (PL-SP). Ao longo das discussões, no entanto, os parlamentares construíram um texto sobre o tema, acrescentando itens à legislação em vigor — a proposta aprovada não suprime nenhum artigo do trecho da lei que trata das colaborações.

O texto prevê que provas e dados colhidos ao longo dos depoimentos não podem ser usados pelos investigadores caso o acordo não seja formalizado por decisão do próprio órgão de investigação. Parte dos itens que foram acrescentados à lei constam de uma orientação expedida pela Procuradoria-Geral da República para normatizar os procedimentos de colaboração. Um dos trechos incorporados afirma que “no acordo de colaboração premiada, o colaborador deve narrar todos os fatos ilícitos em relação aos quais concorreu”.

— Não retiramos nada (da lei atual que trata de delação premiada) e aproveitamos a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal — disse a presidente do colegiado, Margarete Coelho (PP-PI).

Já o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) criticou o “ativismo judicial” e defendeu a prerrogativa do Congresso de tratar do assunto:

— O Poder Judiciário não tem competência normativa, mas a exerce quando há omissão do Poder Legislativo.