O Estado de S. Paulo, n. 46953, 07/05/2022. Economia & Negócios, p. B7

Em terras indígenas no Pará, empresa leva luz para invasores

André Borges


No coração da terra indígena Cachoeira Seca, entre os municípios de Altamira, Placas e Uruará, no Pará, postes de madeira sustentam os fios que transportam a energia para abastecer as casas de grileiros, garimpeiros e desmatadores. Dentro da área demarcada, não indígenas usam a eletricidade fornecida, de forma ilegal, pela concessionária Equatorial Energia, uma das maiores companhias do setor.

A Equatorial, empresa privada que atua em seis Estados do País, sabe dessas ligações clandestinas, os chamados “gatos”, ou mesmo estruturas entregues pela própria companhia. A empresa já foi  multada em mais de R$ 3,3 milhões por instalações irregulares dentro da terra indígena Cachoeira Seca.

A reportagem do Estadão teve acesso a três autos de infração emitidos pelos fiscais do Ibama contra a Equatorial, nos dias 3 e 7 de fevereiro. A multa mais pesada aplicada, no valor de R$ 2,5 milhões, explicita o motivo: “instalar serviço de transmissão de energia elétrica na terra indígena Cachoeira Seca, sem licença do órgão ambiental competente”.

A partir dos dados nos autos de infração, a reportagem mapeou o local onde os agentes ambientais encontraram as instalações elétricas irregulares. O ponto fica no meio da terra indígena, em uma área cercada por dezenas de estradas ilegais, todas elas abertas a partir da BR-230, a rodovia Transamazônica. 

Demarcação. Na Cachoeira Seca, tera de 733 mil hectares tradicionalmente ocupada elo povo Arara e homologda em abril de 2016, após 30 anos de espera para ter seu reconhecimento, o Institutto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), refistra, todos os anos, as maiores taxas de devastação de todas as terras indígenas nacionais.

Não se trata de um caso isolado. A proliferação de  instalações elétricas de Equatorial – antiga Celpa – em terras indígenas do Pará é  denunciada pela Rede Xingu+, formada por organizações indígenas, ribeirinhas e da sociedade civil

Rodrigo Oliveira, pesquisador do Instituto Socioambiental (ISA) que acompanha o assunto, critica a lentidão da concessionária. “A Cachoeira Seca é uma das terras indígenas mais invadidas e desmatadas do País, com um processo de desintrusão que vem se arrastando por anos. É muito grave a postura da Equatorial.

Resposta. Por meio de nota, a Equatorial Energia, empresa presente em22% do território nacional e que atende 9% dos consumidores brasileiros, declarou que recebeu da Funai, em janeiro, “as coordenadas de campo das áreas em questão” para fazer a análise da situação.

“A companhia aguarda, agora, o agendamento de uma reunião com o Ibama e a Funai para definir a estratégia de como proceder com o desligamento dos contratos irregulares”, afirmou, acrescentando que “o processo de desintrusão de terras indígenas não é de responsabilidade da empresa de energia, que necessita de apoio logístico.