Título: Dinheiro de prefeituras foi usado em campanhas
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 16/04/2005, País, p. A4
Fiscalização da Controladoria-Geral da União identifica desvio de verbas
O dinheiro que a União repassa aos municípios para saúde, educação, creches e outros programas sociais foi desviado por vários prefeitos antes das eleições, no ano passado. Os 60 relatórios de auditoria de municípios divulgados ontem pela Controladoria-Geral da União (CGU) - referentes ao 13º sorteio - mostram vários casos de uso político da verba pública. Um dos mais graves ocorreu no município de Capitão Enéas (MG). Três empresas que fornecem alimentos à prefeitura - que seriam do mesmo sócio - teriam desviado recursos públicos de compra de produtos para creches. Segundo a CGU, nos últimos dois anos, ficou constatada a inexistência de registro de entradas de produtos que garantissem a venda real das mercadorias para a prefeitura, no valor de R$ 975 mil.
Na sede de uma das três empresas que forneciam à prefeitura de Capitão Enéas - a firma Leopoldino Cardoso de Oliveira Ltda - foram encontrados comprovantes de depósitos bancários em favor do Fundo de Financiamento de Campanha do PFL, partido do prefeito Zilmio Rocha.
O mais grave é que na sede de outra empresa fornecedora - a Nova Magia Cereais e Confecções - foram encontrados vários canhotos de cheques emitidos em favor do prefeito. Na agenda do sócio-gerente da Nova Magia, há anotações sobre depósitos bancários a serem efetuados em favor do prefeito.
Zilmio informou à CGU que os relatórios são ''ilações imaginárias''. A prefeitura de Capitão Enéas também investiu dinheiro das creches na compra de pneus, armações de óculos e em transporte. No município, 88 beneficiários do Bolsa Família são servidores públicos municipais.
Outro caso grave de uso político do dinheiro público foi registrado em São Francisco do Conde (BA). Dois meses antes da eleição, o prefeito Antônio Carlos Vasconcelos Calmon comprou 13 mil cadernos e imprimiu suas mensagens pessoais antes de distribuir na cidade. ''Divido com vocês a alegria interior, cultivada a partir dos êxitos alcançados à frente do município de São Francisco do Conde'', escreveu o prefeito nos cadernos.
Na mesma época em que o prefeito fez os auto-elogios nos cadernos, a merenda escolar não chegou à cantina das escolas e pelo menos R$ 2,4 milhões do Programa de Atenção Básica da Saúde foram gastos de forma irregular, incluindo despesas com sonorização, aquisição de veículos, serviço de buffet e até em pintura de camisetas para ''confraternização junina'', além de farto material gráfico.
O prefeito de Campina Verde (MG), Fradique Gurita da Silva, segundo investigação dos auditores, teria feito promoção pessoal com a publicidade oficial. Ele inaugurou pequenas obras no município e incluiu nas placas das inaugurações os nomes de alguns políticos, a exemplo do deputado Nárcio Rodrigues (PSDB) e do ex-senador Francelino Pereira. Uma das ambulâncias do município ostentou faixa do prefeito e do senador Aelton de Freitas (PL).
Na Prefeitura de Bacabal (MA), ficou constatada irregularidade na aplicação de R 2,1 milhões do fundo da Educação, o Fundef. Os auditores encontraram notas fiscais ''clonadas'' e irregulares. Os supostos fornecedores da prefeitura negaram a entrega de bens. O prefeito José Vieira Lins não convenceu os auditores e poderá ser condenado quando o processo chegar à Justiça.
Em época de campanha, vale tudo. A prefeitura de São Luiz Gonzaga (RS) gastou dinheiro - transferido para o controle de doenças - na ''personalização de camisetas'' para o carnaval do ano passado, além de comprar divãs, escadas e lanches. Em Nioaque (MS), o dinheiro da atenção básica à saúde foi gasto com serviços de capela, necrotério, refeições e tarifas bancárias. O dinheiro da dengue comprou vestuários. A CGU responsabiliza o prefeito Noé Nogueira Filho.