O Estado de S. Paulo, n. 46958, 12/05/2022. Política, p. A10

Custo eleitoral da inflação faz Bolsonaro demitir ministro de Minas e Energia

Lauriberto Pompeu


A alta da inflação, pressionada pelo aumento do preço dos combustíveis, levou à queda do 16.º ministro do governo Jair Bolsonaro no momento em que a maior preocupação do brasileiro é com a economia. O potencial efeito da escalada do custo de vida na corrida pelo Palácio do Planalto virou o maior desafio até o momento para o presidente na busca pela reeleição. Agora extitular de Minas e Energia, Bento Albuquerque foi substituído por Adolfo Sachsida, homem de confiança do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Pesou também para a dispensa o caso do "Centrãoduto", revelado pelo Estadão. Trata-se de articulação no Congresso para destinar R$ 100 bilhões a uma espécie de fundo para a construção de uma rede de gasodutos em favor do empresário Carlos Suarez, o "S" da empreiteira OAS, e sócios.

A saída de Albuquerque se deu no mesmo dia em que a inflação oficial foi anunciada. Em abril, o índice chegou a 1,06% e, no acumulado de 12 meses, fechou em 12,13%. Pesquisa da Genial/quaest divulgada ontem mostrou que a economia aflige 50% dos eleitores – 14% disseram outros problemas e 13% citaram a pandemia.

Bolsonaro tentou minimizar os efeitos da alta dos preços e não tratou em público da saída de Albuquerque. "Apesar de a inflação estar alta no Brasil, bem como a questão dos combustíveis, na nossa terra os efeitos são menores", disse ele durante visita à 48.ª Expoingá, em Maringá (PR). "Vocês sabem que, pior que uma ameaça externa, é uma ameaça interna de 'comunização' do nosso país", afirmou a apoiadores.

Na semana passada, o presidente afirmou que o lucro trimestral de R$ 44,5 bilhões da Petrobras, que reajusta os preços conforme a cotação internacional do petróleo, era "um estupro". Segundo ele, a empresa quebraria o País. Ontem, Sachsida anunciou que pedirá estudos para privatizar a Petrobras.

Os indicadores frearam a recuperação de Bolsonaro nas pesquisas, segundo analistas. Ontem, a Genial/quaest mostrou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mantém a liderança, com 46% – dois pontos a mais que há um mês –, enquanto Bolsonaro se mantém com 29%. Na semana passada, pesquisa Ipespe também apontou estagnação. "A economia é atualmente o principal obstáculo para uma recuperação mais significativa do presidente", disse o cientista político Antonio Lavareda, especialista em marketing político.

Ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga afirmou que a última vez que a inflação preocupou em um ano eleitoral foi em 2002, quando Lula foi eleito pela primeira vez. Ficou em 12,53% ao fim do ano. Para ele, contudo, a situação hoje é delicada. "Em 2002 houve choque de confiança. Havia um receio enorme do que o PT faria no poder. Hoje é diferente, porque a situação fiscal é muito frágil."

Centrãoduto. Albuquerque era contra a proposta de bancar os gasodutos com recursos do Tesouro. Apesar de resistir ao projeto como havia sido apresentado no Congresso, ele autorizou as negociações para garantir que a construção dos dutos de gás se tornasse realidade, em condições de mercado. A aproximação do ministro com políticos do Centrão que defendiam o gasto público, porém, provocou desconfianças no Planalto e na equipe econômica de que ele acabaria cedendo ao plano original.

Como mostrou o Estadão,a Casa Civil comandada por Ciro Nogueira chegou a discutir a edição de uma medida provisória para tornar viável o "Centrãoduto", caso o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não conseguisse aprovar um jabuti – emenda estranha ao projeto original – com essa finalidade. Lira é aliado de Nogueira.

Bolsonaro não gostou de saber pelo jornal que essa operação estava sendo montada por Nogueira com aval de técnicos do ministério de Albuquerque. O presidente é conhecido pelo estilo "quem manda sou eu".

Técnicos de Minas e Energia e da Economia se reuniram na Casa Civil, há duas semanas, para discutir como viabilizar o negócio. Na ocasião, integrantes da equipe econômica se manifestaram novamente contra a operação. O episódio foi a gota d'água para a demissão de Albuquerque, que já vinha sofrendo críticas. / Colaboraram Adriana Ferraz, Bárbara Nascimento, Cícero Cotrim, Gustavo Queiroz e Rubens Anater