O Globo, n. 31440, 05/09/2019. Opinião, p. 2

Hora da liderança legislativa na Previdência


O Senado avança na reforma da Previdência. A aprovação de dois projetos na Comissão de Constituição e Justiça abre caminho para concluir a votação no plenário, em dois turnos, ainda em outubro.

Mostrou-se acertado, ao menos nesse primeiro round, o acordo de procedimento feito pelos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre; da Câmara, Rodrigo Maia, e pelo senador Tasso Jereissati (relator).

Conseguiram preservar a proposta de emenda constitucional aprovada na Câmara. E concentraram aspectos ainda polêmicos em PEC com tramitação simultânea, com detalhe relevante: ela abriga a possibilidade de adesão de estados e municípios ao futuro regime previdenciário da União.

É decisão importante para a criação de um ambiente político propício às demais iniciativas de modernização do Estado. Trata-se de uma corrida contra o tempo, na qual se tenta recuperar o tempo perdido nas últimas décadas e, ao mesmo tempo, abrir uma janela para o futuro.

De um lado, procura-se resgatar o princípio constitucional da igualdade de direitos, com redução das evidentes desigualdades no sistema previdenciário. De outro, sinaliza-se com a preservação da capacidade de solvência do setor público no médio prazo. São fundamentos de uma necessária mudança do ambiente econômico e social do país, com consequências positivas na recuperação da economia e na retomada de investimentos privados.

É correto o diagnóstico governamental de que um novo ciclo de crescimento econômico depende do reequilíbrio das contas públicas. Para tanto, é preciso rever as regras da Previdência, cujos gastos sobem ao ritmo de R$ 50 bilhões por ano e consomem mais da metade do orçamento.

O Legislativo, felizmente, percebeu os riscos adiante e assumiu a liderança da reforma da Previdência, ao mesmo tempo em que preparara outras, nas áreas tributária e de gestão do Estado. Esse entendimento político decorre não apenas de uma fragilidade econômica conjuntural, mas da necessidade de reconhecer um fenômeno social brasileiro, o aumento significativo da expectativa de vida. Aos 65 anos de idade, as mulheres têm expectativa de vida de 85 anos. Os homens, de 82 anos. E é preciso criar condições para que o Estado possa atender adequadamente à mudança estrutural na demografia.

A ONU calcula que, nas três décadas a partir de 2030, o Brasil vai duplicar novamente (14% para 28%) a proporção de pessoas idosas da população. França, Suécia e Estados Unidos só devem alcançar situação similar no último quarto deste século.

Hoje, o país gasta o equivalente a 14% do Produto Interno Bruto com a Previdência. Com essa acelerada transição demográfica, vai gastar 25% do PIB em 2050, estima a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Sem reforma já, o futuro é só dúvida.