O Globo, n. 31439, 04/09/2019. Economia, p. 21

Acordo no Senado
Manoel Ventura
Pedro Capetti


O plenário do Senado aprovou ontem por unanimidade, em dois turnos, a proposta de emenda à Constituição (P EC) que permite a distribuição de recursos do mega leilão de petróleo previsto para novembro entre estados e municípios. A votação foi viabilizada por um acordo que beneficiou o Rio de Janeiro. Uma emenda apresentada por senadores fluminenses definiu que o estado ficará com R$ 2,5 bilhões do que o governo espera arrecadar na licitação de áreas no pré-sal da Bacia de Santos que ficam no litoral fluminense. Pelo texto anterior, o Rio teria só R$ 326 milhões. Não houve mudança para as demais unidades da federação.

Uma articulação conduzida pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), deputados e os três senadores do Rio, Flávio Bolsonaro (PSL), Romário (Podemos) e Arolde de Oliveira (PSC), levou a um acordo costurado durante reunião de líderes do Senado na tarde de ontem. Antes da votação, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AL), anunciou o acordo em torno da emenda.

O governo estima arrecadar R$ 106,5 bilhões no megaleilão, resultado de acordo para a revisão do contrato de cessão onerosa pelo qual a Petrobras recebeu o direito de explorar uma área do pré-sal, em 2010. Do total a ser arrecadado, R$ 33,6 bilhões serão pagos à Petrobras. O ministro da Economia, Paulo Guedes, propôs dividir outros R$ 21,8 bilhões entre estados e municípios.

União ficará com R$ 48,8 bi

A ideia inicial era uma divisão exclusivamente pelos critérios do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Fundo de Participação dos Estados (FPE). O Rio teria apenas R$ 326 bilhões porque esses fundos privilegiam entes menos desenvolvido sede menor renda familiar per capita.

Com a emenda, o estado produtor, que abriga as áreas da cessão onerosa, fica com 3% da rendado leilão, descontado o que é destinado à Petrobras. Além dessa fatia, de R$ 2,18 bilhões, o estado manteve os R$ 326 milhões pelo FPE, totalizando R$ 2,5 bilhões.

Municípios fluminenses dividirão R$ 332,1 milhões. O governo federal ficará com R$ 48,8 bilhões, que serão usados para amenizar o rombo das contas públicas. Governadores e prefeitos poderão usar o dinheiro para cobrir o rombo de fundos de previdência, investimentos e pagamentos de dívidas, mas não para despesas correntes, como salários. O governador do Rio, Wilson Witzel, comemorou:

— Agradeço muito ao Flávio Bolsonaro e ao Rodrigo Maia, que articularam esse acordo. Certamente vai contribuir para pagarmos as dívidas do estado e fazermos investimentos fundamentais. Vamos usar uma parte para fazer saneamento e infraestrutura para as comunidades mais pobres.

O governador de São Paulo, João Doria, não se manifestou. O do Espírito Santo, Renato Casagrande, disse que gostaria que a Câmara ampliasse afatia de outros estados:

— Não temos nada contra, mas a medida aprovada ficou devendo aos demais estados do Sul e Sudeste. O Rio é onde estão as jazidas, é compreensível, mas o critério do FPE prejudica demais os estados e municípios do Sul e Sudeste.

PEC vai à Câmara

Com a aprovação do Senado, a PEC será apreciada pela Câmara dos Deputados. É preciso alterar a Constituição para repassar o dinheiro para os governos regionais por conta do teto de gastos. Essa regra limita as despesas da União, como serão contabilizados o pagamento à Petrobras e o repasse a governadores e prefeitos. Para não descumprira regra, será preciso criar uma exceção.

Para especialistas, o acordo fechado corrige possíveis distorções, como estados não produtores recebendo mais que os donos das reservas. Pelo critério exclusivo do FPE, a Bahia, por exemplo, ficaria com R$ 905,5 milhões, quase três vezes a fatia do Rio.

— Divisão de arrecadação é sempre uma discussão calorosa. Todos os estados estão numa penúria enorme, mas a área está no Rio. Foi uma decisão correta —avaliou Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE).

Para a gerente de petróleo da Firjan, Karine Fragoso, a PEC segue alinhada divisão de royalties prevista na Constituição, cuja contestação será julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro:

— A atividade de petróleo e gás não afeta o Mato Grosso da mesma forma que o Rio. O peso tem de ser diferenciado.

O edital do megaleilão deve ser publicado até sexta-feira, mas a equipe econômica só quer concretizá-lo após a aprovação final da PEC devido ao pagamento que a União tem que fazer à Petrobras. O atraso da votação pode atrasar o leilão, mas o governo já não conta com a arrecadação dele para as contas deste ano.