O Estado de S. Paulo, n. 46963, 17/05/2022. Política, p. A12

TJ do Rio atende MP e rejeita denúncia contra Flávio por ‘rachadinha’

Rayanderson Guerra


O Tribunal de Justiça do Rio aceitou o pedido do Ministério Público e rejeitou, ontem, a denúncia por peculato, organização criminosa e lavagem de dinheiro apresentada contra o senador Flávio Bolsonaro (PLRJ) e outras 16 pessoas no inquérito das rachadinhas – desvio de salário de assessores. Com a decisão, o MP disse que poderá recomeçar as apurações, com novas provas baseadas no primeiro Relatório de Inteligência Financeira (RIF) sobre o caso, elaborado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

O documento do Coaf apontou movimentação atípica de R$ 1,2 milhão em uma conta no nome de um ex-assessor de Flávio, Fabrício Queiroz, entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017. O documento levou o MP do Rio a abrir a investigação e foi revelado pelo Estadão em dezembro de 2018. A decisão do tribunal foi tomada após o próprio MP fluminense solicitar a extinção da denúncia, após decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ). As duas Cortes aceitaram pedidos da defesa e anularam provas colhidas nas investigações.

"O STJ já havia anulado todas as provas. A defesa entende que o caso está enterrado, e caso haja qualquer desdobramento serão tomadas as medidas judiciais cabíveis", afirmou por nota Luciana Pires, advogada do senador Flávio Bolsonaro.

Nova Denúncia. Foi o procurador-geral de Justiça do Rio, Luciano Mattos, que comunicou ao TJ que, com a anulação de quase todas as provas obtidas na investigação pelo STJ e pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a denúncia ficara insustentável. Na petição ao Órgão Especial, porém, o procurador salienta que não há eventual prejuízo ao "reinício das investigações". Para ele, "não há óbice legal à renovação" das apurações, "inclusive no que diz respeito à geração de novos RIFS (Relatórios de Inteligência Financeira), de novo requerimento de afastamento do sigilo fiscal e bancário dos alvos".

A decisão de pedir que a denúncia fosse extinta foi tomada após o STJ aceitar, por quatro votos a um, pedido feito pela defesa de Flávio para anular as decisões tomadas pelo juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, no caso das "rachadinhas".

Entre as provas utilizadas para embasar a denúncia do MP-RJ e que foram anuladas estão a quebra de sigilo fiscal e bancário do filho do presidente Jair Bolsonaro, buscas e apreensões em vários endereços e as prisões de Fabrício Queiroz, apontado como operador financeiro do esquema, e da mulher, Márcia de Oliveira Aguiar. Sem essas provas, a denúncia, oferecida pelo MP em outubro de 2020 ao Órgão Especial do TJ do Rio, foi esvaziada, admitem promotores.

Competência. De acordo com a maioria dos ministros da 5ª Turma do STJ, um juiz de primeira instância não era competente para julgar o caso de Flávio, uma vez que ele mantinha o foro privilegiado ao deixar o cargo de deputado estadual para assumir uma cadeira no Senado, após as eleições de 2018.

O MP do Rio recorreu no fim do ano passado ao STF. Pediu que fosse declarada a inexistência de foro para Flávio, durante o período da denúncia e para que o caso voltasse para a primeira instância. O Supremo, no entanto, manteve, por três votos a um, o foro privilegiado do senador e a nulidade das provas da investigação.

O caso, no entanto, não retorna à estaca zero. A 5ª Turma do STJ manteve na investigação os relatórios de inteligência financeira elaborados pelo Coaf. Com a decisão do Órgão Especial da Corte, os promotores poderão pedir novas quebras de sigilo com base nas movimentações atípicas já indicadas pelo Coaf.

Na denúncia anulada pelo TJ do Rio de Janeiro ontem, Flávio, Queiroz e mais 15 pessoas foram acusados dos crimes de organização criminosa, peculato, lavagem de dinheiro e apropriação indébita pelo então procurador-geral, Eduardo Gussem.

O senador é apontado como o líder da organização criminosa e Queiroz, como o operador do esquema. Uma das transações na conta de Queiroz citadas no relatório do Coaf é um cheque de R$ 24 mil destinado à primeira-dama Michelle Bolsonaro. 

Coaf

Promotores poderão pedir quebras de sigilo com base nas movimentações atípicas já indicadas