O Globo, n. 31436, 01/09/2019. País, p. 4

A paralisia do Executivo e o aumento do desmatamento
Bernardo Mello


A paralisia do atual governo foi um motor para o avanço de queimadas e desmatamento na Amazônia, segundo pesquisadores ouvidos pelo GLOBO. De acordo com eles, esses problemas estão interligados ao agravamento de outras questões históricas na região, como grilagem, garimpo ilegal e invasões de terras indígenas.

A ecóloga Ima Vieira, do Museu Goeldi, no Pará, e o climatologista Carlos Nobre, pesquisador da USP, citam o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia Legal (PPCDAm) como uma das principais iniciativas de longo prazo que se enfraqueceram. O PPCDAm, lançado em 2004, tem a meta de reduzir o desmate a 3,9 mil km² anuais até 2020 e está em sua quarta fase.

— Na lei, o PPCDAm continua. Mas há uma inação que abriu a porteira do desmatamento — disse Nobre. Em março, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, enviou ofício a Ricardo Salles, titular do Meio Ambiente, pedindo que avaliasse a extinção de 23 colegiados, incluindo o responsável pelo PPCDAm. Na última semana, Salles sugeriu criar uma “força-tarefa pró-Amazônia” com atribuições semelhantes, o que foi entendido como mais um indício de descontinuidade do programa.

— O governo desacreditou o sistema de prevenção ao desmatamento. Deu a entender que vale tudo, que ninguém será punido — disse Ima. Marcio Santilli, do Instituto Socioambiental (ISA), avalia que as invasões a terras indígenas têm ido além da extração ilegal de madeira e se tornado objetivo de grileiros, interessados em negociar partes dessas áreas. O presidente Jair Bolsonaro já afirmou que não demarcará novas reservas e sugeriu a abertura desses territórios ao garimpo. Para Santilli, os sinais do presidente aprofundaram um “vácuo de gestão” na política indigenista, que já vinha dos governos Dilma e Temer:

— A ausência de Estado desperdiça o potencial empreendedor existente nas terras indígenas e condena os índios a essas frentes predatórias.