O Globo, n. 31589, 01/02/2020. Economia, p. 27

Mais vagas
Pedro Capetti


As contratações de fim de ano no comércio fizeram com que a taxa de desemprego voltasse a recuar no trimestre encerrado em dezembro e terminasse 2019 em 11%, menor patamar desde março de 2016, quando foi de 10,9%. Os dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), divulgada ontem pelo IBGE. O país ainda tem 11,6 milhões de trabalhadores em busca de uma vaga, mas são 751 mil pessoas a menos do que em setembro. Boa parte desse contingente foi contratada com carteira assinada.

O desempenho veio em linha com as previsões de analistas, que esperavam a aceleração do mercado de trabalho no segundo semestre. Se comparado ao quarto trimestre de 2018, houve um aumento de 1,8 milhão de pessoas ocupadas no período, enquanto o crescimento da força de trabalho foi de 1,3 milhão — o que significa que mais pessoas procuraram emprego.

Os setores de comércio e de alimentação e alojamento impulsionaram o aumento da ocupação. Foram mais 376 mil e 179 mil trabalhadores em atividade nesses grupos, respectivamente. Já construção civil e indústria apresentaram estabilidade. O resultado, contudo, é visto por analistas como positivo, uma vez que não houve perda de postos nesses grupos, como ocorre habitualmente nessa época do ano. Com isso, houve queda de 0,8 ponto percentual do desemprego no quarto trimestre. Em setembro, 12,5 milhões de pessoas estavam sem emprego, e a taxa estava em 11,8%.

— O crescimento da ocupação em 2019 foi mais difundido entre as atividades, e não concentrado em alojamento, alimentação e transporte, como vinha sendo nos anos anteriores. De fato, há uma reação na construção, na indústria e em atividades de informação e comunicação e serviços administrativos — explica Adriana Beringuy, analista do IBGE. Apenas agricultura e pecuária tiveram retração no último trimestre do ano, de 2,1%, perdendo cerca de 178 mil postos no período.

Mais vagas formais

A expansão de 2,2% do comércio fez com que o emprego com carteira assinada crescesse 1,8% no último trimestre, o equivalente a 611 mil vagas, o maior avanço desde 2013. Isso representou praticamente 80% das 751 mil ocupações geradas no país nos últimos três meses de 2019.

— É um aumento que não víamos desde o início da crise no setor. Isso reflete uma entrada de trabalhadores que estavam muito na margem e que estão sendo absorvidos agora — lembra Daniel Duque, economista do Ibre/FGV.

A vendedora Gyovanna Moreira, de 27 anos, foi beneficiada por essa expansão do emprego formal. Após sete anos sem conseguir uma vaga com carteira, ela foi contratada por uma loja de acessórios no Centro do Rio no final do ano.

— Esse é meu terceiro trabalho formal, o último foi há sete anos. Entretanto, essa é a primeira vez que ganho mais de R$ 1 mil. Como engravidei há oito anos, ficou mais difícil conquistar um emprego — conta a jovem, que foi efetivada em uma vaga inicialmente temporária.

A despeito da melhora dos postos com carteira, 2019 ficou marcado como o ano em que a informalidade bateu recorde. O ano acabou com 38,7 milhões de pessoas, ou 40% da força de trabalho, sem carteira assinada. Se comparado com 2018, um milhão de pessoas entraram no grupo de informais ao longo do ano passado.

O desalento, por sua vez, composto por pessoas que desistiram de buscar uma oportunidade, cresceu 1,4% em 2019, atingindo 4,8 milhões de brasileiros na média do ano. Algo que, na avaliação do economista Cosmo Donato, da LCA Consultores, só vai melhorar com um mercado de trabalho mais aquecido:

— Por mais que esteja gerando novas vagas, o movimento ainda é difícil para quem está buscando uma oportunidade. O desalento deve demorar a ceder, precisamos de um mercado mais aquecido.

Para analistas, o contexto de maior crescimento em 2020, estimado em 2,31% no último Boletim Focus do Banco Central, deve intensificar moderadamente o ritmo e a qualidade da retomada do mercado de trabalho. Nos próximos meses, o desemprego pode até voltar a subir, influenciado pelas demissões de temporários do comércio, mas a manutenção de parte dos trabalhadores, em virtude da expectativa de melhora econômica, também não está descartada.

— A retenção do trabalhador está no radar com as perspectivas para o futuro. Isso pode pesar na decisão da contratação. E isso pode valer tanto para o comércio quanto para os demais setores — afirma Donato.

O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), contudo, destaca que, embora venha apresentando alguma reação, o quadro do emprego ainda preocupa e continua funcionando como importante obstáculo ao crescimento mais vigoroso. Segundo a entidade, a recuperação do emprego não só é fraca, como vem acompanhada de maior informalidade; e os setores que mais voltaram a empregar pagam pouco. O rendimento médio ficou estagnado em R$ 2.340 em 2019.

Thiago Xavier, da Tendências Consultoria, acredita que o Brasil só verá uma melhora no mercado de trabalho a partir do segundo semestre de 2020, com o avanço da formalização. A expectativa dos analistas é que o ano termine com taxa média de desemprego entre 11,3% e 11,5%, cerca de 0,6 ponto percentual abaixo da média de 11,9% registrada em 2019.

— Nesse contexto, a população ocupada deve crescer, ainda que com menores incrementos por volta da segunda metade do ano. Além do aumento da população ocupada, deve haver uma mudança na sua composição, pois esperase a formalização de pessoas que já trabalham. Tal cenário também é favorável a um aumento dos rendimentos — afirma Xavier. (Colaborou Gabriela Oliva, estagiária, sob supervisão de Danielle Nogueira)

"É um aumento que não víamos desde o início da crise no setor. Isso reflete uma entrada de trabalhadores que estavam muito na margem e que estão sendo absorvidos agora" Daniel Duque, economista do Ibre/FGV

"O crescimento da ocupação em 2019 foi mais difundido entre as atividades, enão concentrado em alojamento, alimentação e transporte, como vinha sendo nos anos anteriores. De fato, há uma reação na construção e na indústria" Adriana Beringuy, analista do IBGE