Correio Braziliense, n. 21422, 10/11/2021. Negócios, p. 8

Risco de desabastecimento

Fernanda Strickland
João Vítor Tavarez*


O ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, alertou para o risco de desabastecimento de combustíveis, ao defender a política de preços da Petrobras, que prevê paridade com os valores do barril de petróleo no mercado internacional e o dólar.  “Temos de ter preocupação grande com o desabastecimento. A importação leva, no mínimo, 90 dias. Cerca de 20% do mercado não é da Petrobras. Mudar qualquer coisa tem que ser com critério, transparência e governança”, disse o ministro, em depoimento na Comissão de Infraestrutura do Senado (CI).

Albuquerque revelou que, para conter a volatilidade dos preços, o governo estuda a criação do que chamou de  “colchão tributário”, e de “reserva estabilizadora”. Segundo ele, o mecanismo permitiria que, ao longo do tempo, as variações dos preços do petróleo fossem compensadas de alguma forma. “Isso seria usado quando houvesse uma volatilidade muito grande”, afirmou o ministro. Ele não informou quando as medidas serão anunciadas, nem qual será o impacto dessas ações.

Segundo o ministro, está em avaliação, ainda, reduzir impostos federais, mas ressaltou que para isso, é necessária uma compensação.

Para a economista Catharina Sacerdote, consultora especialista em investimentos, em caso de desabastecimento de combustíveis, haveria uma queda em todos os indicadores da economia, “como produção industrial, vendas do varejo, serviços, investimentos, além de explosão da inflação e redução do PIB”, elencou. “Como o cenário no Brasil já é crítico, o risco país pode disparar e piorar ainda mais”, explicou. Sacerdote observou que, atualmente, o Brasil produz 75% do combustível consumido no país, e importa 25%.

Segundo o economista Otto Nogami, professor de economia do Insper, com o isolamento social em 2020, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) reduziu a produção para manter o preço do produto. “Isso fez os estoques mundiais chegarem a quase zero. Com a retomada da atividade econômica, a produção não está conseguindo atender a demanda, ocasionando falta de derivados e levando à elevação dos preços desses itens. Daí o risco de desabastecimento”, avaliou.

Apesar do alerta do ministro e dos especialistas, não há sinais de falta de combustíveis em postos do Distrito Federal. Até o presente momento, não estou sabendo disso”, informou Francinaldo Veras, gerente do posto Auto Shopping Derivados de Petróleo, no Gama Leste.

Willer Santana dos Santos, 30 anos, gerente do Ipiranga Rede Auto shopping, em Valparaíso (GO), também indicou não haver falta de combustíveis no local, onde as bombas marcam R$ 7,29 pelo litro da gasolina e R$ 5,69 pelo litro do diesel. “No momento, não falaram nada”, disse, a respeito do risco de falta dos produtos.

*Estagiário sob a supervisão de Odail Figueiredo

Petróleo dá receita recorde para o governo
Rosana Hessel


Apesar de o governo argumentar que, sem a PEC dos Precatórios, não teria dinheiro para financiar o Auxílio Brasil, as altas da gasolina e do diesel estão engordando os cofres da União. Cálculos do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) mostram que o governo federal deverá arrecadar, pelo menos R$ 70,1 bilhões por conta dos preços cada vez mais altos dos combustíveis neste ano. O valor seria suficiente para bancar os pagamentos de R$ 400 por mês do Auxílio Brasil a 17 milhões de famílias, que custaria R$ 50 bilhões além dos R$ 34,7 bilhões já orçados para o Bolsa Família. Apenas em tributos sobre os combustíveis, o governo arrecadou R$ 15,2 bilhões de janeiro a setembro, e ainda deverá receber R$ 23 bilhões de dividendos da Petrobras, uma vez que a União é o maior acionista da estatal. Além disso, a receita estimada pela entidade para 2021 com participações governamentais (royalties, participações especiais, taxa de ocupação ou retenção da área e bônus de assinatura) é de R$ 84,8 bilhões para o governo federal, estados e municípios. Deste total, R$ 31,9 bilhões são referentes à arrecadação da União.

“A receita pode ser maior, porque o preço dos combustíveis continua subindo, e não sabemos qual será o lucro da Petrobras no quarto trimestre”, afirmou o presidente do CBIE, Adriano Pires. O montante é quase o total de precatórios que vencem no ano que vem (R$ 89,1 bilhões). Logo, dinheiro existe. Mas onde o governo quer gastar é uma questão de escolha”, acrescentou. 

“Essa conta dá R$ 70,1 bilhões, por enquanto, mas ela pode ser maior, porque o preço dos combustíveis continua subindo, o dólar não está caindo, e não sabemos qual será o lucro da Petrobras no quarto trimestre e esse resultado mostra que o setor de óleo e gás é o que mais vai gerar arrecadação para o governo em 2021”, afirmou Pires.

Os combustíveis são os principais vilões da inflação, atualmente, e a alta do preço da gasolina, do diesel e do gás de cozinha reflete o aumento dos valores pagos pelo petróleo no mercado internacional. Além disso, a desvalorização do real frente ao dólar também impacta nos preços.  O barril do petróleo vem sendo negociado acima de US$ 80 e o dólar vem sendo negociado em torno R$ 5,50.  O cálculo do CBIE considerou o petróleo a US$ 70 e o dólar a R$ 5,20.

Procurado, o Ministério da Economia não comentou o assunto.