O Estado de S. Paulo, n. 46558, 07/04/2021. Política, p. A4

Ministro da Justiça toma posse e muda chefia da PF

Breno Pires


O novo ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, mudou ontem o comando da Polícia Federal. Horas após a cerimônia de posse, Torres anunciou que o delegado Paulo Maiurino será o novo diretor-geral da corporação. Com a mudança, a PF terá o terceiro chefe em apenas dois anos e três meses de governo e entrará em nova fase, após o fim da Lava Jato. Em discurso afinado com o presidente Jair Bolsonaro, o novo titular da Justiça defendeu a presença da "força de segurança pública" para assegurar "um ir e vir sereno e pacífico", numa referência velada aos embates do governo federal com Estados e municípios em torno de medidas de isolamento para conter a disseminação da covid-19.

Para Bolsonaro, ter o comando da Polícia Federal – que é subordinada ao Ministério da Justiça – virou questão de estratégia. No ano passado, por exemplo, o presidente entrou em atrito com Sérgio Moro, então titular da Justiça, justamente porque queria ter poder de interferência na corporação. Paulo Maiurino, o delegado que vai substituir Rolando Souza na diretoria-geral da PF, é visto até mesmo por seus colegas como dono de um perfil mais político, como deseja Bolsonaro.

O tom do pronunciamento do novo ministro da Justiça deixou clara a mudança de rumo. "Neste momento, a força da segurança pública tem que se fazer presente, garantindo a todos um ir e vir sereno e pacífico. Contem com o Ministério da Justiça e Segurança Pública para dar esta tranquilidade", afirmou Torres, ao tomar posse em cerimônia fechada, sem transmissão ao vivo.

A manifestação foi feita no momento em que Bolsonaro trava uma ruidosa disputa com governadores e prefeitos. O presidente é contra medidas como lockdown e toque de recolher e tem dito que, se essas iniciativas não forem revertidas, a crise social vai se agravar, com mais desemprego e fome. Bolsonaro chegou até a ajuizar no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação contra decretos de governadores do Distrito Federal, Bahia e Rio Grande do Sul, que determinavam toque de recolher, mas não obteve êxito.

O Brasil superou ontem, pela primeira vez, a marca de 4 mil mortes por covid-19 em 24 horas. Foram 4.211 vidas perdidas para a doença.

"Qual é o Estado que mais fecha? São Paulo. Qual é o Estado que tem mais número de mortes, mesmo em proporção? São Paulo", disse ele ontem em conversa com apoiadores, na portaria do Palácio da Alvorada. "O pessoal aqui quer destruir o presidente. É jogo de poder. Se vai morrer mais gente, não interessa, não". O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), é adversário de Bolsonaro.

Na semana passada, em mais um movimento para obter respaldo político, o presidente demitiu o então ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, e a cúpula das Forças Armadas, que se recusaram a entrar em confronto com governadores e prefeitos e a contestar decisões do Supremo.

O Estadão apurou que, em recente conversa com Bolsonaro, o novo ministro da Justiça disse a ele que o enfrentamento à pandemia terá agora o olhar atento da Polícia Federal. A mudança na corporação, porém, não fazia parte dos planos iniciais de Torres. Além do novo diretor da PF, ele também anunciou ontem o inspetor Silvinei Vasques para o lugar de Eduardo Aggio na Polícia Rodoviária Federal.

Inquéritos. No início da gestão de Bolsonaro, a PF era comandada pelo delegado Maurício Valeixo, indicado por Moro, ex-juiz da Lava Jato. Bolsonaro reclamava da atuação de Valeixo e exigiu sua cabeça. Moro não aceitou e pediu demissão, em abril do ano passado, alegando interferência política. Mas desde que Rolando de Souza assumiu como diretor-geral, em maio, a PF abriu outros inquéritos que incomodaram o Palácio do Planalto.

O mais recente deles investiga negócios envolvendo Jair Renan Bolsonaro, filho "04" do presidente. O objetivo da Procuradoria da República no Distrito Federal é saber se um grupo empresarial do setor de mineração e Jair Renan praticaram crimes de tráfico de influência e lavagem de dinheiro.

Os outros três filhos políticos do presidente também são alvo da PF. O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-rj) é acusado de comandar esquema de rachadinha quando era deputado no Rio. A prática, que também abrigaria funcionários fantasmas, seria usada, ainda, pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-rj). Já o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) está na mira de inquérito do STF que investiga a propagação de fake news e o financiamento de atos antidemocráticos.

Em outra frente, a PF abriu inquérito contra o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello para apurar se ele cometeu crimes na gestão da pandemia de covid-19. Outras duas apurações em andamento, que também interessam o presidente, são as que tratam dos atos antidemocráticos e do inquérito das fake news.

Ao discursar na cerimônia de posse de Torres, ontem, Bolsonaro disse que o novo ministro da Justiça terá o comando de "sua própria PF". "Não é fácil e não é um ministério complicado, mas é um ministério que tem muita responsabilidade. Abaixo de você, ali, diretamente subordinada – entre outras, né? –, a sua própria Polícia Federal", afirmou o presidente, confirmando a importância do cargo.

Garantia

"A força da segurança pública tem que se fazer presente, garantindo a todos um ir e vir sereno e pacífico. Contem com o Ministério da Justiça e Segurança Pública para dar esta tranquilidade."

Anderson Torres

Ministro da Justiça e Segurança Pública