O Globo, n. 31573, 16/01/2020. Economia, p. 18

Perdas na Amazônia podem superar US$ 3 tri

Vivian Oswald


Um ano depois de ouvir do presidente Jair Bolsonaro, em seu début internacional, que o Brasil é um país que preserva o meio ambiente, o Fórum Econômico Mundial divulgou ontem o novo Relatório de Riscos Globais 2020, cheio de recados ao governo brasileiro. O documento afirma que a perda abrupta da cobertura da Amazônia pode ter custo econômico superior a US$ 3 trilhões. O estudo de referência usado pelo texto fala em um horizonte de 30 anos, mas não detalha o impacto para o Brasil, que detém a maior fatia da floresta.

No mesmo trecho em que trata da Amazônia, o relatório destaca riscos para os mercados agrícolas, lembrando que o Brasil é um dos maiores exportadores de commodities como soja, milho e carne. “Um declínio significativo na produtividade agrícola brasileira pode aumentar a volatilidade dos preços de alimentos, o que a História mostra que pode desencadear instabilidade e contribuir para deterioração de longo prazo na segurança”. E completa: “As comunidades indígenas que dependem da floresta tropical podem sofrer e, possivelmente, desaparecer. A indústria do turismo, crítica para as economias da América do Sul, pode ser seriamente afetada.”

O texto afirma que a Amazônia é o ecossistema mais diverso do mundo, habitat de 10% das espécies terrestres, e que a sua destruição significa um potencial perdido para novas descobertas de cura para doenças.

“Incêndios e alagamentos mais intensos na região, assim como o comportamento mais imprevisível dos fluxos de água, podem acontecer. Tudo isso pode abalar a produção de alimentos, aumentar a escassez de água e reduzir a geração de energia hidrelétrica, com custo econômico de mais de US$ 3 trilhões”, diz o relatório.

30 campos de futebol

Diante da necessidade de ação global com relação às ameaças climáticas, Peter Giger, um dos autores do relatório e especialista-chefe do Departamento de Risco da Zürich Insurance, afirmou que o Brasil não pode repetir os erros que outras nações cometeram no passado:

— O Brasil é um exemplo diferente. Da perspectiva do risco, está repetindo erros do passado, de centenas de anos atrás. Isso é sempre uma tragédia. No Brasil, a questão é não repetir os mesmos erros como sociedade global e como parar o desmatamento antes que seja tarde demais.

Pela primeira vez em dez anos, as ameaças para o meio ambiente estão entre os cinco principais itens da lista de riscos prováveis de longo prazo para o crescimento da economia global. “As consequências de curto prazo da mudança do clima se somam a uma urgência planetária de perdas de vidas, tensões sociais e políticas, e impactos econômicos negativos”, afirma o relatório.

Segundo o documento, cerca de 12 milhões de hectares de floresta tropical foram perdidos mundo afora em 2018, o que equivale a 30 campos de futebol por minuto. A Amazônia sozinha, destaca, perdeu aproximadamente 17% da sua extensão nos últimos 50 anos, e os índices de desmatamento subiram desde 2012. A Amazônia agora absorve cerca de um terço a menos de carbono do que fazia uma década atrás, segundo o documento.

Apesar da preocupação de investidores com o quadro ambiental, a prioridade do governo em Davos será focar nos resultados da agenda econômica. O ministro do Meio Salles, não participará da comitiva brasileira.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, buscará apresentar na Suíça a mensagem de “casa arrumada” aos investidores, com menções à aprovação da reforma da Previdência, a queda dos juros e medidas de simplificação das relações de trabalho.

Polarização econômica

Os 750 especialistas ouvidos no relatório traçam um cenário econômico sombrio e não veem munição para que os países lutem individualmente contra uma potencial recessão. No curtíssimo prazo, vislumbram novos confrontos econômicos e políticos, menos flexibilidade para estímulos monetários que impulsionem as economias e mais riscos de um prolongado período de baixo crescimento.

Para os especialistas, a economia mundial começa o ano sob a ameaça de mais polarização econômica e política, doméstica e internacional. “As turbulências geopolíticas estão nos levando para um mundo unilateral instável, de grandes rivalidades, em um momento que os líderes empresariais e de governo precisam se concentrar com urgência em ações conjuntas que reduzam os chamados riscos compartilhados”, diz o texto.

— Trata-se de um conjunto complexo de riscos para o mundo. As desigualdades dificultam as ações — disse o presidente do Fórum Econômico Mundial, Borge Brende.