Título: Boff diz que será difícil amar o papa
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Fonte: Jornal do Brasil, 20/04/2005, Internacional, p. A15

Defensor da Teologia da Libertação recebeu ordem de silêncio obsequioso de Joseph Ratzinger, em 1985

O seguidor da Teologia da Libertação, o brasileiro Leonardo Boff, disse que ''será difícil amar o novo papa, por causa de suas posições sobre a Igreja e o mundo''. Foi Joseph Ratzinger que em 1985 ordenou o ''silêncio obsequioso'', por um ano, ao teólogo.

- Como cristão, aceito e respeito a decisão, fruto da eleição dos cardeais. Mas terei dificuldades em amar este papa - declarou Boff à agência Estado.

Para o teólogo, a eleição de Ratzinger representa a ''continuação da era de inverno da Igreja''. Por isso, segundo ele, será necessário que as paróquias garantam vitalidade para além da figura tímida, não carismática e não mobilizadora do novo pontífice.

Boff acredita que Ratzinger tenha escolhido seu nome papal pelo fato de Bento XV ter enfrentado a Primeira Guerra Mundial.

- Bento XV enfrentou as devastações. O Vaticano se empenhou enormemente neste período para diminuir as dores, socorrer prisioneiros, mediar os países cristãos beligerantes. Nesta época, a Igreja dizia que era uma vergonha para as nações cristãs estarem se destruindo - explicou.

O ex-frade declarou esperar que o novo papa ''pense mais na humanidade do que na Igreja''. Desejou ainda que Bento XVI ''mantenha o diálogo com outras Igrejas e com a ciência, para buscar os melhores caminhos para os homens''.

Joseph Ratzinger, que presidia a Congregação para a Doutrina da Fé, herdeira do Santo Ofício da Inquisição, dirigiu o processo que culminou com a sanção contra Boff. Durante o pontificado de João Paulo II, 140 teólogos foram castigados, segundo o brasileiro.

A Teologia da Libertação surgiu na América Latina depois do Concílio Vaticano II (1962-1965) e impulsionou a ''opção preferencial pelos pobres'' da Igreja latina, que devia comprometer-se com sua emancipação social e política. Para Ratzinger, entretanto, o compêndio estava imbuído de idéias marxistas.

A esquerda católica desempenhou um papel chave nas lutas sociais na América Latina, na segunda metade do século passado, e contribuiu para formar a esquerda política que governa atualmente em vários países da região, como o Brasil, o Chile e o Uruguai.

Boff - que largou o hábito em 1992, se casou e é pai de um menino - havia afirmado, antes do conclave, que Ratzinger era ''um dos cardeais da Cúria Romana mais odiados pelos membros da Igreja, por sua rigidez e porque humilhou conferências de bispos e colegas cardeais com a forma autoritária com que sempre tratou as questões de fé''.

No entanto, o brasileiro acredita que o catolicismo continuará seu caminho.

- A Igreja já sobreviveu a grandes crises - disse.