O Globo, n. 31592, 04/02/2020. País, p. 4

Definições à vista
Carolina Brígido 
Leandro Prazeres


O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, aproveitou a cerimônia de reabertura dos trabalhos do Judiciário para tentar apaziguar os ânimos após um recesso com decisões conflitantes entre ele e o vice-presidente da Corte, Luiz Fux, sobre a instituição do juiz de garantias. Na cerimônia, Toffoli minimizou as divergências dizendo que elas “somam”. Contudo, o calendário do tribunal para o primeiro semestre deve trazer temas que dividirão os ministros, como a própria aplicação do juiz de garantias, pelo plenário, e o pedido de suspeição do hoje ministro da Justiça Sergio Moro, apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a cargo da Segunda Turma.

Antes disso, porém, um julgamento deve ter unanimidade no plenário: na semana que vem a Corte deve determinar a execução imediata de pena para condenados pelo tribunal do júri, que julga réus por crimes dolosos contra a vida. É uma flexibilização da decisão do ano passado sobre o cumprimento de pena em segunda instância, quando o Supremo, dividido, definiu que a sentença só é executada após o trânsito em julgado de todos os recursos.

A cerimônia de reabertura dos trabalhos do Judiciário teve a presença dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). O presidente Jair Bolsonaro não compareceu, mas representaram o governo três ministros que são cotados para uma indicação à Corte ainda em 2020: Moro, André Luiz Mendonça (Advogacia-Geral da União) e Jorge Oliveira (Secretaria-Geral).

Em seu discurso, Toffoli minimizou as divergências e afirmou que o papel do Judiciário é “gerar previsibilidade e segurança jurídica”.

— Em todo colegiado há divergências que somam e trazem a síntese daquilo que deve prevalecer, que é uma somatória das diferentes visões —afirmou o presidente do STF.

Em dezembro, Bolsonaro sancionou o projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional que criou a figura do juiz de garantias. Pela norma, um magistrado conduziria a fase de investigações e outro seria responsável por decidir se o réu é culpado ou inocente. No dia 15 de janeiro, Toffoli concedeu uma liminar adiando por seis meses a implantação desse novo dispositivo, mas o declarando constitucional. No dia 22 de janeiro, no entanto, Fux concedeu uma outra liminar suspendendo, por prazo indefinido, a implementação.

Em relação ao juiz de garantias, Fux anunciou um calendário para a discussão do processo. Ele convocou audiência pública sobre o tema para março. A intenção do ministro é liberar o processo para a pauta ainda neste semestre.

No caso envolvendo a atuação de Moro na Lava-Jato, o julgamento deve acontecer a partir do final de março. O caso está na Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), formada por cinco ministros. Um deles, Celso de Mello, está de licença médica até 19 de março, com possibilidade de renovação do afastamento. O ministro Gilmar Medes, que pediu vista do caso, disse a interlocutores que vai aguardar o retorno do colega para devolver o processo ao colegiado.

A defesa de Lula questionou no STF a atuação de Moro como juiz após ele ter aceitado o convite de Bolsonaro para ser ministro da Justiça. O julgamento começou ainda em dezembro de 2018 e dois ministros, Edson Fachin e Cármen Lúcia, votaram contra o pedido feito pelo ex-presidente. Mendes pediu vista. No ano passado, o site “The Intercept Brasil” divulgou mensagens de Moro e do procurador da República Deltan Dallagnol. A defesa do ex presidente sustenta que isto reforçaria sua tese. Quando o julgamento for retomado, Mendes será o primeiro a votar. Em seguida, se manifestarão Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.

Tribunal do júri

Antes destes temas, um outro julgamento de destaque deve produzir uma cada vez mais rara unanimidade na Corte. No ano passado, o STF reviu sua jurisprudência e determinou que prisões só devem ser realizadas após o transito em julgado. Agora, está na pauta do plenário no dia 12 um processo sobre o tribunal do júri — que, na estrutura do Judiciário, está na primeira instância. E a tendência é que o plenário determine prisões imediatas após condenações do júri, responsável por decidir em casos de crimes contra a vida cometidos de forma intencional.

Ministros da Corte acreditam que a decisão será unânime. No Supremo, a maioria considera claro o trecho da Constituição Federal que assegura “a soberania dos veredictos” do júri. Essa frase, na visão dos ministros, torna fundamental a prisão imediata dos condenados.

Em novembro, Toffoli, que votou contra as prisões imediatas de condenados em segunda instância, fez em plenário uma ressalva sobre o tribunal do júri. Para ele, deve haver prisão imediata em casos de crimes contra a vida. Outros ministros se manifestaram da mesma forma na ocasião, antecipando o tom do julgamento da próxima semana.

Ao longo do semestre, deverão entrar na pauta ainda outros temas importantes e polêmicas, como o tabelamento do frete rodoviário, a permissão para homossexuais serem doadores de sangue, a correção das contas do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, entre outros.

O que STF deve julgar nos próximos meses

Juiz de garantias

A previsão é que a nova figura seja julgada ainda no primeiro semestre, após audiência públicas marcadas pelo ministro Luiz Fux.

Tribunal do júri

No dia 12 de fevereiro, a Corte deve definir se réus condenados pelo tribunal do júri podem ser presos imediatamente ou se podem recorrer a outras instâncias em liberdade.

Tabelamento do frete

No dia 19 de fevereiro, o STF deve analisar os processos que questionam o tabelamento do frete.

Sobras eleitorais

Em março, no dia 4, estão na pauta ações que questionam a forma como ocorrem hoje as “sobras eleitorais”, mecanismo que define a eleição de parte dos deputados.

Saúde

No dia 11 de março, estarão na pauta ações relacionadas ao fornecimento de medicamentos não registrados no Brasil e o questionamento à proibição de doação de sangue por homens homossexuais.

Suspeição de Moro

Com a volta do ministro Celso de Mello, prevista para 19 de março, espera-se a retomada do julgamento do pedido de suspeição de Sergio Moro, apresentado pela defesa do ex-presidente Lula.

Réus delatores e delatados

Em 25 de março, o plenário deve fixar uma tese sobre as alegações finais de réus delatores e delatados, após decisão de outubro do ano passado que determinou que os delatados podem se manifestar apenas depois dos delatores.

Educação

No dia 22 de abril, a pauta do plenário inclui uma ação que questiona a reforma do Ensino Médio, aprovada em 2018.

Royalties do petróleo

No dia 29 de abril, ações que tratam da redistribuição dos royalties do petróleo entre os estados devem ser julgadas.

FGTS

Na sessão de 6 de maio, o STF vai analisar a regra atual de correção do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

WhatsApp

Já no dia 20, poderá ser analisada a legalidade de decisões que suspendem o funcionamento do aplicativo de mensagens.

Delação da JBS

Está marcado para 17 de junho o julgamento sobre a rescisão da delação dos irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da JBS. Eles são acusados de omitir informações no acordo firmado com a PGR e podem perder os benefícios.