O Globo, n. 31601, 13/02/2020. Segundo Caderno, p. 6

STJ libera Sérgio Camargo para assumir a Fundação Palmares

Bela Megale
Thais Arbex


O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio de Noronha acatou um recurso da Advocacia-Geral da União (AGU) e derrubou ontem decisão que suspendeu a nomeação do jornalista Sérgio Camargo para a presidência da Fundação Palmares. Com a decisão, a expectativa é a de que Camargo seja imediatamente reconduzido ao cargo. Procurada por meio de sua assessoria, a nova secretária especial da Cultura, Regina Duarte, respondeu apenas que “decisão judicial cumpre-se”. Já Camargo disse que Regina se “solidarizou” com os ataques sofridos por ele.

“Caiu a liminar que me afastou da Fundação Cultural Palmares. Serei reconduzido ao cargo. Grande dia”, postou Camargo nas redes sociais.

A nomeação foi feita em 27 de novembro pelo então secretário da Cultura Roberto Alvim. Em 4 de dezembro, a Justiça do Ceará acatou uma ação civil que pedia a suspensão de Camargo. A decisão foi tomada a pedido do advogado Hélio de Sousa Costa, em uma ação popular. Segundo ele, houve desvirtuamento na nomeação, porque as declarações de Camargo nas redes sociais seriam incompatíveis com o papel do órgão para o qual foi escolhido. Nas postagens, ele afirma que no Brasil não existe “racismo real”, que a escravidão foi “benéfica para os descendentes” e que o movimento negro precisa ser “extinto”. Os comentários foram revelados pelo GLOBO.

O juiz Emanuel José Matias Guerra, da 18ª Vara Federal de Sobral (CE), concordou que houve “excessos” nas postagens, com termos “em frontal ataque às minorias cuja defesa, diga-se, é razão de existir da instituição que por ele é presidida”.

“Eventuais excessos”

Entre as postagens listadas no processo, Camargo se referiu à ativista americana Angela Davis como “comunista e mocreia assustadora”. Também declarou nada ter a ver com “a África, seus costumes e religião”, sugeriu entrega de medalha a “branco que meter um preto militante na cadeia por crime de racismo” e que “é preciso que Marielle morra. Só assim ela deixará de encher o saco”. E, por fim, afirmou que “se você é africano e acha que o Brasil é racista, a porta da rua é serventia da casa”.

Na avaliação do presidente do STF, “eventuais excessos” de Camargo nas redes sociais “não autorizam juízo de valor acerca de seus valores éticos e morais ou mesmo de sua competência profissional”.

A recondução de Camargo ao cargo também foi comemorada nas redes pela reverenda Jane Silva, exsecretária da diversidade cultural e ex-secretária adjunta da Secretaria Especial da Cultura, que foi demitida na semana passada a pedido de Regina Duarte. “Estou muito feliz” e “Trabalhei muito para isso acontecer”, publicou ela.

Camargo afirmou que foi apresentado recentemente à atriz Regina Duarte e que teve uma conversa informal com ela. Segundo ele, a atriz se solidarizou por ataques que ele recebeu pelas declarações que fez. Disse, contudo, que sua permanência no cargo não foi discutida. Regina foi escolhida para comandar a secretaria especial da Cultura, órgão ao qual a Fundação Palmares é subordinada, porém ainda não foi nomeada oficialmente para o cargo.

De acordo com Camargo, o encontro ocorreu durante uma visita sua à Secretaria da Cultura. Ele disse que também demonstrou solidariedade à atriz pelas críticas que ela recebeu após aceitar o convite para a secretaria.

— Fui apresentado a ela. Ela me recebeu muito bem, me causou uma excelente impressão — contou Camargo ao GLOBO. — Ela me deu um forte abraço. Ela se solidarizou comigo e eu com ela, em relação aos ataques que nós sofremos.

O jornalista ressaltou que não tratou da Fundação Palmares com Regina porque ela ainda não foi nomeada. Camargo não quis comentar a decisão do STJ e disse que se manifestará somente por meio de nota. Ele afirmou, contudo, que deverá se reportar diretamente à Casa Civil, enquanto a atriz não for confirmada no cargo.