O Globo, n. 31596, 08/02/2020. País, p. 10

Aos 40 anos, PT sofre para renovar seus quadros
Sérgio Roxo


O PT completa 40 anos na próxima segunda-feira diante do desafio de renovar os seus quadros. A falta de novos nomes tem impacto direto na dificuldade do partido para definir candidaturas nas principais cidades na eleição deste ano. Apesar da insistência do ex-presidente Lula para que o PT esteja na disputa no maior número possível de municípios, a legenda deve ter nomes na urna em apenas cerca de dez capitais.

Dessas cidades, só no Nordeste, reduto tradicional da legenda, os pré-candidatos petistas se mostram competitivos na largada da disputa eleitoral. São os casos da exprefeita Luizianne Lins em Fortaleza e da deputada Marília Arraes em Recife. A segunda, porém, enfrenta resistência da cúpula da legenda em Pernambuco, que é favorável à manutenção da aliança local com o PSB.

O PT está comemorando seus 40 anos com eventos no Rio. Ontem, em uma casa de shows da Lapa, houve a abertura com discursos da presidente da legenda, Gleisi Hoffmann, do ex-candidato a presidente Fernando Haddad e do ex-ministro José Dirceu. Hoje, uma das mesas terá a presença do ex-presidente Lula e do ex-presidente do Uruguai José Mujica. Reservadamente, dirigentes reconhecem que o partido sofre para se renovar em consequência de seu afastamento das bases nos anos em que permaneceu no poder. Também admitem que em muitas cidades serão lançados nomes com chances mínimas de vitória. Já militantes da juventude petista se queixam de desdém da cúpula partidária pela formação de novos quadros e dizem que, por muitos anos, o PT ficou preso ao sindicalismo sem se atentar para o enfraquecimento dessas organizações por causa das mudanças nas relações de trabalho.

O cenário mais explícito da dificuldade do PT para formar quadros se dá em São Paulo. Com a resistência de Haddad de concorrer, sete nomes se apresentaram para disputar uma prévia, mas nenhum deles é visto como competitivo.

Em Belo Horizonte, os nomes cotados para a candidatura também são considerados azarões. Já na região metropolitana de São Paulo, que no passado foi um reduto petista, a aposta será em políticos veteranos, que já foram prefeitos, como Luiz Marinho em São Bernardo.

Acadêmico com olhar voltado para a história do PT, o professor do departamento de sociologia da USP Ricardo Musse avalia que o partido sofreu as consequências das mudanças sociais e do seu próprio crescimento. Ele lembra que o PT foi fundado por quadros que já tinham expressão social antes de ingressarem na política institucional, seja no sindicalismo, no movimento estudantil e na academia. São os casos de Lula, Dirceu e Eduardo Suplicy.

— Esse processo não teve como ter continuidade pelas mudanças históricas.

Em seguida, houve, na avaliação do professor, uma inevitável burocratização vivida por todos os partidos de massa do mundo.

— Quando o PT foi fundado, quem mandava no mandato do parlamentar era a estrutura do partido. A partir de um momento, esse parlamentar começou a contratar quadros do partido, que ficaram reféns do parlamentar. Isso fez com que as tendências e a base se enfraquecessem.

Nos últimos anos, o PSOL, legenda que nasceu de uma dissidência do PT, passou a recrutar militantes ligados a movimentos estudantil, negro, feminista e LGBT. Hoje, dos dez deputados da bancada do PSOL, seis têm menos de 40 anos. Dos 53 do PT, só três estão nessa mesma faixa etária.

— O PT ainda tinha na cabeça que o sindicato e o MST eram a fonte do ativismo. Recentemente, o PT começou a se abrir para eles. Agora isso já faz parte da retórica do partido, mas não da prática — analisa Musse.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, não nega que o partido tenha poucos nomes competitivos para as eleições nas capitais.

— O partido sofreu um ataque descomunal de desconstrução política. Muitas lideranças foram atacadas. O tempo para reconstruir uma imagem política, para reposicionar uma liderança, é longo. É natural essa consequência em razão do que nós sofremos. A dirigente acredita que a falta de nomes consolidados pode servir justamente para promovera renovação.

— Vejo como uma oportunidade de lançar novas lideranças. Muitos podem ser surpresas e, mesmo que não ganhem, começamos aformar lideranças de referência popular.