Título: Alemães acusam ingleses de Rixa antiga chega ao Vaticano
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 23/04/2005, Internacional, p. A5

A campanha dos tablóides britânicos contra o novo papa, por ter pertencido à Juventude Hitlerista, é vulgar e, segundo historiadores alemães, reflete, além de ignorância histórica, o sentimento anti-alemão que persiste no Reino Unido.

''O cardeal Joseph Ratzinger, agora papa Bento XVI, não é um problema. O problema é inglês'', afirma o escritor e historiador Olaf Blaschke, professor na Universidade de Trier, em artigo publicado pelo diário Die Tageszeitung.

Blaschke lembra que para os jovens da geração do novo papa, de 78 anos, pertencer à Juventude Hitlerista era quase automático e em nenhum caso uma opção ideológica. E questiona se o caso de Ratzinger é específico e se o ingresso dele na associação, aos 14 anos, foi fruto de uma reflexão política. Prevendo uma resposta afirmativa, o escritor lembra que o agora papa deixou em 1945 o Exército para o qual tinha sido obrigatoriamente recrutado.

O sentimento anti-alemão, obsessão que alguns círculos se empenham em manter viva como se formasse parte do próprio caráter nacional inglês, foi igualmente palpável com a Unificação Alemã, afiram outros historiadores.

''Os eurocéticos temiam que a União Européia (UE) se transformasse no IV Reich'', escreveu Blaschke, que parafraseou o historiador da Universidade de Cambridge, Richard Evans, para estabelecer um paralelismo entre o ressurgimento na Inglaterra da xenofobia contra o alemão com o crescente nacionalismo em Gales e Escócia.

Outras das razões que explicariam esse ressentimento são, para o historiador, a deterioração por razões econômicas que se viu na qualidade da imprensa britânica e a necessidade de temas que não obriguem uma articulação tão politicamente correta, como o racismo e o casamento homossexual.

- As Juventudes Hitleristas eram formadas por jovens, não criminosos - defendeu ao jornal Bild o historiador e biógrafo de Hitler, Joachim Fest.

- Entrar para este grupo não era uma escolha. Não fazer isso era o mesmo que levar um parente para a prisão - disse o octogenário Otto Voigt, ex-membro da milícia.

- Pertencer a aquelas fileiras só significa ter nascido na era de Hitler - afirma Ralf Marquis, de 78 anos.

- Éramos obrigados a entrar na organização, mas era divertido porque se praticava muito esporte. Não me envergonho de nada - admite Helmut Beckflores, de 76 anos, que critica os britânicos: - Eles não sabem o que aquilo significava para um menino alemão.

Todos os testemunhos são similares e em nenhum se destaca um sentimento de culpa ou vergonha, pois ''entrar para as juventudes era compulsório para as crianças de entre 10 e 14 anos a partir de 1939'', afirmou o historiador Fest.

- Nas reuniões nós acampávamos, procurávamos animais na floresta. Não lembro se nos falavam de ideologia, de anti-semitismo, de doutrina racial - afirma o ex-porta-voz do governo Klaus Boelling, de 76 anos.

Para o historiador e teólogo alemão Vinzenz Pfnür, a campanha que a imprensa britânica realiza contra Bento XVI por seu suposto passado nazista é ''grotesca''.

- É preocupante como se acusa uma pessoa de nazista. A foto que a imprensa britânica utiliza para mostrar um suposto passado nazista mostra Ratzinger aos 16 anos com um canhão durante as manobras obrigatórias que todos os jovens de sua idade tinham que realizar depois da aula - assegura Pfnür. - Ratzinger, por mais que a imprensa britânica se esforce, nunca foi um simpatizante do nacional-socialismo.