O Estado de S. Paulo, n. 46575, 24/04/2021. Política, p. A8

Em Manaus, Bolsonaro elogia Pazuello

Mateus Vargas
Emily  Behnke
Rosiene  Carvalho


Um dia depois de o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), alertar para a possibilidade de uma terceira onda de contaminação pela covid19, o presidente Jair Bolsonaro e comitiva estiveram ontem na capital do Estado, Manaus, para participar de eventos que causaram aglomeração. Sem máscara, Bolsonaro cumprimentou apoiadores, posou para fotos e fez uma espécie de ato de desagravo ao ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello – cuja atuação no caos instalado em Manaus no início do ano por falta de oxigênio motivou a abertura de inquérito da Polícia Federal e da CPI da Covid no Senado.

Em Manaus, Bolsonaro recebeu o título de cidadão amazonense, aprovado na Assembleia Legislativa, participou de encontro com líderes evangélicos e inaugurou um pavilhão no Centro de Convenções do Amazonas. O presidente estava acompanhado de assessores e ministros, entre eles o titular da Saúde, Marcelo Queiroga, que já se manifestou favorável a medidas de distanciamento social para reduzir o contágio pelo novo coronavírus.

Segundo apurou o Estadão, o governador do Amazonas discutiu ontem com Queiroga um plano para enfrentar a terceira onda de covid no Estado. Há temor de nova falta de oxigênio, além de medicamentos de intubação. O Amazonas enfrentou o auge da crise sanitária em janeiro, quando o sistema de saúde do Estado entrou em colapso e pacientes internados morreram asfixiados pela falta de oxigênio medicinal.

Às vésperas de o insumo acabar, uma equipe liderada pelo então ministro Eduardo Pazuello esteve na cidade levando 130 mil comprimidos de hidroxicloroquina, droga sem eficácia comprovada para a covid-19.

A possível omissão do governo federal para evitar a crise no Amazonas colocou a gestão Bolsonaro em crise e sob investigações. A CPI da Covid no Senado vai apurar se a equipe de Pazuello demorou para agir. O presidente minimizou, à época, a crise em Manaus e chegou a creditá-la à falta de uso do tratamento precoce, o "kit covid", com base em medicamentos contraindicados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Ao discursar ontem, Bolsonaro disse que o colapso foi "inesperado" e comemorou o fato de não haver um "lockdown nacional" contra a pandemia. "Imagine essa pandemia com (o candidato derrotado no segundo turno das eleições presidenciais de 2018 Fernando) Haddad presidente da República. Estaríamos num lockdown nacional. Graças a Deus isso não aconteceu."

O presidente ainda afirmou que sua equipe "colaborou e muito" para reduzir danos do colapso em Manaus e elogiou o ex-ministro Pazuello. "Conseguimos com a equipe que nós temos em Brasília colaborar e muito para que os danos dessa pandemia fossem diminuídos, em especial pelo ministro da Saúde que tive até pouco tempo, o senhor Eduardo Pazuello", disse Bolsonaro na cerimônia de inauguração do Pavilhão de Feiras e Exposições do Centro de Convenções do Amazonas. Em seguida, disse que Queiroga dá "prosseguimento" ao trabalho do general. A visita do presidente ocorreu num evento que reuniu pelo menos 300 pessoas num ambiente fechado.

Pazuello é alvo de inquérito da PF que investiga sua atuação na crise em Manaus. Na semana passada, o Ministério Público Federal apresentou ação de improbidade administrativa contra o ex-ministro e secretários do Ministério da Saúde.

No evento, Pazuello foi chamado à frente no palco pelo ministro do Turismo, Gilson Machado. O general não falou ao microfone, mas ouviu palmas e gritos de apoio da plateia, entre eles "Pazuello governador". Durante os aplausos, Bolsonaro levantou e o abraçou. "Fui testemunha da luta desse homem (Pazuello) pela erradicação da doença no nosso país", disse Machado. "Quero dizer, Pazuello, que somos muito gratos ao seu empenho." O ministro do Turismo também tocou sanfona durante o discurso.

Aliado ao governo, Wilson Lima discursou, mas sob vaias, e reforçou o endosso a Pazuello. "Quero fazer um reconhecimento ao governo federal, que nos ajudou e foi fundamental nesse processo de enfrentamento da covid-19. Quero fazer um agradecimento muito especial ao general Eduardo Pazuello, que viveu no Estado do Amazonas os momentos mais difíceis pelo qual o nosso povo passou."

Cargo. O desagravo a Pazuello acontece em meio à repercussão da entrevista que o ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten concedeu à revista Veja, na qual ele credita a falta de vacinas no País à "incompetência e ineficiência" do então ministro. Pazuello deixou o ministério no fim de março. Ontem, o ex-ministro foi nomeado para a Secretaria-geral do Exército. Ele espera, contudo, assumir um cargo no Palácio do Planalto. / Mateus Vargas, Emilly Behnke e Rosiene Carvalho, Especial para O Estadão