O Estado de S. Paulo, n. 46575, 24/04/2021. Economia & Negócios, p. B4

Congresso vê sanção como vitória do Centrão

Daniel Weterman
Camila Turtelli


A sanção do Orçamento de 2021 com uma engenharia para fechar as contas foi vista nos bastidores do Congresso como uma vitória do Centrão, bloco de partidos que apoiam o governo em troca de verbas e cargos, e uma derrota para o ministro da Economia, Paulo Guedes. Nenhuma das duas alas, porém, saiu totalmente satisfeita.

Fontes ouvidas pelo Estadão/broadcast apontam que as verbas de interesse direto dos caciques partidários foram preservadas após um cabo de guerra entre a cúpula do Congresso, que pressionava pela sanção integral do projeto, e Guedes, que queria vetar todas as emendas de relator.

O presidente Jair Bolsonaro vetou um total de R$ 19,8 bilhões em verbas, dos quais R$ 11,9 bilhões eram fruto de emendas parlamentares. Além disso, o presidente anunciou um bloqueio de R$ 9,3 bilhões em despesas do Executivo e enviou um novo projeto de lei para recompor os gastos obrigatórios. Mesmo com os cortes, as emendas ainda ficaram em um patamar de R$ 35,5 bilhões, semelhante ao valor autorizado em 2020, ano de eleições municipais.

O ministro da Economia chegou a defender inicialmente um veto em todas as emendas indicadas pelo relator do Orçamento, senador Marcio Bittar (MDB-AC), um total de R$ 29 bilhões. A cúpula do Legislativo reagiu e pressionava pela sanção integral, mas, no final das contas, recuou e aceitou a preservação de R$ 18,5 bilhões dessas indicações – dos quais R$ 16,5 bilhões são consideradas “emendas-chave” para atender aos caciques políticos da Câmara e do Senado. É o valor que tinha sido combinado com o Congresso para a aprovação da PEC emergencial, que garantiu mais uma rodada do auxílio emergencial a vulneráveis em 2021.

Nos bastidores, o fato de Bolsonaro não ter atendido a um pedido de Guedes em um veto presidencial chamou a atenção. Inicialmente, o ministro pedia veto integral nas emendas de relator e, depois, aceitou a preservação de parte dessas verbas em troca de cortes maiores em despesas discricionárias, aquelas geridas diretamente pelo Executivo, como custeio e investimentos. A solução, porém, é questionada por parlamentares e técnicos, que veem risco de paralisia no funcionamento da máquina federal.

Em ocasiões anteriores, a estratégia de Bolsonaro foi diferente: o presidente ouvia Guedes, vetava medidas aprovadas pelo Congresso e depois liberava a base de apoio no Legislativo para derrubar os próprios vetos. Foi o que aconteceu, por exemplo, na prorrogação da desoneração da folha salarial e no perdão tributário a igrejas. Além disso, o ministro saiu do processo criticado por parlamentares que lideram as articulações para a aprovação do Orçamento em função dos ruídos e dos ataques feitos nos bastidores.

“Tudo isso mostra a fragilidade do governo, que se rende a uma situação dessa natureza. O governo está na palma da mão do Centrão. Se o Centrão virar a palma da mão para baixo, o governo cai”, afirmou o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, Otto Alencar (PSD-BA). “Guedes tem se suportado no cargo, mas a insegurança que o presidente dá para os ministros do governo é fora da razão.”

Da base do governo, o deputado Vinícius Carvalho (Republicanos-sp) acredita que o governo fez o que era necessário e que poderá ir ajustando a peça ao longo do ano. “Estamos caminhando em busca do êxito. Hoje quem está ganhando? Ninguém. E o País precisa ganhar e só vamos ganhar se nós não nos digladiarmos e juntarmos forças”, disse. Ele afirma ainda que Guedes teria “entendido a conjuntura política” e aceitado a decisão de Bolsonaro.

Crítica

“(...) O governo está na palma da mão do Centrão. Se ele virar a palma da mão para baixo, o governo cai.”

Otto Alencar (PSD-BA)

Presidente da CAE do Senado