Título: Dantas manteve espionagem ilegal
Autor: Hugo Marques
Fonte: Jornal do Brasil, 26/04/2005, Economia & Negócios, p. A23

Banqueiro recorreu a israelense para vigiar desafetos mesmo depois de o esquema Kroll ter sido revelado pela Polícia Federal

O banqueiro Daniel Dantas - dono do Grupo Opportunity - utilizou métodos ilícitos ainda ''mais agressivos'' para espionar seus desafetos após a deflagração da Operação Chacal, da Polícia Federal, no ano passado. É o que mostram documentos que o Ministério Público Federal enviou, na semana passada, à Justiça Federal em São Paulo, com base em relatórios da Operação Chacal, onde são feitos 13 pedidos de prisão dos envolvidos com a espionagem da Kroll Associates, inclusive Dantas.

Daniel Dantas não parou com sua ''atividade ilícita'', mesmo depois de divulgado todo o caso Kroll, onde ocorreram investigações ilegais. Dantas continuou com suas investigações por outros meios, ''mais agressivos'', recorrendo aos serviços do espião israelense Avner Shemesh.

Estes documentos que estão na Justiça Federal e no MP, segundo fontes que tiveram acesso ao relatório, concluem que Dantas violou a intimidade do jornalista Paulo Henrique Amorim, da TV Record, investigado pelo israelense. Voltou ainda a violar a intimidade do empresário Luiz Roberto Demarco, seu ex-sócio e com quem trava disputas judiciais.

Segundo as fontes ouvidas, após desbaratada a ''quadrilha'' envolvendo a Kroll Associates e a Kroll International - no ano passado -, Daniel Dantas ''migrou'' seu esquema de investigações para o escritório de Shemesh em São Paulo. O sócio e ex-cunhado de Dantas, o banqueiro Carlos Rodenburg, foi filmado entrando no escritório de Avner, em abril. Em busca e apreensão realizada no escritório e na residência de Avner, foi encontrado farto material de investigação sobre Demarco e Amorim, tudo após deflagrada a Operação Chacal.

A lista de documentos encontrados com Avner inclui material que seria interceptação telefônica, feita em dezembro do ano passado. Avner Shemesh quase foi preso pela PF. O israelense também trabalha para uma grande rede de fast-food dos Estados Unidos e cuida da segurança do consulado de Israel em São Paulo.

A conclusão de que Daniel Dantas migrou sua bisbilhotagem para outro escritório embasou o pedido de prisão do banqueiro, já que os investigados continuaram com as mesmas práticas ilícitas detectadas durante a Operação Chacal. O embasamento legal para o pedido de 13 prisões é a garantia de ordem pública.

A atuação criminosa da Kroll Associates e da Kroll International - segundo a documentação em poder da Justiça Federal e do Ministério Público - é habitual e ainda prossegue. De acordo com fontes que leram a documentação, as 13 prisões solicitadas à Justiça têm como função ''desmontar'' a estrutura criminosa da Kroll Associates e da Kroll International. No Brasil, o principal responsável pelas operações da Kroll era Eduardo Gomide. No exterior, Charles Carr, Omer Erginsoy e William Goodall.

A Operação Chacal concluiu pela existência de uma quadrilha ''transnacional'', formada pela Kroll Associates, a Kroll International e as pessoas que os contrataram para quebra de sigilo, entre as quais se incluem Daniel Dantas e sua principal executiva, a presidente da Brasil Telecom, Carla Cico, ambos indiciados por formação de quadrilha.

As investigações mostraram que várias pessoas continuaram abastecendo a Kroll com dados sigilosos, mesmo após deflagrada a Operação Chacal. A Kroll chama estes colaboradores de ''sub-contratados''. Entre os sub-contratados que continuam colaborando com a empresa estão Nilza Soares Martins e Alexandre Ramos Martins, representantes de uma empresa que corromperia funcionários da Receita Federal para obter informações e repassar para os relatórios que a Kroll vende a empresários. Os vendedores de informações sigilosas para a Kroll continuaram visitando a sede da empresa até fevereiro.

Estes contratados da Kroll, de acordo com as investigações, corromperiam servidores públicos, principalmente da Receita, policiais e até um ex-servidor do Banco Central. Os funcionários públicos corrompidos eram chamados de ''sub-estatutários''. Outra orientação da diretoria da Kroll é que seus contratados e funcionários ocultem a forma de obtenção dos dados dos relatórios finais.

As táticas da Kroll para tentar conter as investigações são também agressivas. Ex-funcionária da Kroll, Márcia Ruiz diz ter sido abordada por uma advogada da empresa, no dia do interrogatório. A advogada, segundo Márcia, orientou-a a gritar durante o depoimento.

A Operação Chacal faz ainda referência a uma servidora da PF, Judite de Oliveira Dias. Ela é mãe do funcionário da Kroll Thiago Carvalho dos Santos. Judite trabalha no protocolo da Superintendência da PF em São Paulo, uma área estratégica, pois lá passam vários documentos da Operação Chacal. Nas buscas e apreensões feitas em São Paulo, foram encontradas mais de 50 pastas de investigações da empresa. A única destas pastas que nada continha quando a polícia chegou é a da Brasil Telecom, de Daniel Dantas, segundo uma fonte.

Além de Dantas, a Justiça Federal apreciou na semana passada pedidos de prisão de diretores e funcionários da Kroll, no Brasil e no exterior, além do israelense Avner Shemesh. O Ministério Público não dá detalhes sobre as investigações. Segundo um dos advogados do caso, os pedidos de prisão teriam sido todos negados.