O Estado de S. Paulo, n. 46578, 27/04/2021. Política, p. A4

Juiz do DF barra Renan na relatoria da CPI da Covid

Rafael Moraes Moura
Daniel Weterman
Marcelo De Moraes
Lauriberto Pompeu


Na véspera da instalação da CPI da Covid, a Justiça Federal do Distrito Federal barrou a possibilidade de o senador Renan Calheiros (MDB-AL) assumir a relatoria dos trabalhos da comissão parlamentar de inquérito. A decisão liminar foi tomada no âmbito de uma ação movida pela deputada Carla Zambelli (PSLSP), aliada do presidente Jair Bolsonaro. Renan disse que “não há precedente na história de medida tão esdrúxula” e já recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1.ª Região. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), indicou que não cumprirá a decisão do juiz Charles de Morais.

A CPI será aberta hoje em clima de guerra e a liminar tem chance de ser derrubada. “A escolha de um relator cabe ao presidente da CPI, por seus próprios critérios. Trata-se de questão interna corporis do Parlamento, que não admite interferência de um juiz”, afirmou Pacheco, em nota. “A preservação da competência do Senado é essencial ao estado de direito. A Constituição impõe a observância da harmonia e independência entre os poderes.”

Sob ataque e sem maioria no colegiado, o Planalto partirá para o confronto contra o G-7, grupo de sete senadores considerados independentes e de oposição, fazendo uma espécie de dossiê sobre os adversários. Com a CPI mirando erros e omissões do governo no combate à pandemia, Bolsonaro reforçou as ameaças e engrossou o tom contra governadores que determinaram medidas de isolamento social.

“Não estou preocupado porque não devemos nada”, disse ele, ao ser questionado sobre a CPI, após entregar um trecho de duplicação da BR-101, em Feira de Santana (BA). “Está chegando a hora de o Brasil dar um novo grito de independência.”

Desde o último dia 16 há um acordo fechado entre sete dos 11 senadores que compõem a comissão para Omar Aziz (PSDAM) ser presidente da CPI; Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente; e Renan, relator. A eleição que confirmará os ocupantes dos principais postos está marcada para hoje.

Carla Zambelli alegou à Justiça que Renan responde a inquéritos no Supremo Tribunal Federal por corrupção, lavagem de dinheiro e improbidade administrativa, o que comprometeria a “imparcialidade que se pretende de um relator”. Embora a liminar mande Pacheco impedir que a votação para compor a CPI inclua Renan como relator, a escolha não depende da eleição. É o presidente da comissão que designa o relator.

‘Interferência’. “Por que tanto medo?”, perguntou Renan, em mensagem no Twitter. Ao Estadão/broadcast, o senador apontou influência de Bolsonaro na ordem da Justiça. “Isso não tem sentido. O Senado tem poderes constitucionais para proceder com a investigação, não pode ter interferência judicial”, disse.

Para tentar embaralhar o jogo, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) vai se candidatar hoje à presidência da CPI. Girão se declara independente, mas atua alinhado com o Planalto.

Responsável pela convocação da sessão de hoje, por ser o integrante mais velho da CPI, Otto Alencar (PSD-BA) afirmou que Renan será o relator. “Nem tem eleição (para relator). Até isso ele (o juiz) não conhece. Aí cabe a frase de Rui Barbosa: a ignorância duvida porque desconhece o que ignora”, reagiu Alencar. / Rafael Moraes Moura, Daniel Weterman, Marcelo de Moraes e Lauriberto Pompeu