Título: Críticas nas alturas
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Fonte: Jornal do Brasil, 27/04/2005, País, p. A3

Declaração de Lula sobre comodismo dos brasileiros provoca reações. Presidente diz que, apesar das taxas, país continua crescendo

A declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, chamando a classe média de comodista e incapaz de ''levantar o traseiro da cadeira'' para procurar bancos com taxas de juros menores, desencadeou uma avalanche de críticas. A fala do presidente foi mal recebida em vários setores, de economistas a políticos. E ontem, o presidente voltou a tocar no assunto. Afirmou que o país tem capacidade de ampliar o seu consumo interno mesmo diante das atuais taxas definidas pelo Banco Central - em 19,50% ao ano desde a semana passada. No setor privado, no entanto, as declarações da véspera repercutiram mal. O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, disse ontem que o aumento da taxa básica de juros é nocivo ao país.

- O que significa esses aumentos na taxa Selic só é alavancar os gastos públicos porque uma das despesas principais do governo é o pagamento da conta juros - afirmou Skaf.

Para o presidente do Sindicato da Micro e Pequena Indústria, Joseph Couri, ''Lula podia dar o exemplo e negociar juros menores para a dívida pública''.

- Ele devia dar o exemplo tirando o traseiro da cadeira para convencer banqueiros a cobrar menos pelo financiamento do déficit das contas governamentais - ironizou Couri.

Couri chama atenção para o efeito nocivo do aumento da Selic na conta de juros paga pelo governo por carregar uma dívida que equivale 53,7% do PIB.

O presidente do grupo Gerdau, Jorge Gerdau, concordou em parte com a declaração de Lula. Segundo ele, no entanto, o problema dos juros não é o comodismo do brasileiro, mas sim a pouca oferta de dinheiro. Ele atribui ao governo a escassez de recursos para empréstimo no mercado.

- Talvez exista o comodismo, e não só nisso, mas o principal é que a mercadoria é escassa - argumentou o empresário.

O presidente da Confederação Nacional da Indústria, Armando Monteiro Neto, considerou inadequada a tentativa de transferir o problema para a sociedade.

O presidente Lula, no entanto, disse ontem que a ''verdade nua e crua é que a quantidade de dinheiro que está sendo jogada no mercado não estava prevista nos manuais da ordem econômica deste país.''

- É por isso que, mesmo com a taxa Selic a 19,25%, o mercado interno continua a crescer, o varejo está crescendo - afirmou, errando ao citar o índice da taxa de juros que subiu na semana passada. O presidente, mais uma vez falou de improviso em um hotel de Brasília, em evento da Associação Brasileira da Indústria de Café.

No Congresso, o crítico habitual do governo, o senador Arthur Virgílio, líder do PSDB, encaminhou à Mesa pedido de censura ao presidente Lula por uso de linguagem chula.

- Quero um reparo ao destempero verbal do presidente. Recomendo que o ele sente seu traseiro no Planalto e pare de governar de pé, somente fazendo discursos - afirmou Virgílio

Ontem, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) se manifestou afirma que as taxas não diferem muito conforme o banco. Roberto Luis Troster, economista-chefe da entidade disse que a margem de lucro dos bancos é muito baixa e, portanto, as instituições não têm como dar grandes descontos.