Título: Antonio Sepulveda
Autor: Diplomacia sem respaldo
Fonte: Jornal do Brasil, 27/04/2005, Outras Opiniões, p. A11

São inócuos os protestos do ministro Celso Amorim ante a proposta do francês Pascal Lamy de submeter a Amazônia a uma gestão global. A História ensina, com exemplos lapidares, que o mundo não costuma prestar atenção ao que dizem nações destituídas de um poder militar que lhe respalde os interesses e pretensões no cenário político-estratégico internacional. Nenhum silogismo diplomático, por melhor que seja, consegue prevalecer por si só; o argumento precisa ter, atrás de si, uma esquadra, divisões blindadas e coberturas de caças capazes de dissuadir imposições inadmissíveis. Sempre foi assim, desde muito antes das guerras púnicas; e pelo andar da carruagem, nada mudou no limiar do século 21.

Isso é errado? É falta de bom senso? É inaceitável? É. Mas a vida é assim, a dura realidade é esta. Um país com muito a perder e sonhos de soberania sobre a própria riqueza precisa saber deter uma possível ameaça mediante a capacidade de infligir no agressor danos inaceitáveis, ainda que esse agressor disponha de um poder de fogo maior. Enfim, não se pode, irresponsavelmente, prescindir da segurança de um poder militar capaz de dissuadir a coerção em momentos críticos.

Como podemos então entender o nítido processo de depreciação das forças armadas e o aviltamento da qualidade de vida do pessoal militar perpetrado por este governo de Lula da Silva? Se a resposta for uma espécie de desforra de caráter político, trata-se evidentemente de inominável estupidez, autoflagelação, quase suicídio. Os militares são o suporte de qualquer iniciativa para a consecução dos propósitos vitais de um Estado. Nenhuma nação jamais foi criada ou preservada ou eliminada sem a interferência de forças armadas que agiram ou reagiram em prol de algum objetivo político. A regularidade da trajetória humana mostra que a existência e a perspectiva de futuro de um país sempre dependeram, direta ou indiretamente, de seus marinheiros e soldados. Não adianta o Estado delinear estratégias e colimar ambiciosos objetivos nacionais, se for incapaz de sequer incluí-los na pauta das negociações internacionais.

O sucateamento das Forças Armadas do Brasil e a desmoralização sistemática dos seus componentes são, portanto, atitudes masoquistas e temerárias. Por falta de percepção geopolítica, com a eterna desculpa de outras prioridades que também nunca são atendidas, dissolve-se um patrimônio respeitável, fruto dos esforços de inúmeras gerações de planejadores vaticinantes e abnegados. A obtusidade deste governo de burocratas não enxerga o valor do adestramento, da capacidade de mobilização, da prontidão estratégica e, sobretudo, da elevação do moral da tropa. O Estado brasileiro é inchado e retrógrado; o governo mostra-se inepto e demagogo; não há liderança tangível; imperam a corrupção e o descaminho. O último bastião eram os hoje humilhados militares. A quem interessa este cenário?

O Sr. Lamy pode, sim, subestimar a capacitação brasileira, propor a adoção de regras de gestão coletiva para uma Amazônia internacional, e requisitar a região como um ''bem público mundial'', porque ele não tem motivos para se preocupar com alguma reação nacional significativa além dos pitis, fricotes e faniquitos de airosos diplomatas. Celso Amorim acreditou que tinha condições de se aproveitar das declarações de Pascal Lamy para empurrar a candidatura do embaixador Luiz Felipe Seixas Corrêa para o posto máximo da Organização Mundial do Comércio. Ato contínuo, o nome do brasileiro foi cortado pela OMC; como quem diz: cresça e apareça. Será que tratariam a China com tamanho desprezo? Pouco provável.