O Estado de S. Paulo, n. 46582, 01/05/2021. Metrópole p. A18
Quebra de patente para vacina não deve avançar
Lauriberto Pompeu
Aprovado no Senado na noite de anteontem, o projeto de lei que autoriza a
quebra de patentes de vacinas e medicamentos contra a covid-19 no Brasil deve
ser engavetado na Câmara. O Estadão apurou que o presidente da Casa, Arthur
Lira (Progressistas-al), trata o tema como a última de suas prioridades e já
avisou que “não vai nem olhar” para esse assunto. Com exceção de nomes da
oposição, a maioria dos líderes de partido evita declarar apoio. O governo de
Jair Bolsonaro é contra.
O
projeto altera uma lei de 1996 que regula direitos e obrigações relativos à
propriedade industrial. A versão aprovada pelos senadores por 55 votos a 19 foi
sugerida pelo relator, Nelsinho Trad (PSD-MS), com
base no texto original, do senador Paulo Paim (PT-RS). Com a quebra de
patentes, a produção de imunizantes, insumos e remédios não precisaria observar
os direitos de propriedade industrial durante a pandemia. No âmbito
internacional, países como Índia e África do Sul tentam aprovar essa medida na
Organização Mundial do Comércio (OMC), mas nações desenvolvidas, como Estados
Unidos, Reino Unido, Suíça e Japão são contra. O governo brasileiro não se
posicionou oficialmente.
O
vice-presidente da Câmara, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), questiona a
efetividade de o Brasil adotar a medida de forma isolada. “Poderíamos ter como
efeito as empresas não venderem vacinas para nós”, afirmou ao Estadão .O argumento é o mesmo usado pelo líder do governo
na Casa, o deputado Ricardo Barros (Progressistas-pr).
O
presidente da Câmara também tem afirmado à interlocutores que a medida terá
como efeito afugentar registros de medicamentos no País. Lira tem se informado
sobre o assunto com especialistas e chegou a
conclusão de que é impossível quebrar patentes no Brasil se não há registro dos
medicamentos. O que torna o projeto aprovado pelos senadores inócuo.
Mesmo
entre aqueles que defendem a flexibilização das regras, a avaliação é que
promover a quebra de patente sem mudar acordos internacionais não é suficiente
para produzir vacinas. O que só seria possível caso o Brasil dominasse todas as
etapas do ciclo de produção. Além disso, o processo para o País descobrir o
modo de fabricação de imunizantes como os produzidos pela Pfizer e Janssen
poderia levar meses ou anos.
“Nosso
problema agora não é quebra de patente, mas como a gente consegue vacina para
os próximos meses? Para este problema a licença compulsória não parece ser a
solução”, afirmou o advogado Otto Banho Licks,
especializado na área de propriedade intelectual. “Duvido muito que a gente, na
prática, teria uma licença compulsória. A lei permite, mas a gente não vai ter
(por causa dos processos de fabricação das vacinas).”
Acordos. Na
Câmara, um dos defensores da quebra de patente é o deputado Aécio Neves
(PSDB-MG), que assumiu recentemente o comando da Comissão de Relações
Exteriores. O tucano disse que pretende procurar o presidente da Câmara, Arthur
Lira (Progressistasal), para discutir o texto. “Vou
conversar com ele sobre esse tema na terça-feira. A dúvida é se tem alguma
efetividade como está”, disse ao Estadão. O tucano também é autor de um projeto
de quebra de patentes.
O
projeto do Senado autoriza a licença compulsória apenas quando a empresa que
detém o produto não suprir o mercado de forma suficiente em uma situação de
emergência como a pandemia do novo coronavírus. Mesmo
com a patente quebrada, seus detentores receberão 1,5% do lucro líquido advindo
da venda do produto.
Apesar
das resistências, deputados de oposição pressionam para que o projeto seja
colocado em votação. “Seremos a favor. Acredito que possamos ter maioria”,
afirmou o líder da oposição, deputado Alessandro Molon
(PSB-PE). O líder do PT, deputado Bohn Gass (RS), declarou que a medida é necessária neste momento
para “evitar mortes”. A decisão sobre a pauta cabe a Arthur Lira.
Executivo
contrário
“Dentro
dos acordos multilaterais já há a possibilidade e regras para quebra de
patentes. O governo é contra a quebra de patentes por mudança na lei de patentes.”
Ricardo
Barros
Líder
do Governo