Título: O novo regime da Parceria Público-Privada
Autor: Flávio Amaral Garcia
Fonte: Jornal do Brasil, 27/04/2005, Outras Opiniões, p. A11
Com o advento da Lei n.º 11.079, de 30.12.2004, foi instituído o regime da parceria público-privada no âmbito da Administração Pública brasileira. Trata-se de um novo formato de contratação administrativa e que busca ocupar um espaço hoje existente entre os contratos administrativos típicos (financiados com recursos do orçamento) e as concessões de serviços públicos (financiadas com pagamentos das tarifas pelos usuários). A idéia da parceria público-privada é que os investimentos sejam, inicialmente, aportados pelo parceiro privado, com o setor público efetivando o pagamento somente após a disponibilização do serviço objeto do contrato. Imagine-se, por exemplo, uma rodovia que necessite ser restaurada. Ao parceiro privado caberá, num primeiro momento, investir na sua recuperação e manutenção. Após a rodovia estar nas condições ideais para o tráfego dos usuários é que o poder público iniciará o pagamento.
Aliás, esta é outra novidade da lei, vale dizer, o pagamento do parceiro privado poderá advir tanto dos recursos previstos no orçamento como do pagamento de tarifas pelos usuários. Outro ponto importante a ser registrado é o sistema de garantias, cuja finalidade é assegurar que o parceiro privado terá, efetivamente, o retorno dos investimentos feitos. Este é, a propósito, o grande atrativo para o setor privado, pois haverá segurança no recebimento do pagamento que lhe é devido, criando-se uma espécie de proteção para as eventuais mudanças de governo que, por vezes, acarretam a suspensão do pagamento das empresas contratadas pelos entes públicos. Novidade interessante é que a remuneração do parceiro privado poderá ficar vinculada ao seu desempenho, ou seja, se atingir níveis máximos de eficiência receberá mais; se a eficiência na prestação do serviço não for tão elevada receberá menos. Buscou-se, ainda, a centralização destes contratos em um único órgão, como forma, principalmente, de priorizar quais são os projetos mais importantes para o desenvolvimento nacional.
A verdade é que a expectativa em torno deste novo contrato é enorme, em especial em relação ao setor de infra-estrutura. Cogita-se de parceria público-privada para construção/recuperação de rodovias, ferrovias, metrô, hospitais, presídios, saneamento básico e uma série de outras necessidades públicas. No entanto, este contrato não deve ser visto como a solução de todos os males brasileiros. Afinal, as necessidades são muitas e os recursos escassos. É preciso saber eleger quais as prioridades, a fim de que não se crie, mais a frente, uma indesejável situação de endividamento público, como vem ocorrendo em outros países que adotaram modelo semelhante. É bem verdade que a lei brasileira contém uma série de cautelas e medidas que visam ao atendimento da Lei de Responsabilidade Fiscal. Mesmo assim as experiências internacionais devem servir de exemplo para que os mesmos erros não sejam cometidos. Alguns Estados já têm leis implantando, nos limites de suas competências, as parcerias público-privadas. Minas Gerais e São Paulo editaram as suas leis antes mesmo da lei federal.
No Rio de Janeiro existe um grupo de trabalho, formado por integrantes da Procuradoria Geral do Estado e das Secretarias de Estado de Desenvolvimento Econômico e Planejamento, instituído com a finalidade de apresentar um projeto de lei sobre a matéria. Uma inovação cogitada é a participação efetiva da Procuradoria Geral do Estado em todas as etapas da contratação da parceria público-privada, como forma de exercer o controle da legalidade desde o início do processo e evitando, assim, o risco do processo desaguar no Poder Judiciário. Enfim, que seja bem-vindo este novo modelo de gestão contratual e que possa atender as imensas expectativas que foram criadas. No entanto, não se vislumbra chance de êxito se não houver uma mudança de postura e mentalidade nas relações jurídicas travadas entre os setores público e privado, com cada parte cumprindo com as suas obrigações e agindo, principalmente, de acordo com os princípios da boa-fé e confiança legítima. Como o próprio nome diz é uma parceria. E parceiros, como notório, devem sempre agir com lealdade. Tomara que assim seja.