Título: Sombra do Vietnã ronda EUA no Iraque
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Fonte: Jornal do Brasil, 28/04/2005, Internacional, p. A13

Guerrilha desafia americanos como há 30 anos no Sudeste Asiático

WASHINGTON - A dois dias da data que marca o trigésimo aniversário da tomada de Saigon pelas tropas do Vietnã do Norte, que encerrava a guerra no Sudeste Asiático com a derrota americana, os Estados Unidos estão novamente enfrentando a guerrilha de um país longínquo, desta vez mais desértico: o Iraque. No entanto, se há quem ache prematuro estabelecer paralelos, outros acreditam que também é errado dizer que o presidente George Bush conseguirá instaurar um Iraque ''democrático e estável''. O principal ponto em comum entre as duas guerras é sua impopularidade.

- O Iraque é o Vietnã de Bush - sentenciou em 2004 o senador democrata Edward Kennedy, assustado com a violência no país árabe. Quase um ano depois, a situação permanece.

- Nos primeiros dias do Vietnã, pensávamos estar ganhando. Em nome de uma causa equivocada, continuamos a guerra por tempo demais. Não entendemos que nossa mera presença somente servia para criar novos inimigos e afastar as metas que queríamos alcançar - sustentou Kennedy.

Os soldados e civis americanos no Iraque são tão vulneráveis aos ataques que os atentados nas estradas, que matam muitos diariamente, já não são mais notícia. Toda a questão é saber se, como espera Bush, o Iraque pode ser estável e auto-suficiente em segurança antes da retirada das tropas, ou se a violência acabará expulsando os militares do país, como aconteceu em Saigon.

Mais de três milhões de soldados americanos foram enviados ao Vietnã, a maioria obrigados, em impopulares recrutamentos. Em 1968 e 1969, ápice da guerra, morreram em média 3 mil militares por mês. No total, faleceram 58.235.

Em 8 de abril passado, 25 meses após a invasão do Iraque, o número de soldados americanos mortos neste país se elevava a 1.543, incluindo os que faleceram em acidentes. O número de feridos, a maior parte mutilados, é no mínimo dez vezes maior.

A guerra do Vietnã custou mais caro que a do Iraque, que no entanto ainda não terminou. Para o conflito na Ásia, os contribuintes pagaram cerca de US% 500 bilhões. Para a guerra de 2003, as previsões orçamentárias para o ano fiscal de 2005 são de mais de US$ 80 bilhões, o que daria um custo de US$ 200 bilhões de dólares.

O reflexo popular de ambas as guerras é diferente. Em 1969, o pior momento no Vietnã, mais de 300 mil estudantes saíram às ruas de Washington para exigir a retirada das tropas, e desde esta data as manifestações prosseguiram durante anos.

- Hoje eles não estão nas ruas como em 1968. Realmente, a guerra no Iraque não está tendo o mesmo impacto - afirmou Donald Daniel, professor da Universidade de Georgetown, explicando que mais do que o alto número de mortos ou os custos elevados, o recrutamento ob rigatório havia sido o principal motivo do repúdio dos americanos ao Vietnã. O historiador Peter Kuznick concorda que essa situação contribuiu para tornar a guerra real para os estudantes.

- Havia então um sentimento palpável, imediato, visceral. Ao contrário desta guerra no Iraque, que é fácil tirar da cabeça - afirmou.