Correio Braziliense, n. 21450, 08/12/2021. Cidades, p. 13

Vítimas de uma barbárie recorrente

Darciane Diogo
Pedro Marra


Em 28 de novembro, Giovanna; 10 dias depois, Drielle. Em um curto período de tempo, o Distrito Federal acompanhou mais dois casos brutais de feminicídio. Aos 20 anos de idade, Giovanna Laura Peters teve a garganta cortada pelo namorado. O corpo foi jogado em uma área de mata, em Taguatinga, onde permaneceu por cinco dias. Drielle Ribeiro da Silva, 34, tentava interromper um relacionamento conturbado com o companheiro, mas encontrou um fim trágico: levou quase 60 facadas, em Samambaia Norte. Apesar de os números não serem oficiais, neste ano, o Distrito Federal registrou, ao menos, 25 casos desse tipo de crime, o que supera em 47% a quantidade de todo o ano passado (17).

Duas mulheres com histórias distintas tiveram o mesmo destino trágico nas mãos dos agressores. As ocorrências mais recentes chocaram a população da capital federal e despertaram a atenção de autoridades e especialistas quanto à necessidade do desenvolvimento de políticas públicas para combater o ciclo de violência contra a mulher. Questões como desigualdade entre gêneros, sentimento de posse e falta de educação são alguns dos pontos apontados por estudiosos para a permanência da covardia.

Drielle Ribeiro, mãe de um menino de 7 anos, tentou deixar o relacionamento abusivo com o pai da criança, Juvenilton Aquino da Costa, 36, durante nove anos. Em duas ocasiões, registrou ocorrências contra o agressor, que insistia em persegui-la. Vizinhos relataram que ele costumava esbarrar com a vítima na rua e a ameaçar. Na noite de domingo, ela respondeu a uma mensagem da irmã, por volta das 22h30, dizendo que estava tudo bem.

Aquele foi o último sinal dado por Drielle. Às 8h da última segunda-feira, policiais civis de Samambaia Norte — região onde a vítima morava — atenderam a uma ocorrência de localização de cadáver na QR 206, perto da linha do metrô. Era o corpo dela, marcado por diversas perfurações. As investigações revelaram que, por volta de meia-noite, Juvenilton chegou às pressas em casa, pegou uma mochila com roupas e fugiu. Ele é apontado pela polícia como o principal suspeito do feminicídio e, até o fechamento desta edição, não havia sido preso.

Estatísticas

 Giovanna Laura também entrou para a triste estatística de mulheres mortas em decorrência de violência em razão de gênero. A jovem saiu de casa, em Samambaia, por volta das 18h de 28 de novembro, para encontrar o namorado, Leandro Marques, 22, em Ceilândia Sul.

Na noite do crime, o casal teve uma discussão motivada por ciúme, e Leandro usou um facão para matar Giovanna. Os dois estavam na casa dele. Na manhã do dia seguinte, o acusado pediu o carro de um amigo emprestado e levou o corpo da vítima até um local de mata, no sentido da Avenida Elmo Serejo. A polícia encontrou o corpo cinco dias depois, na sexta-feira, e o agressor confessou o crime.

Entre janeiro e outubro, o número de feminicídios quase dobrou em relação ao mesmo período do ano anterior: foram 23, segundo a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF), contra 14 em 2020. Os dados são do balanço mais recente, divulgado pela pasta em novembro. Em relação ao meio usado para a prática do crime, na maioria dos casos (43,5%) de 2021, as vítimas foram assassinadas com armas brancas — itens de fácil acesso para os agressores. Em 26,1% das ocorrências, a morte decorreu do uso de arma de fogo, enquanto 13% delas foram asfixiadas.

Em nota, a SSP-DF destacou que o enfrentamento ao feminicídio e à violência doméstica representa uma prioridade da atual gestão do governo local. “Como estratégia de prevenção, a pasta lançou, em março deste ano, o (programa) Mulher Mais Segura, que reúne medidas, iniciativas e ações de enfrentamento aos crimes de gênero e o fortalecimento de mecanismos de proteção”, afirma o texto. Entre as ações da proposta, há o fornecimento do Dispositivo de Monitoramento de Pessoas Protegidas. “Além de o agressor receber a tornozeleira, a vítima é acompanhada por meio de um dispositivo móvel.”

Até o fechamento desta edição, a Diretoria de Monitoramento de Pessoas Protegidas (DMPP) acompanhava 36 casos de violência doméstica, todos os casos encaminhados pelo Judiciário. “No início de abril, realizou-se a primeira prisão em flagrante por descumprimento da medida”, destaca a pasta. A SSP-DF acrescenta que, em relação aos agressores, o relatório mais recente — com dados de janeiro a setembro — mostra que, dos 17 autores de feminicídios registrados, 13 foram presos, três cometeram suicídio e um está foragido.

Conscientização

A Secretaria da Mulher do DF enfatizou que, desde o início da gestão atual, está “empenhada em criar programas de prevenção e combate à violência de gênero, projetos e ações que fortaleçam a rede de enfrentamento à violência e o acolhimento às vítimas”. Esta semana, por exemplo, ocorre em Planaltina a Jornada Zero Violência contra Mulheres e Meninas, parceria da pasta com a SSP-DF e o Fundo de Populações da Organização das Nações Unidas (ONU).

“A proposta é mobilizar a população do Distrito Federal a divulgar e fortalecer a rede de enfrentamento à violência de gênero, além de reforçar os canais de denúncias disponíveis e, também, apresentar à comunidade os equipamentos de acompanhamento psicossocial, apoio e acolhimento das vítimas”, informou a secretaria. A ação prevê, durante uma semana, palestras para a comunidade, capacitação dos funcionários da administração regional, além de visitas aos serviços de acolhimento e proteção às vítimas de violência em Planaltina.

Onde pedir ajuda?

Polícia Civil

Telefones: 197 (Opção 0)

e 61 986-261-197 (WhatsApp)

E-mail: denuncia197@pcdf.df.gov.br

Site: pcdf.df.gov.br/servicos/delegacia-eletronica

Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam)

Telefones: 61 3207-6172/6195 (Asa Sul) e 61 3207-7391/7408/7438 (Ceilândia)

» Ligue 180 - Central de Atendimento à Mulher

» Disque 100 - Disque Direitos Humanos

» Polícia Militar - 190

Centros Especializados de Atendimento à Mulher (Ceams)

» Ceam Ceilândia — 61 3371-0256 / 61 991-173-406

» Ceam Estação 102 Sul do Metrô — 61 3224-0943 / 61 991-836-454

» Ceam Planaltina — 61 3388-4656 / 61 992-026-376

» Ceam Setor de Diversões Norte (SDN) — 61 3341-1840

Núcleos de Atendimento à Família e aos Autores de Violência Doméstica (Nafavds)

Endereços e telefones: mulher.df.gov.br/nafavds