Título: Bento XVI faz apelo contra alienação
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Fonte: Jornal do Brasil, 25/04/2005, Internacional, p. A9

Em sua primeira missa pública, Ratzinger pede ajuda de cristãos e não-cristãos para cumprir sua missão à frente da Igreja

CIDADE DO VATICANO - Na missa inaugural de seu pontificado, celebrada na manhã de ontem, o papa Bento XVI fez um apelo aos fiéis para que se unam a ele em sua missão de trabalhar pela unidade cristã em um mundo que descreveu como de ''ovelhas perdidas no deserto''. O ex-cardeal alemão Joseph Ratzinger, 78 anos, disse contar com a ajuda de ''cristãos e não-cristãos, igualmente'' em sua ''imensa tarefa, que excede a capacidade humana''. Segundo a prefeitura de Roma, pelo menos 500 mil pessoas acompanharam a liturgia na Praça São Pedro e arredores. Em seu sermão, o papa classificou o mundo como um deserto de sofrimentos e um mar de alienação:

- Os desertos externos crescem no mundo porque os desertos internos se tornaram vastos.

A primeira missa pública do novo papa teve duas horas e 40 minutos de duração. Ao fim, por volta das 13h (8h de Brasília), o sumo pontífice desfilou em carro aberto entre a multidão, em corredores protegidos por grades. Bento XVI foi muito aplaudido pelos fiéis, que entoavam seu nome entre palmas.

No sermão, Bento XVI disse que vai guiar o catolicismo sem impor suas idéias.

- Meu plano de governo não é fazer a minha vontade, mas me manter à escuta da palavra e da vontade do Senhor e deixar-me guiar por Ele - afirmou.

Sua fala foi interrompida mais de 40 vezes pela multidão, que gritava ''Bento, Bento''.

Como nos dois primeiros discursos de seu pontificado - realizados após o fim do conclave e em uma missa reservada para cardeais - mais uma vez Ratzinger abriu sua homilia com referências diretas a João Paulo II. Ontem, Bento XVI falou de como ele próprio e os católicos se sentiram ''abandonados'' com a morte de Karol Wojtyla.

Ratzinger lançou também sinais de abertura e tolerância religiosa. Fez uma saudação nominal a judeus e a católicos batizados que não estão em ''plena comunhão'', além de reiterar que sua mensagem destina-se a todos, fiéis ou não.

- Saúdo vocês, fiéis laicos, imersos no grande espaço da construção do reino de Deus que se expande no mundo, em cada expressão de vida. O discurso se faz cheio de afeto também na saudação que faço a todos que, unidos no sacramento do batismo, não estão ainda em plena comunhão conosco; e aos irmãos do povo hebraico, que nos deixaram um grande legado espiritual. O meu pensamento vai para todos os homens do nosso tempo, fiéis e não fiéis.

O pontífice fez ainda repetidas menções aos jovens, mostrando disposição de dialogar com os católicos ainda em formação. Lembrando palavras de Karol Wojtyla em sua missa de início de pontificado, em 1978, Bento XVI encerrou a homilia dizendo que a juventude não deve temer Jesus.

- Não tenham medo de Cristo. Ele não lhes tira nada, e doa tudo - pregou, advertindo as pessoas a não copiar aqueles que rejeitaram Cristo por temer os sacrifícios que o seguimento dos ensinamentos da Igreja acarretariam.

Suas palavras sobre a juventude e a unidade da Igreja e seus apelos de ajuda para a missão que lhe foi dada foram recebidas com aclamação.

Durante a cerimônia foram conduzidas ao altar duas bíblias, uma em grego e outra em latim, simbolizando a união entre as igrejas Oriental e Ocidental. Um dos momentos de maior comoção foi a entrega a Ratzinger do pálio, manto de lã de carneiro que lembra sua função pastoral, e do Anel do Pescador, que simboliza o poder do papa e traz uma imagem de São Pedro, primeiro papa da Igreja Católica, que era pescador, num barco. Antes, Ratzinger rezou diante do túmulo de São Pedro.

Pelo menos 140 delegações estrangeiras acompanharam a celebração, e foram recebidas pelo papa após a missa. Estiveram presentes autoridades como o chanceler Gerhard Schröder e o presidente Horst Köhler, da Alemanha, o presidente argentino Néstor Kirschner, o rei Juan Carlos da Espanha e o governador da Flórida, Jeb Bush.

Com Folha Press e Reuters