Correio Braziliense, n. 21476, 03/01/2022. Economia, p. 5

Desmatamento entra na agenda


Cada vez mais focada no combate às mudanças climáticas, a pauta ambiental tem dominado a agenda de fóruns internacionais e  pode afetar a produção agropecuária brasileira. Grandes cadeias de varejo na Europa e nos Estados  Unidos começam a promover um boicote contra produtos que não respeitem regras de sustentabilidade. No caso brasileiro, o desmatamento da Amazônia é o principal sinal de alerta.

Para o engenheiro de alimentos Nelson Roberto Furquim, professor da Universidade Mackenzie, o  Brasil pode sofrer retaliações se o desmatamento não for contido. Ele ressalta, ainda, que a  derrubada da floresta prejudica diretamente o produtor brasileiro. “Se o desmatamento continuar, muito provavelmente haverá alteração nos padrões de temperatura, que se tornarão mais extremos, com secas e chuvas  intensas e oscilantes, prejudicando a economia do país. Essa situação aumentará os riscos para  o produtor rural”, diz.

“Além disso, investidores podem aumentar a pressão sobre o governo na intenção de se rever  medidas que permitam o aumento do desmatamento. Ou pressionar as empresas que investem no  Brasil”, acrescenta.

Para o CEO e fundador do Databoi, Floriano Varejão, a pecuária brasileira, há muitos anos, vem  sofrendo com a deterioração da sua imagem internacional por associação da produção de proteína  bovina a práticas de desmatamento do bioma amazônico e do cerrado. “Apesar de haver desmatamento ilegal na produção pecuária, é preciso separar  o joio do trigo. Segundo publicação recente na revista Science, 2% das propriedades são responsáveis por 62% de todo o desmatamento ilegal. Uma pequena parcela mancha o nome de todo um  segmento, que, em sua maioria, é produtivo e sustentável.”

“Portanto, o primeiro passo para a transformação da imagem da pecuária brasileira é identificar os  produtores que estão à margem das leis ambientais e impedir a comercialização de seus pro dutos. Para isso, é necessário um esforço coordenado de toda a cadeia em direção à adoção de tecnologias de rastreabilidade que permitam a transparência da produção e a garantia de sua qualidade”, complementa Varejão.

O ambientalista Charles Dayler observa que, apesar de ser uma bandeira justa, a preservação do  meio ambiente pode se tornar uma desculpa para países colocarem barreiras contra o Brasil e  protegerem seus próprios produtores. “Se o meio ambiente for bem cuidado, as desculpas caem por  terra. E aí qualquer medida para restringir a entrada de produto brasileiro vai ser meramente  uma política protecionista, que pode ser contestada na Organização Mundial do Comércio (OMC).  Então, se cuidar bem do meio ambiente, o Brasil só tem a ganhar”, afirma. (FS)