O Globo, n. 32804, 31/05/2023. Política, p. 10

PGR pede ao STF que Moro vire réu por decla­ra­ções sobre Gil­mar

Mariana Muniz
Pedro Guimarães


A Procuradoria-Geral da República defendeu junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) que o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) vire réu por calúnia em virtude das declarações em que ele acusou o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de vender sentenças judicias. O entendimento da PGR apresentado no processo relacionado ao parlamentar contrasta com o que adotou em casos semelhantes envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e aliados dele.

Um vídeo curto do ex-juiz da Lava-Jato viralizou em perfis de esquerda no mês passado. No trecho em questão, com menos de dez segundos, Moro aparece rindo e fala em “comprar um habeas corpus do Gilmar Mendes”, ao responder uma perguntas de um mulher, que não aparece na gravação:

—Não, isso é fiança. Instituto para comprar um habeas corpus do Gilmar Mendes.

No parecer encaminhado ao STF, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, afirma que Moro “não se retratou” após as declarações.

“O denunciado não se retratou de forma cabal, total e irrestrita das declarações que imputaram fatos criminosos e ofensivos à reputação de ministro do Supremo Tribunal Federal, erguendo-se em seu desfavor óbice intransponível ao reconhecimento da hipótese de isenção de pena”, diz.

Perda de mandato

Moro foi denunciado pela PGR ao Supremo. Para Lindôra, o parlamentar sugeriu que o magistrado pratica corrupção passiva, sem ter provado o que disse. Na manifestação enviada à Corte, aprocuradora pede a perda do mandato do senador caso ele seja condenado a uma pena superior a quatro anos de prisão no processo. A defesa de Moro pediu ao STF o arquivamento do caso.

O entendimento da PGR na ação de Moro é diferente da que adotou em casos semelhantes envolvendo Bolsonaro. Num deles, em que também se apurava a prática de calúnia, Lindôra se posicionou a favor do arquivamento. Ela argumentou que Bolsonaro “apenas exerceu o direito de crítica, e qualquer crítica baseia-se em opinião pessoal e subjetiva do emitente”.

O processo dizia respeito a uma queixa-crime apresentada pela procuradora Monique Cheker Mendes após Bolsonaro dizer, em entrevista à Rádio Jovem Pan, que ela “tentou forjar provas, numa acusação mentirosa de crime ambiental”. O então presidente se referia a um episódio de 2012, ano em que fiscais do Ibama flagraram Bolsonaro pescando numa estação ecológica em Angra dos Reis. Lindôra ainda pontuou que “a proteção da liberdade constitucional de expressão” configuraria “um requisito indispensável para a própria existência de uma sociedade plural e democrática”.

A PGR também se manteve favorável a Bolsonaro em um pedido de investigação pelos ataques às urnas eletrônicas: “As falas presidenciais não constituem mais do que atos característicos de meras críticas ou opiniões (...)”.

Recentemente, a PGR também não viu crime em declarações feitas pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PLMG) que ironizavam pessoas transexuais e transgênero. O parlamentar foi à tribunal da Câmara, vestiu uma peruca e debochou das pautas de mulheres transsexuais, em discurso proferido no Dia Internacional da Mulher. Depois, cinco notícias-crimes foram apresentadas ao STF. Mas Lindôra se manifestou pela rejeição dos pedidos de investigação por entender que não houve ilicitude penal ou civil, já que Nikolas era deputado em exercício e teria o respaldo da imunidade.