Título: Ciro, Gil e o Guanabara
Autor: Hudson Carvalho
Fonte: Jornal do Brasil, 30/04/2005, Outras Opiniões, p. A11

O presidente Lula anda cogitando com alguns interlocutores sobre a potencialidade de uma chapa para concorrer ao governo do estado do Rio, em 2006, que agregue os ministros Ciro Gomes, na cabeça, e Gilberto Gil, como vice. As coisas não passam, por enquanto, de incursões exploratórias, de apreensão de candidato à reeleição que busca companhia confortável para o seu próprio vôo em ares fluminenses.

A preocupação de Lula é a de encontrar aliados que possam reforçar sua candidatura à reeleição presidencial no Estado do Rio - proscênio de dois virtuais adversários: o ex-governador Anthony Garotinho e o prefeito Cesar Maia. A impressão, no Palácio do Planalto, é de que não há condições hoje para que está chapa de arrimo mane de ventre petista. Figuras como Benedita da Silva e Jorge Bittar parecem desprovidas, no momento, de força eleitoral necessária para tarefa desta envergadura. O nome de Wladimir Palmeira reveste-se de um saudosismo anacrônico que dificilmente encontraria respaldo nas urnas de fora da Zona Sul do Rio. O prefeito de Nova Iguaçu, Lindberg Faria, é ainda uma promessa a ser confirmada. O prefeito de Niterói, Godofredo Pinto, exibe uma personalidade apática e insípida. O deputado Chico Alencar não assumiria o necessário papel de defensor intransigente do governo federal. E há o recém-chegado deputado Miro Teixeira, político ramificado, mas de vigor eleitoral majoritário a ser conferido.

As sondagens do presidente refletem aquilo que todo o mundo político sabe: o PT não tem candidato natural à sucessão da governadora Rosinha Matheus. A rigor, não há pretendentes comodamente postados. O pré-candidato mais bem instalado, por ora, é o senador Sergio Cabral, do PMDB. Mesmo ele tem os seus problemas. Há, no Palácio Guanabara, uma célula que ainda acredita nas possibilidades jurídicas de Rosinha poder se habilitar a um novo mandato, embora ela mesma não pareça animada. Há aqueles que exoram por solução mais íntima do casal Garotinho, já que, eventualmente, com Sergio Cabral no poder, o céu não seria tão azul para os colaboradores do ex-governador.

Se Garotinho vier a ser candidato à presidência da República, pelo PMDB, há maiores chances de consolidação da postulação de Sergio Cabral. Mas, se não? Sérgio Cabral seria o preferido do grupo do Garotinho? Se Garotinho vier a concorrer a presidente por outra legenda, o mais provável é que o senador não seja apadrinhado por ele. Em compensação, nessa circunstância, Sergio Cabral poderia ser adotado pelo PT, em um pacto com matriz nacional. E tem situação mais delicada para o senador. Garotinho permanece no PMDB, não é candidato à Presidência da República, apóia a reeleição de Lula, mas, em troca, exige que o PT sancione o nome de um apaniguado dele à sucessão de Rosinha.

O universo especulativo não se esgota no PMDB. O prefeito Cesar Maia trabalha em pêndulo. Ora, porta-se como candidato à presidência da República. Ora, move-se em direção ao governo do estado. E, devido às dificuldades que se avolumam em seu redor, pode acabar onde está: no Palácio da Cidade.

O senador Marcelo Crivella atiça ainda mais as incertezas da disputa estadual de 2006. Com cerca de 20% dos votos da capital, na última eleição municipal, é compreensível que sonhe solto. Em simulações feitas por um respeitado instituto de pesquisas, em 2004, o nome do senador apareceu, em alguns municípios do interior, em primeiro ou segundo lugar para o governo. Na surdina, Crivella prepara-se para se oferecer ao crivo do eleitorado. E não pode ser descartada a possibilidade de ele vir a ter a solidariedade de Garotinho, se o ex-governador deixar o PMDB para se lançar à sucessão presidencial por outra agremiação.

E é nesse emaranhado de hipóteses que o presidente Lula coteja opções que possam aplainar sua trajetória para um segundo mandato presidencial. O nome de Ciro Gomes irrompe nesse contexto de falta de alternativas dentro do PT e de aposta em um possível cansaço do eleitor com as forças políticas predominantes na cidade do Rio e no estado. Ciro ainda não assumiu a missão, mas começa a emitir sinais de que poderá vir a fazê-lo, provavelmente sob a égide do PSB. Quanto a Gil, no mínimo barateará os custos da campanha com showmícios e garantirá o mise-en-scène.