O Globo, n. 32799, 26/05/2023. Política, p. 8

Bancada de Dino domina CPI de Atos Golpistas

Eduardo Gonçalves
Camila Turtelli
Luísa Marzullo


A CPI mista formada para investigar os ataques golpistas de 8 de janeiro começou a trabalhar ontem com ampla maioria governista, uma aliada do Palácio do Planalto na relatoria do colegiado e a promessa de fazer uma contraposição a outra comissão parlamentar de inquérito, a que vai apurar a atuação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), controlada pela oposição e já inciada na Câmara. A sessão foi marcada por desavenças e bate-bocas envolvendo integrantes da Mesa.

A CPI dos Ataques será presidida pelo deputado Arthur Maia (União-BA), nome de confiança do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Já a relatoria foi entregue à senadora Eliziane Gama (PSD-MA), o que representa uma vitória para o governo.

Eliziane é aliada e conterrânea do ministro da Justiça, Flávio Dino. Ele figura entre os principais alvos da oposição na CPI, que tentará implicá-lo por suposta omissão das forças de segurança federais durante as invasões e depredação dos prédios dos três Poderes no dia 8 de janeiro.

Terceira opção

A senadora ficou com a relatoria após os senadores Eduardo Braga (MDB-AM) e Renan Calheiros (MDB-AL) decidirem não participar da comissão. Ela é apenas uma entre seis parlamentares do Maranhão, estado que já foi governado por Flávio Dino, na CPI. A bancada maranhense é a maior do colegiado, com três senadores e e três deputados, o que mostra a preocupação do governo de blindar Dino dos ataques da oposição.

No início do trabalhos, Eliziane ressaltou que os ataques representaram “um dos atos mais terríveis” contra a democracia e não haviam ocorrido nem nos momentos mais difíceis da ditadura militar.

— Houve uma tentativa de golpe, mas não conseguiram um golpe. Um fato é claro, que todos nós aqui somos contra o que aconteceu, independentemente de quem é base e quem é oposição — disse que relatora.

Única mulher na cúpula da CPI, Eliziane foi interrompida quatro vezes por oposicionistas antes de conseguir falar. Ela prometeu apresentar seu plano de trabalho na próxima semana com “uma proposta (de investigação) que vai representar a maioria, e ouvindo também as minorias”.

No início da sessão, os senadores Otto Alencar (PSDBA) e Marcos do Val (Podemos-ES) protagonizaram a primeira confusão. Após se pronunciar, Do Val tentou interromper a fala de um colega e Otto, que estava interinamente na presidência da comissão, subiu o tom após o seu pedido de silêncio ser ignorado:

— Vossa excelência está sendo antiético. Sei da sua procedência na polícia, aqui não é delegacia de polícia não, se mantenha calado. Se comporte como senador, o senhor não tem se comportado como senador em outras datas aqui —afirmou o parlamentar, que foi aplaudido.

Guerra de CPIs

Coordenador do bloco do governo na comissão mista, o deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA) afirmou ontem que o posicionamento inicial do grupo é “de não radicalizar”. Adiantou, porém, que os membros da base estão dispostos a usar o colegiado para contra-atacar a direita caso a CPI do MST, de maioria oposicionista, centre fogo político na direção do Planalto.

— Mas se eles fizerem loucura por lá, eu não descarto uma resposta institucional aqui. Pode ter reação — afirmou o parlamentar, que é advogado e aliado de Flávio Dino.

Com 18 membros na CPI dos Atos Golpistas (contra 10 oposicionistas e quatro independentes), a base quer direcionar as investigações para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o exministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres e os financiadores dos atos golpistas.

Segundo Eliziane, os depoimentos devem começar daqui 15 dias, depois que a comissão aprovar o cronograma de trabalho na próxima quinta-feira.