Correio Braziliense, n. 21485, 12/01/2022. Economia, p. 7

Inflação rompe teto e é a maior em seis anos

Rosana Hessel


A inflação terminou 2021 com variação acima de 10% pela primeira vez desde 2015, corroendo a renda e o poder de compra da população. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), subiu 0,73% em dezembro, acima das estimativas do mercado, resultando em uma variação de 10,06% no acumulado do ano. Isso significa que, em  cada R$ 1 mil de salário do trabalhador, R$ 100 foram engolidos pelo dragão da inflação ao longo de 2021.

Todos os nove grupos pesquisados pelo IBGE registraram aumento de preços, com destaque para o de transportes, que acumulou alta de 21,03% no ano e foi responsável por 41,2% da variação do IPCA. A gasolina e o etanol tiveram altas de 47,49% e de  62,23%, respectivamente.

A variação anual do indicador superou a taxa de 4,52% de 2020 e o teto da meta de inflação de 2021, de 5,25%. Outro vilão foi a energia elétrica residencial, que acumulou elevação de 21,21%, por conta da estiagem e do uso das usinas térmicas. “Boa parte dessa alta do IPCA foi explicada pelo aumentos dos preços da energia elétrica e dos combustíveis. Eles responderam por cerca de 50% da inflação acumulada no índice no ano passado”, explicou André Braz, coordenador dos Índices de Preços do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).

Na avaliação de Braz, a desvalorização do real perante o dólar, de 7%, também teve impacto na inflação, assim como os problemas na safra devido à crise hídrica. Ele ressaltou que a quebra da safra da cana de açúcar ajudou os preços do açúcar e do etanol subirem. O café moído, por conta das geadas em julho, registrou alta de 50,24%, em 2021.

Disseminação

O rompimento do teto da meta obrigou o Banco Central a divulgar, na tarde de ontem, uma carta explicando os motivos do descumprimento do objetivo pela sexta vez desde o início do regime de metas, em 1999. De acordo com analistas, é bem provável que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, precise escrever nova carta no ano que vem, pois as chances de descumprimento da meta deste ano, cujo teto é de 5%, são grandes mesmo com a elevação dos juros promovida pelo BC. Um dos motivos, segundo analistas, é o fato de a inflação estar disseminada na economia. O índice de difusão — que mostra o percentual de itens pesquisados com aumento de preços — passou de 63%, em novembro, para 75%, em dezembro. É o maior patamar desde fevereiro de 2016.

O espalhamento da inflação é um sinal de alerta, porque indica que os repasses de preços devem continuar ao longo deste ano. Há uma série de reajustes a caminho, como mensalidades escolares, passagem de ônibus, conta de luz, IPVA e IPTU. A Petrobras deu a largada, ontem, ao anunciar o primeiro aumento nos preços de combustíveis.

Revisões

Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust, avaliou que será difícil para o IPCA ceder neste ano como o mercado espera, passando de 10,06% para 5,03%. Pelas estimativas dele, o IPCA continuará acima de 10%, pelo menos, até abril e deverá encerrar o ano entre 5,94% e 6,20%. “O mercado deverá continuar revisando para cima as estimativas, porque os próximos movimentos serão de reajustes de preços com base na inflação de 2021”, afirmou. Segundo Velho, as chuvas em várias regiões do país e a seca no Sul já estão afetando as lavouras. “E ainda temos uma perspectiva de dólar valorizado, entre R$ 5,60 e R$ 5,70, devido às incertezas do ano eleitoral, o que também deve afetar alimentos e combustíveis.”

Apesar de manter em 5% a previsão de alta para o IPCA deste ano, o economista-chefe do Banco Alfa, Luis Otavio de Souza Leal, admitiu rever as estimativas. “Essa taxa vai depender, cada vez mais, de fatores pontuais, como os preços de alimentos e energia elétrica. Por  isso, colocamos um viés de alta nesse número”, afirmou.